terça-feira, 1 de outubro de 2013

A indústria papeleira e a gestão de resíduos industriais.

Durante o passado período estival foi dado enfase, por comentadores generalistas, às “virtudes” da gestão florestal das empresas de celulose, em particular da Portucel.

O Decreto-lei n.º 276/2009, de 2 de outubro, estabelece o regime de utilização de lamas de depuração em solos agrícolas, transpondo para a ordem jurídica interna a Diretiva n.º 86/27/CEE, do Conselho, de 12 de junho, de forma a evitar efeitos nocivos para o homem, para a água, para os solos, para a vegetação e para os ani/mais, promovendo a sua correta utilização. Este diploma veio revogar o Decreto-Lei n.º 118/2006, de 21 de junho.

A indústria de pasta e papel, no decurso da sua atividade, é responsável pela produção de uma grande quantidade de resíduos (estimados em cerca de 48 toneladas por cada 100 toneladas de pasta produzida), quer inorgânicos (cinzas, dregs e grits), quer orgânicos (lamas) e ainda outros subprodutos. A deposição em aterro sanitário ou a sua incineração constituem os métodos mais utilizados de tratamento destes resíduos, muito embora apresentem elevados custos socioeconómicos e ambientais.

A valorização agronómica de lamas celulósicas surge como um método alternativo de escoamento destes resíduos industriais. Todavia, a aplicação destas lamas em solos agroflorestais só deve ser efetuada após um estudo pormenorizado da sua qualidade e quantidade e depois de uma adequada caracterização da área destinada à sua aplicação. O diploma legal que regula a utilização destas lamas assim o impõe, designadamente pela obrigatoriedade de realização de análises frequentes quer às lamas (ou mistura de lamas), quer aos solos e à água dos locais onde estas vão ser espalhadas e incorporadas.

A legislação aplicável impõe limites máximos às concentrações nestas lamas quer de metais pesados, quer de compostos orgânicos e dioxinas, e de micro-organismos.

A legislação determina ainda os casos de proibição de aplicação destas lamas, entre outros, injetar lamas nos solos sem valorização agronómica, enterrar lamas nos solos (que não em aterro), aplicar nas proximidades de linhas de água e sua captação, ou em situações climatéricas adversas (entre novembro e janeiro, salvo justificação).

As lamas celulósicas devem ser espalhadas e incorporadas nos solos no prazo de 48 horas, utilizando para o efeito uma alfaia apropriada, no sentido de garantir, no mínimo, uma mobilização superficial do solo.

O produtor das lamas, mesmo que a sua valorização agronómica ocorra em terrenos de terceiros, será sempre corresponsável por eventuais efeitos nocivos da sua aplicação nos solos ou em qualquer outro lugar.

Com um crescimento anual estimado em 25% para o setor papeleiro, a produção de lamas é projetada para um aumento entre 48 e 86%.

Desta forma, surgem sérias preocupações quanto ao cumprimento dos requisitos legais à aplicação de lamas em solos florestais, em especial no que respeita aos normativos para uma gestão florestal sustentável, sendo que a Portucel dispõe de cerca de 122 mil hectares de floresta certificada.

Espalhamento de lamas celulósicas em eucaliptal, nas linhas e sem incorporação.

Ou seja, até que ponto um procedimento de fertilização orgânica de solos agroflorestais não está condicionado pela crescente necessidade de escoamento de resíduos industriais, com os correspondentes efeitos nocivos sobretudo para as populações e habitats rurais? Poderá ser dada como garantida a “virtuosidade” da gestão florestal certificada nas áreas geridas pela Portucel? Pela Acréscimo, foi já sugerida a abertura destas áreas florestais à visitação pelos interessados.

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