quinta-feira, 2 de dezembro de 2021

Intervenção do ICNF destrói área protegida na Mata dos Medos, no concelho de Almada

 

A Mata Nacional dos Medos integra a Paisagem Protegida da Arriba Fóssil da Costa da Caparica (PPAFCC) e está sob gestão do Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, I.P., tutelado pelo Ministério do Ambiente e da Ação Climática.

A Mata Nacional dispõe de Plano de Gestão Florestal (PGF) em vigor. Junto ao parque de merendas da Aroeira, na parte norte da Avenida do Mar, o PGF prevê a realização de desbastes e desramações. Todavia, o que se constata é a realização de uma operação de exploração florestal, com uso de maquinaria florestal pesada. O corte abusivo de arvoredo não configura a realização de desbastes, mais ainda em área classificada como de conservação.

Ao contrário do previsto em PGF, a placa de obra visível no local indica a intenção do ICNF em proceder a “projeto de conservação de habitats naturais e de valorização da PP Arriba Fóssil da Costa da Caparica, com o objetivo de “criação de percursos acessíveis que diminuam o pisoteio em áreas sensíveis”. Tratando-se de facto de áreas sensíveis, em solos arenosos de dunas antigas, não há como justificar a presença e circulação de tratores florestais pesados, designadamente de máquina processadora de abate e toragem de árvores, de máquina autocarregadora-transportadora e de estilhaçador.


A intervenção em curso consta do abate e trituração de pinheiros mansos adultos, cujo destino industrial é desconhecido. Da operação em curso resulta uma muito significativa perda de coberto arbóreo, associada a um crescente risco de propagação de incêndios e de instalação de espécies exóticas invasoras, designadamente de acácias. A operação coloca ainda em causa a presença de um vasto conjunto de espécies florísticas e faunísticas que aí tinham até agora o seu habitat.

Ao contrário de valorizar a Mata Nacional, a intervenção do ICNF deprecia-a significativamente. No plano financeiro, pelo prejuízo na produção de pinhas e pinhões, na vertente ambiental por colocar em risco a estabilização dos solos, a perda de coberto arbóreo e de biodiversidade.

Não foi encontrado procedimento concursal relativo a esta operação, nem outro documento oficial envolvendo a empresa que executa as operações de abate, toragem, extração e trituração dos pinheiros mansos.

Dadas as denúncias chegadas às signatárias, foram realizadas diligências no sentido de obter esclarecimentos sobre a intervenção em causa, das quais não foram ainda obtidas respostas.

As signatárias condenam veementemente esta ação do ICNF e exigem a imediata suspensão dos trabalhos até cabal explicação da intervenção em curso.


ACRÉSCIMO - Associação de Promoção ao Investimento Florestal

IRIS - Associação Nacional de Ambiente

QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza

 

terça-feira, 9 de novembro de 2021

Carta aberta ao Governo sobre o aumento das áreas limite de plantações de eucalipto por município em mais 37 mil hectares

Exmo. Senhor 

Secretário de Estado da Conservação da Natureza, das Florestas e do Ordenamento do Território, 

Embora a Estratégia Nacional para as Florestas (ENF)[1] estabeleça para 2030 uma meta máxima de 812 mil hectares de plantações de eucalipto no território continental português, o facto é que o 6.º Inventário Florestal Nacional (IFN6)[2], decorrente de recolha de imagens realizada em 2015, apontava já para uma área continental de cerca de 845 mil hectares ocupados por esta espécie exótica. Ou seja, superior à meta da ENF em cerca de 33 mil hectares. Assim, estranhamos que o Governo esteja neste momento a preparar um diploma legal[3] [4] para fazer aumentar os limites máximos de área de plantações de eucalipto por município. O acréscimo global aponta para cerca de 37 mil hectares. 

O Parlamento, na sequência dos grandes incêndios florestais de junho de 2017 e onde o eucalipto marcou fortíssima presença na área ardida em povoamentos florestais[5], proibiu novas arborizações com espécies do género Eucalyptus s.p.[6] (expansão de área), abrindo exceção às rearborizações com esta espécie exótica, quando a ocupação anterior fosse de povoamento puro ou misto dominante de eucalipto. Todavia, o Parlamento abriu ainda a porta a projetos de compensação. Ou seja, o Parlamento conferiu a possibilidade de reconversão de áreas de eucaliptal para espécies autóctones, agricultura e pastorícia, compensando com novas áreas de arborização com eucalipto noutras regiões do país. 

Pressupõe-se assim que o aumento dos limites das áreas de eucalipto por concelho sirva para dar enquadramento a eventuais projetos de compensação. Será? Estranhamente, não há nenhum concelho do território continental português onde seja prevista contração de área para estas plantações. Nem sequer em municípios com presença de áreas protegidas, entre outras, da Rede Natura 2000, onde marquem presença plantações de eucalipto. Pior, há limites máximos que aumentam em concelhos limítrofes ou abrangidos pela Rede Nacional de Áreas Protegidas, como são os casos dos concelhos do Montijo (+561 ha) no Estuário do Tejo, de Aljezur (+585 ha) e de Odemira (+3.149 ha) no Sudoeste Alentejano, ou de Arcos de Valdevez (+ 329 ha) e Póvoa do Lanhoso (+ 303 ha), na envolvente ao Parque Nacional da Peneda Gerês. 

Ainda pressupondo que os acréscimos nos limites de áreas máximas por concelho sirvam para acolher projetos de compensação, qual a transparência deste processo? Por agora, prima a opacidade. Mais! Quem financia os encargos dos resgates das “rentáveis” plantações de eucalipto para serem compensadas noutros locais? O erário público? 

Como funciona o sistema de fiscalização para controle de eventuais plantações ilegais? Existem indicadores de desempenho do processo de fiscalização? Os acréscimos dos limites máximos servirão para dar cobertura a eventuais ilegalidades? É estranho o acréscimo de cerca de 37 mil hectares nos limites máximos de áreas plantadas por concelho, agora pretendida pelo Governo, quando as arborizações autorizadas ou validadas com eucalipto, no âmbito do regime jurídico aplicável, perfazem, no período de outubro de 2013 a final de 2018, altura em que passaram a ser proibidas, pouco mais de 11 mil hectares[7]

Quais os critérios que baseiam a proposta do Governo para aumento dos limites das áreas máximas destas plantações por município? Certo é que as (re)arborizações com eucalipto são historicamente autorizadas e validadas na ausência de critérios técnicos, financeiros, ambientais e sociais. 

E qual tem sido a evolução histórica da gestão das plantações de eucalipto em Portugal? Cerca de2/3 da área de eucaliptal no nosso país encontra-se ao abandono ou sob má gestão, a alimentar a propagação de incêndios[8], a proliferação de pragas e de doenças[9] e a potenciar a expansão destas áreas por regeneração natural[10]. O mercado da rolaria de eucalipto mantém o seu funcionamento em concorrência imperfeita, com promessas sucessivas de criação de plataformas de análise por parte de vários Governos, sem que haja efetividade nessas promessas. O setor do eucalipto em Portugal é conhecido pelas recorrentes portas giratórias entre as celuloses e o poder político.


Assim, as organizações signatárias repudiam a intenção do Governo em fazer aumentar os limites máximos das áreas de eucalipto por concelho e exigem a identificação e implementação de medidas de ajuste à meta máxima de eucaliptal em Portugal inscrita na lei para 2030

Lisboa, 9 de novembro de 2021 

As organizações signatárias: 



Notas de enquadramento: 

1. A atualização da Estratégia Nacional para as Florestas (EFN) foi aprovada pela Resolução do Conselho de Ministros n.º 6-B72015, de 4 de fevereiro: https://dre.pt/web/guest/pesquisa/-/search/66432466/details/maximized

2. 6.º Inventário Florestal Nacional (2015), dados e relatório em http://www2.icnf.pt/portal/florestas/ifn/ifn6

3. Despacho de Publicitação para alteração das Portarias n.ºs 52/2019, 53/2019, 54/2019, 55/2019, 56/2019, 57/2019 e 58/2019, de 11 de fevereiro, que aprovaram, respetivamente, os programas regionais de ordenamento florestal de Lisboa e Vale do Tejo (PROF LVT), do Algarve (PROF ALG), do Alentejo (PROF ALT), do Centro Interior (PROF CI), do Centro Litoral (PROF CL), de Trás-os-Montes e Alto Douro (PROF TMAD)e de Entre Douro e Minho (PROF EDM): 

https://drive.google.com/file/d/1Fgk-BMJUI9MwSG3mhdOXRR2LxFkGGDD6/view?usp=sharing


4. Projeto de Portaria, na versão submetida em agosto de 2021 a consulta: 

https://drive.google.com/file/d/1X-MSko1JCOaWTxQL9bbOygEuPl_sWY-o/view?usp=sharing


5. Relatório da Comissão Técnica Independente aos incêndios de junho de 2017 (Quadro 4.2.): https://www.parlamento.pt/Documents/2017/Outubro/Relat%C3%B3rioCTI_VF%20.pdf 


6. Lei n.º 77/2017, de 17 de agosto, no seu Art.º 3.º, por aditamento ao Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho, do Art.º 3.º-A: https://dre.pt/pesquisa/-/search/108010873/details/maximized 


7. Indicadores do Regime Jurídico das Ações de Arborização e Rearborização, em abril de 2021: https://www.icnf.pt/api/file/doc/a4f4d6b4b5be40c4 (ver quadro 14). 


8. Taxa de presença de eucalipto na área ardida total (1996 a 2018, fonte: ICNF): 

https://drive.google.com/file/d/1_BGNTXMUcNnezMJ7s_VKPj9o7rBNFv8y/view?usp=sharing


9. Pragas e doenças dos eucaliptos, por Carlos Valente, CELPA, 19 de dezembro de 2016: http://www.celpa.pt/melhoreucalipto/wp-content/uploads/2017/01/Apresenta%C3%A7%C3%B5es_Torres-Vedras _19_12_2016-C%C3%B3pia.pdf 


10. Tal como sugerido em Anjos et al. (2021), 

https://repositorio.ul.pt/bitstream/10451/48040/1/Anjos%2C%20A%20et%20al.%2C%202021.pdf


quinta-feira, 21 de outubro de 2021

21 de outubro | Dia Internacional sobre a Biomassa em Grande Escala

O dia 21 de outubro marca o “Dia Internacional sobre a Biomassa em Grande Escala” e centenas de organizações a nível mundial, entre as quais se contam em Portugal a ANP|WWF, a Acréscimo, a Quercus e a ZERO, que se uniram para chamar a atenção para o problema da utilização insustentável da biomassa florestal para produção de energia, resultante de políticas de promoção de energias renováveis que não acautelam de forma séria a utilização da floresta, com implicações ao nível da desflorestação, biodiversidade, poluição atmosférica e emissões e impactos sociais e económicos.


Em todo o mundo, há uma preocupação crescente com as grandes unidades de produção de energia a partir de biomassa e outras formas de bioenergia. A classificação da biomassa florestal como energia renovável está a promover a queima de árvores numa altura em que deveríamos proteger urgentemente as florestas e reduzir as emissões de carbono. A par de um grande impulso das políticas para energias renováveis, as instituições financeiras multilaterais estão a utilizar fundos públicos e privados para investir na queima de árvores, o que está a resultar numa perda de coberto arbóreo e de biodiversidade.


Convidamos os utilizadores de redes sociais para que se juntem a nós no dia 21 de outubro, construindo um cartaz com o qual tiram uma fotografia junto de uma árvore emblemática, de uma área florestal ou de um mau exemplo em termos de utilização da biomassa florestal para chamar a atenção para este problema.


Na elaboração do cartaz escreva uma frase sobre o tema e associe um os vários dos hastags abaixo. Aqui poderá ver a nossa sugestão de cartaz, que poderá imprimir e utilizar para o efeito.


  • #BigBadBiomass

  • #BiomassDelusion

  • #CutCarbonNotForests 

  • #StopFakeRenewables

  • #PararFalsasRenovaveis

  • #ForestsAreNotFuel

  • #Biomassa

  • #Floresta

  • #Forestas NãoSãoCombustível



quarta-feira, 22 de setembro de 2021

Dados sobre incêndios em 2021 são preocupantes

 

De acordo com os dados noticiados em comunicado do Ministério da Administração Interna (MAI), atualizados ao dia de hoje pelo Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), foi registado este ano o menor número de incêndios da década, com 7.172 ocorrências, correspondentes à segunda menor área ardida total, este ano de 26.926 hectares, dos quais cerca de 8.070 hectares correspondem a áreas de povoamentos arbóreos, ou seja, a florestas seminaturais e a plantações.

Todavia, de acordo com 6.º relatório provisório de 2021 do ICNF, nos incêndios registados até 15 de setembro e onde foi possível atribuir a causa (69% do total das ocorrências, responsáveis por 89% da área ardida total), o uso negligente e o fogo posto assumem destaque (71%), respetivamente com 48%, onde predominam as queimas e as queimadas, e 23%.

Ou seja, num considerável universo de causas atribuíveis, é notório o pouco impacto das ações de sensibilização sobre os comportamentos.

Tendo em conta os três grupos de fatores que influem nos incêndios florestais:

  • ocupação,
  • comportamentos e
  • meteorologia;

sabendo que, em vastas regiões do território, as ocupações do solo são de elevado risco e que este ano a meteorologia, ao contrário do registado em vastas regiões da União Europeia e contíguas, foi pouco propícia à ocorrência e à propagação de grandes incêndios, os registos sobre os comportamentos são muito preocupantes.


De outro modo, num ano com eventos meteorológicos mais favoráveis a grandes incêndios, concretamente, com golpes de calor, períodos de seca prolongadas e períodos de ventos fortes, os números de incêndios e de área ardida em 2021, como em 2014, serão sobretudo reflexo da meteorologia. Ora, as previsões climáticas apontam para uma maior ocorrência futura de eventos meteorológicos extremos no território nacional. Pelos vistos, os comportamentos pouco se alteraram relativamente aos anos de 2016, 2017 e 2018, nos quais Portugal registou as maiores áreas ardidas totais na União Europeia. As alterações nos usos e ocupações demoram décadas a concretizar e, neste domínio, ainda andamos pelos planos, com elevada probabilidade de nunca terem execução física.

Em suma, podem parecer entusiasmantes os comunicados do MAI, mas o entusiasmo terá pouco de duradouro. Nos comportamentos e nas ocupações, o Governo tem opções erróneas, como se assiste anualmente com o paradigma das “faixas de gestão de combustível”, e conjuga em demasia o verbo procrastinar.

 

segunda-feira, 21 de junho de 2021

Contra a conversão para biomassa na central do Pego

Numa altura em que são cada vez mais evidentes os impactes da queima de biomassa sobre os ecossistemas, as populações e o clima, a Trustenergy (uma joint venture entre a ENGIE e a Marubeni), principal acionista da Central Termoelétrica do Pego, em Portugal, com uma potência total de 628 megawatts, anunciou a intenção de converter a unidade de queima de carvão para a queima de “resíduos” florestais, mas que, na prática, se traduzirá sem dúvida na queima de arvoredo.

Em condições médias de operação, a central irá gerar cerca de 508 GWh por ano, correspondente a uma necessidade de consumo anual de biomassa de 1,1 milhões de toneladas por ano [1]. Todavia, com a central a funcionar na sua plena capacidade, é muito provável que o Pego venha a necessitar de um valor que poderia aproximar-se das 5 milhões de toneladas de madeira [2]. Neste contexto e em qualquer dos casos, a procura acrescida de matéria-prima ultrapassaria em muito os recursos disponíveis [3].



Pese embora que se alegue apenas vir a queimar “resíduos” florestais na central do Pego, o facto é que, de acordo com as regras atuais da UE, este termo pode incluir qualquer tipo de madeira, sejam resíduos das indústrias da madeira ou arvoredo. Acresce que, para a produção de eletricidade, queimar biomassa florestal residual [4] tem uma enorme ineficiência energética e avultados custos de extração, transporte, armazenamento e no funcionamento dos equipamentos da central. Por isso, o que se encontra na maior parte dos parques das centrais a biomassa ou nas unidades de produção de pellets de madeira não são “resíduos”, mas sim seções de troncos de árvores (toros).


Um dos cenários mais prováveis para o fornecimento de biomassa ao Pego seria a rolaria de eucalipto, situação que aumentaria a procura por madeira desta espécie, em concorrência direta com unidades muito próximas de produção de pasta e papel [5]. O facto tenderia a criar condições para a instalação de novas áreas de monoculturas na bacia hidrográfica do rio Tejo, o  que poderia agravar ainda mais os problemas associados aos grandes incêndios. Também exigiria maior pressão sobre as importações de madeira de eucalipto por Portugal, a partir de Espanha, do Uruguai ou de Moçambique, que começará a exportar este ano.


A outra opção provável seria a queima de pellets de resinosas (sem torrefação) no Pego, designadamente a partir de pinheiro bravo, aproveitando a capacidade de produção instalada em Portugal [6], contribuindo para um maior desequilíbrio na taxa de procura já insustentável de madeira de pinho em Portugal. Todavia, com toda a certeza, esta segunda opção levaria à importação de pellets em grandes quantidades, a partir de países como os Estados Unidos e do  Canadá, onde a produção de pellets para produção de eletricidade, principalmente na Europa, já causa grandes impactos nas florestas locais.


Qualquer aumento na utilização industrial de arvoredo em Portugal contribuirá, no imediato, para um agravamento da perda de coberto arbóreo, com destaque para as espécies autóctones, já em declínio acentuado no país [7].Os impactes decorrentes da queima de biomassa para a produção de eletricidade são já devastadores em termos de conservação dos solos, da capacidade de armazenamento de água e da manutenção da biodiversidade [8].A possibilidade de se vir a recorrer à sua queima na central do Pego agravaria ainda mais o nível de emissões de gases de efeito estufa, uma vez que a sua utilização não é neutra de forma alguma, porque as emissões associadas são muito piores do que as decorrentes da queima dos combustíveis fósseis [9].


A concretização da conversão da central do Pego exigirá uma forte subsidiação pública e um esforço financeiro acrescido por parte dos consumidores de eletricidade. O financiamento público à queima de árvores para a produção de eletricidade, designadamente através do Fundo para uma Transição Justa e do Plano de Recuperação e Resiliência, poderá vir a servir interesses especulativos e nunca será justo, nem garantirá recuperação económica, muito menos resiliência do território face às ameaças das alterações climáticas e do colapso da biodiversidade.


Importa assim alocar financiamento público no apoio à requalificação e criação de novos postos de trabalho na região, em particular os que possuem ligação à promoção de fontes de energia verdadeiramente renováveis, para compensar uma eventual perda de postos de trabalho com o encerramento da unidade de carvão na central do Pego. O fundamental é, ainda, direcionar a subsidiação pública para apoio aos proprietários rurais, na conservação de habitats e no estímulo à adoção de sistema de produção verdadeiramente sustentáveis.


Pelo exposto, as organizações signatárias apelam ao Governo português e à Comissão Europeia para não viabilizarem o financiamento público à queima de árvores para a produção de eletricidade na central do Pego.


As organizações signatárias,


Portugal

Internacional

Amis de l’Afrique Francophone - Bénin (AMAF-BENIN), Bénin; ARA, Germany; BankTrack, International; Biofuelwatch, UK/U.S.; CENSAT Agua Viva - Amigos de la Tierra Colombia, Colombia; Centre for Environmental Justice, Sri Lanka; Climate Reality Europe, International; Coastal Plain Conservation Group, U.S.; Comité Schone Lucht, Netherlands; De Woudreus, Netherlands; Deutsche Umwelthilfe e.V. (DUH), Germany; Dogwood Alliance, U.S.; Duurzaam Dorp Diemen, Netherlands; Earth Thrive, UK/Balkans; EKOenergy ecolabel, International; Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE), Brazil; Federation of Community Forestry Users Nepal (FECOFUN), Nepal; Fern, Belgium; Forests of the World, Denmark; Forests, Climate and Biomass Working Group, Environmental Paper Network, International; Forum Ökologie & Papier, Germany; Friends of Fertő Lake, Hungary; Friends of Siberian Forests, Russia; Friends of the Earth/BUND, Germany; Front Commun pour la Protection de l’Environnement et des Espaces Protégés (FCPEEP), DR Congo; GE Free NZ in Food and Environment, Aotearoa/NZ; GeaSphere, South Africa; Global Forest Coalition, International; Global Justice Ecology Project, U.S./ International; Healthy Forest Coalition N.S., Canada; Justica Ambiental - JA! Friends of the Earth Mozambique, Mozambique; Landelijk Netwerk Bossen- en Bomenbescherming, Netherlands; Leefmilieu, Netherlands; Les Amis de la Terre Togo, Togo; Mighty Earth, International; Miljøbevægelsen NOAH Friends of the Earth Denmark, Denmark; Mobilisation for the Environment, Netherlands; Mom Lobes Taiwan Association, Taiwan; Nature Nova Scotia, Canada, NRDC (Natural Resources Defense Council), U.S.; Päästame Eesti Metsad (Save Estonia's Forests), Estonia; Partnership for Policy Integrity, U.S.; Pivot Point, U.S.; Protect the Forest, Sweden; Reclaim Finance, France; Rettet den Regenwald e.V., Germany; ROBIN WOOD, Germany; Salva la Selva, Spain; SEE Change Net, S.E. Europe; Southern Environmental Law Center, U.S.; Spruill Farm Conservation Project, U.S.; The Climate Reality Project, Brazil; Urgewald, Germany; Water Justice and Gender, Netherlands; Wild Europe, International; Workshop for All Beings, Poland; YUVA, Turkey.


Notas adicionais:


[1] De acordo com a “Avaliação do ciclo de vida da geração de eletricidade numa central termoelétrica a carvão convertida para biomassa florestal”, de Tobias de Jesus Prudêncio Pereira (Universidade de Coimbra, 2019).


[2] Equivalente a cerca de 2,6 milhões de toneladas de pellets assumindo 8.000 horas de operação por ano e uma eficiência de 38%.


[3] De acordo com o relatório de 2013 elaborado pelo Parlamento Português, para a produção de biomassa florestal residual em Portugal é apontado a disponibilidade potencial anual de 2.2 milhões de toneladas, um valor que merece especial atenção para contrariar os efeitos de uma sobre-exploração da biomassa, de forma a que seja assegurada a sua renovação. O consumo efetivo de biomassa florestal residual para energia, em 2013, já era estimado acima dos 3 milhões de toneladas anuais, entre a queima para energia e a produção de pellets de madeira. Apesar disso, só em 2016 e 2017 foram atribuídos licenciamentos a 8 centrais termoelétricas de biomassa com a potência superior a 150 megawatts, o equivalente a uma necessidade de biomassa florestal residual próxima dos 2 milhões de toneladas anuais. Por outras palavras, a sobre-exploração da biomassa tornou-se mais evidente, o que coloca ainda mais em causa a sua capacidade de renovação.


[4] Nos espaços florestais não se produzem “resíduos”. A atividade silvícola gera sim sobrantes, matéria orgânica que pode ter várias utilizações. Entre elas, os sobrantes da atividade silvícola e da exploração florestal constituem um excelente fertilizante orgânico, sobretudo, depois de triturado ou estilhaçado. Este é um uso primordial num país de solos maioritariamente pobres em matéria orgânica. Outro uso, no plano estritamente local, é a produção de calor, nomeadamente para aquecimento de infraestruturas sociais ou de unidades do sector agroalimentar.


[5] Há que ter em consideração que a região onde está instalada a central do Pego tem já instaladas unidades da indústria de celulose e papel (Constância e Vila Velha de Ródão), algumas unidades de transformação de madeira serrada (Sertã) e de produção de lenha, bem como unidades de queima de biomassa para eletricidade (Fundão) e de produção de pellets de madeira (Oleiros, Proença-a-Nova, Coruche). Assim, a eventual conversão de carvão para a queima de árvores na central do Pego irá agravar substancialmente a pressão sobre os espaços arborizados da região, fazendo aumentar drasticamente a procura por madeira.


[6] De acordo com um estudo internacional, Portugal é o quarto maior fornecedor de pellets de madeira à reconvertida central termoelétrica de Drax, no Reino Unido, com uma potência instalada de 4000 megawatts.


[7] De acordo com dados do Banco Mundial, a taxa de cobertura florestal em Portugal diminuiu de 37,15% em 1990 para 36,16% em 2018, admitindo uma ligeira recuperação entre 2010 e 2015 de 0,65%.


[8] De acordo com um recente relatório da OCDE, Portugal é o quarto país membro e o segundo da União Europeia com a maior perda relativa de áreas naturais e seminaturais registada entre 1992 e 2018.


[9] Ver em ”Letter Regarding Use of Forests for Bioenergy”, de 11 de fevereiro de 2021.


terça-feira, 1 de junho de 2021

Portugal é desde 1992 um dos países do mundo com a maior perda relativa de áreas naturais e seminaturais

 OCDE confirma a 4.ª pior posição nos 37 Estados Membros, a 2.ª mais grave entre os 27 na UE


Nas vésperas de mais um Dia Mundial do Ambiente, a assinalar no próximo sábado, dia 5 de junho, urge constatar a evolução da perda de áreas naturais e seminaturais, tendo em conta um recente relatório da OCDE.

De acordo com o relatório de outubro de 2020, intitulado “Making de Green Recovery work for jobs, income and growth” [1], no conjunto dos 37 membros da OCDE [2], Portugal surge no quarto lugar em perda relativa de áreas naturais e seminaturais [3], registada entre 1992 e 2018. Portugal é apenas antecedido pela Coreia do Sul, Israel e Estónia. Em situação oposta encontram-se a Islândia, o Canadá e a Nova Zelândia.

No plano da União Europeia, constata-se a presença de seis Estados Membros nas dez primeiras posições em perda relativa de áreas naturais e seminaturais. De acordo com o citado relatório da OCDE, Portugal, na segunda posição, é precedido pela Estónia e antecede a Lituânia, a Eslováquia, a Dinamarca e Espanha.

Conforme assinalado no relatório, a perda de áreas naturais e seminaturais contribui para o aumento de emissões de gases de efeito estufa e exerce pressão sobre a biodiversidade, através da fragmentação de habitats.

Em Portugal, a perda de áreas naturais e seminaturais deve-se, de acordo com o Global Forest Watch [4] sobretudo, aos incêndios florestais e à conversão para extensas áreas de plantações de eucalipto e de outras monoculturas agrícolas. Em concreto, a perda de coberto florestal é corroborada por dados do Banco Mundial [5], muito embora nesta avaliação sejam consideradas como floresta as áreas de plantações de eucalipto.

Na sequência deste posicionamento de Portugal, a IRIS e a ACRÉSCIMO exigem ao Governo medidas claras, devidamente fundamentadas, suportadas em cronogramas e orçamentos viáveis, para a inversão urgente deste roteiro sinistro, seja ao nível das políticas ambientais, de conservação da natureza e das florestas, seja ao nível das políticas agrícolas, de ordenamento e coesão territorial. O atual percurso produz impactes muito negativos, quer em termos de emissões de gases de efeito estufa, de perda de solos, de recursos hídricos e de biodiversidade, quer em termos de fragilidade face às ameaças decorrentes das mudanças climáticas.

As signatárias,


[1] Em: https://www.oecd.org/coronavirus/policy-responses/making-the-green-recovery-work-for-jobs-income-and-growth-a505f3e7/

[2] Estados membros da OCDE (37); Alemanha, Austrália, Áustria, Bélgica, Canadá, Chile, Colômbia, Coreia do Sul, Dinamarca, Eslováquia, Eslovénia, Espanha, Estados Unidos, Estónia, Finlândia, França, Grécia, Hungria, Irlanda, Islândia,  Israel,  Itália, Japão, Letónia, Lituânia, Luxemburgo, México, Noruega, Nova Zelândia, Países Baixos, Polónia, Portugal, Reino Unido, República Checa, Suécia, Suíça e Turquia.

[3] Embora visível na 3.º posição do gráfico “Loss of natural and semi-natural areas since 1992”, a Indonésia não é membro da OCDE.

[4] Em:https://www.globalforestwatch.org/dashboards/country/PRT/?category=summary&location=WyJjb3VudHJ5IiwiUFJUIl0%3D&map=eyJjZW50ZXIiOnsibGF0IjozNy40NzE1MjU1MTMxOTE1MTYsImxuZyI6LTE4LjcwOTY4OTEzOTk4OTM5fSwiY2FuQm91bmQiOmZhbHNlLCJkYXRhc2V0cyI6W3siZGF0YXNldCI6InBvbGl0aWNhbC1ib3VuZGFyaWVzIiwibGF5ZXJzIjpbImRpc3B1dGVkLXBvbGl0aWNhbC1ib3VuZGFyaWVzIiwicG9saXRpY2FsLWJvdW5kYXJpZXMiXSwiYm91bmRhcnkiOnRydWUsIm9wYWNpdHkiOjEsInZpc2liaWxpdHkiOnRydWV9LHsiZGF0YXNldCI6InRyZWUtY292ZXItbG9zcyIsImxheWVycyI6WyJ0cmVlLWNvdmVyLWxvc3MiXSwib3BhY2l0eSI6MSwidmlzaWJpbGl0eSI6dHJ1ZSwicGFyYW1zIjp7InRocmVzaG9sZCI6MzAsInZpc2liaWxpdHkiOnRydWV9fV19

[5] Em: https://data.worldbank.org/indicator/AG.LND.FRST.ZS?locations=PT