sexta-feira, 27 de junho de 2014

As florestas e as estatísticas

O Instituto Nacional de Estatística publicou hoje, 27 de junho, o destaque relativo às Contas Económicas da Silvicultura de 2012.

De acordo com os dados estatísticos apresentados é possível constatar que em 2012 o Valor Acrescentado Bruto (VAB) da Silvicultura representou 0,5% do VAB da economia nacional. O valor deste rácio foi em 1990 de 1,2%, em 2000 de 0,8% e em 2010 de 0,4%.

Apesar dos volumosos apoios da PAC à silvicultura nas últimas três décadas, sobretudo em ações de florestação com pinheiro bravo, associado à produção de madeira para serrar, e com sobreiro, associado à produção de cortiça, os dados estatísticos do INE revelam uma diminuição do peso da produção na cortiça e na madeira para serrar nos últimos 12 anos.


De acordo com o INE, em 2012, os preços da produção na silvicultura diminuíram 0,6%. Já o consumo intermédio de bens e de serviços na silvicultura registou em 2012 um acréscimo de 7,0% em valor, decorrente de aumentos nos serviços silvícolas, energia e lubrificantes e plantas. Em 2012, os preços no consumo intermédio aumentaram 1,5%, enquanto na produção decresceram 0,6%.

Em 2012, ainda de acordo com os dados apresentados pelo INE, é evidente a desaceleração no aumento nominal do rendimento empresarial líquido (de 3,9%) face aos valores dos acréscimos nominais registados em 2010 (de 10,4%) e em 2011 (de 11,5%).

Na comparação do VAB da silvicultura relativamente ao VAB do conjunto das atividades económicas, a valores de 2011, o INE constata que Portugal, com um peso relativo de 0,5%, se encontra atualmente longe do primeiro lugar do ranking dos Estados Membros com maior importância da silvicultura na economia nacional. Este lugar é ocupado pela Finlândia (1,8%). Curiosamente, em 1990, o peso do VAB da silvicultura no VAB nacional era em Portugal de 1,2%.


quinta-feira, 26 de junho de 2014

A plataforma das fileiras florestais

Ao fim de três anos em funções, depois das clivagens criadas no setor, o Governo reconhece finalmente a "imprescindibilidade do bom relacionamento ao longo das fileiras de base florestal para que o seu funcionamento possa ser mais transparente e equitativo".

Cria então o Governo, tal como reivindicado pela Acréscimo desde meados de 2012, a plataforma de acompanhamento das relações nas fileiras florestais (Despacho n.º 8029/2014, de 19 de junho, subscrito em conjunto pelos Ministérios da Economia e da Agricultura e do Mar).

De acordo com o despacho, a plataforma será constituída por 26 entidades, entre representantes dos Ministérios, organismos da Administração Pública, organizações de agricultores e produtores florestais de 2.º e 3.º graus, organizações de prestadores de serviços nas florestas e de comerciantes de produtos florestais, associações das indústrias de base florestal e organizações de cariz interprofissional dominadas pelo setor industrial.

O número excessivo e a falta de outros intervenientes fundamentais, prognosticam dúvidas quanto à eficácia do objetivo pretendido: a imprescindibilidade do “bom relacionamento ao longo das fileiras de base florestal para que o seu funcionamento possa ser mais transparente e equitativo.

O número excessivo e a amálgama de entidades envolvidas tendem a retirar eficácia às putativas decisões da plataforma. Será esse o objetivo? Ou seja, até que ponto a plataforma servirá para a correção efetiva dos desequilíbrios existentes nos mercados, ou se constitui como um mero show off para manter os atuais equilíbrios?

O que fazem na plataforma as organizações de cariz interprofissional quando os diversos setores nelas envolvidos estão já presentes na plataforma?

Se intervêm organizações de 3.º grau, nomeadamente os Parceiros Sociais, fará sentido estes “rivalizarem” na plataforma com associados seus? Ou pelo contrário, estando presentes os seus associados especializados, fará sentido a presença dos Parceiros Sociais?


Por outro lado, entre as ausências notam-se as organizações de consumidores, muito embora sejam estes que encerram as cadeias comerciais, também dos produtos e serviços de base florestal.

Ainda entre as ausências fundamentais, estão as organizações não-governamentais de ambiente, muito embora se reconheça que as cadeias comerciais de base florestal assentam em recursos naturais, cuja sustentabilidade é cada vez mais posta em causa.

Face ao peso determinante dos cidadãos, em geral, e dos contribuintes, em particular, na prossecução das medidas de política silvo-industrial em Portugal, nota-se a ausência de representação destes últimos na plataforma. A esmagadora maioria do investimento silvo-industrial é desenvolvido através do recurso a fundos públicos, seja no cofinanciamento por fundos oriundos da União Europeia e dos Orçamentos do Estado, seja pela cobrança de taxa sobre o consumo de combustíveis líquidos, seja pela atribuição de benefícios fiscais ou de outros apoios públicos ao investimento industrial. Ou seja, as relações comerciais no setor silvo-industrial nacional estão, em grande parte, suportados por apoios da Sociedade.

Teme assim a Acréscimo que o funcionamento da recém-criada plataforma possa estar viciado à partida. Esta associação Irá acompanhar de perto os seus futuros desenvolvimentos, sobretudo no que respeita à evolução do rendimento empresarial líquido dos produtores florestais, da evolução do peso do setor florestal no PIB, da evolução do emprego rural associado às atividades silvícolas e à evolução na sustentabilidade dos ecossistemas florestais nacionais.


segunda-feira, 23 de junho de 2014

Baldios: a oportunidade da alteração legislativa

Está em discussão no Parlamento uma proposta de alteração à Lei dos Baldios (Lei n.º 68/93, de 4 de setembro, alterada pela Lei n,º 89/97, de 30 de julho).

Em audição promovida pela Comissão de Agricultura e Mar, a Acréscimo embora identificando-se com o princípio da melhoria contínua, também no plano legislativo, manifestou as suas dúvidas quanto à oportunidade desta iniciativa, pública que é a sua oposição às medidas de política florestal protagonizadas nas últimas décadas, incluindo os últimos 3 anos.

Dos 1.107 baldios referenciados com aptidão florestal, num total de 278,1 mil hectares, 861 encontram-se em regime de cogestão com o Estado: Ou seja, 77,8% dos baldios dispõem de capacidade técnica e comercial disponibilizada pela autoridade florestal nacional, atualmente protagonizada pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF).

Assim sendo, parece inadequada a proposta de alteração por motivo de inadequada gestão de grande parte destas áreas comunitárias, já que em mais de 3/4 dos casos o próprio Estado é garante da pretendida “boa e rentável gestão”.

A alteração legislativa em curso tem por fim anunciado a libertação de “barreiras” que atualmente condicionam a intervenção nas áreas comunitárias. Recentes medidas homólogas, de libertação de “barreiras”, têm merecido contestação pública da Acréscimo, como é o caso do novo Regime Jurídico aplicável as Ações de Arborização e Rearborização (DL 96/2013).

No caso presente as dúvidas são:

·       Terá por fim esta iniciativa legislativa a transferência da gestão de parte destas áreas comunitárias para as autarquias, designadamente para as Juntas de Freguesia, como forma de compensação financeira destas últimas pelos cortes orçamentais impostos nos últimos anos?

·        Ou, terá por finalidade potenciar o arrendamento ou a extinção dos baldios para posterior gestão por entidades privadas?


De facto, situando-se tais propriedades comunitárias maioritariamente em regiões onde predomina o minifúndio, a sua expressão territorial torna-as apetecíveis para efeitos de angariação de áreas para a maximização de produções lenhícolas de curta rotação, sobretudo em localizações no litoral norte e centro. Todavia, este tipo de produções não permite estatisticamente maximizar os interesses das populações rurais, nomeadamente face aos condicionalismos existentes nos mercados deste tipo de produções.


terça-feira, 17 de junho de 2014

Florestas: três anos de uma legislatura

No final da presente semana perfazem três anos sobre a tomada de posse do XIX Governo Constitucional, no qual a ministra Assunção Cristas assumiu a missão de definição, coordenação e execução da política florestal, tendo-lhe sido atribuídas, entre muitas outras, responsabilidades na sustentabilidade ambiental, económica e social na conceção, desenvolvimento, coordenação e execução dos instrumentos e medidas de política florestal.

Passados três anos, qual a avaliação possível sobre do seu desempenho?

A primeira iniciativa ministerial, desenvolvida todavia no âmbito do Plano de Redução e Melhoria da Administração Central (PREMAC), resultou na fusão entre a Autoridade Florestal Nacional (AFN) e o Instituto da Conservação da Natureza e da Biodiversidade (ICNB). Aportou o novo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) vantagens em termos de execução dos instrumentos e medidas de política florestal? Veio contribuir para o reforço da sustentabilidade ambiental, económica e social das florestas portuguesas?

Nesse mesmo ano, dezembro de 2011, a ministra anunciou a preparação da campanha “Vamos plantar Portugal”, na qual pretendia recorrer a ações de voluntariado para dotar o país de uma nova árvore por cada habitante. Na altura afirmou: “Se por cada português conseguirmos ter mais uma árvore, o nosso PIB aumenta, a nossa riqueza aumenta, a nossa contribuição para a diminuição das alterações climáticas aumenta, porque a floresta é um grande pulmão de sequestro de carbono". Tendo presente que o fomento de mais floresta não é solução para os problemas das florestas, muito pelo contrário, aguarda-se ainda hoje a concretização do anúncio.

Seguiu-se a iniciativa de criação da Bolsa de Terras, atualmente com uma área anunciada de 13,6 mil hectares (a 31 de maio de 2014), sendo que 89% das terras incluídas na Bolsa pertencem ao Estado. Do total, 79% da área em Bolsa é considerada de aptidão florestal, só 16% correspondem a solos de natureza agrícola. Colocam-se à partida várias questões:
§  Em termos gerais, a oferta em Bolsa é ajustável à procura, designadamente do anunciado número de projetos de instalação de jovens agricultores? Ou mais incisivamente, a oferta, sobretudo de aptidão silvo-pastoril ajusta-se à procura, sobretudo evidente no Baixo Alentejo?
§  Em termos setoriais, possuindo o Estado apenas 2% da área florestal nacional, será oportuna a disponibilização de área pública de aptidão florestal, quando esta poderia ser fundamental para a investigação e desenvolvimento, designadamente para a dinamização de mercados associados a produtos ou serviços hoje sem valor tangível? Quanto da área pública de aptidão florestal estão hoje sob a gestão da Lazer e Floresta, SA, ou seja já se encontrava em situação de venda antes da criação da Bolsa?

A iniciativa setorial mais emblemática da legislatura é, ate ao momento, a aprovação do Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de junho, ainda em apreciação no Parlamento. A iniciativa insere-se numa irresponsável aposta política no fomento florestal, sem garantias prévias de subsequente gestão florestal. Tem sido assim nos últimos 30 anos, com os resultados visíveis a cada período estival. Por outro lado, o diploma criou uma cisão nunca antes vista no setor, com a simplificação de procedimentos administrativos de fomento à indústria papeleira e a burocratização de procedimentos para as demais fileiras silvo-industriais. Acresce que, através deste diploma, o Governo incentiva uma fileira que, não sendo a que mais peso possui, nem ao nível das exportações do setor, nem no emprego silvo-industrial, se tem caraterizado por um desinvestimento fundiário, sobretudo em área de eucalipto, e na sobrevivência sob proteção governamental, ao ser permitida a sua intervenção em mercados em concorrência imperfeita.

Anunciada para estar concluído em finais de 2013, para assim se poder articular com os fundos a disponibilizar no âmbito do Programa de Desenvolvimento Rural 2014/2020 (PDR 2020), o processo de atualização da Estratégia Nacional para as Florestas (ENF), está ainda hoje em curso. Tal como diagnosticado antes, na atualização da ENF persistem inconsistências fatais à sua prossecução, sejam as de natureza financeira, seja de natureza política, seja de natureza estratégica e de natureza estrutural. Será mais um documento de biblioteca, a associar-se ao Plano de Desenvolvimento Sustentável da Floresta Portuguesa (PDSDP), de 1998. O processo de atualização da ENF parece servir apenas para legitimar mais um anúncio público de desempenho (embora comprometido na sua execução), ou para legitimar a anunciada intenção de alteração á Lei dos Baldios.

Mais recentemente, as Medidas Florestais do PDR 2020 foram definidas sem um estudo do desempenho de quadros anteriores, persistindo nos mesmos erros, com as consequências também já conhecidas. No atual PDR 2020, submetido recentemente à aprovação pela Comissão Europeia, existe uma forte dúvida sobre as garantias de retorno económico, social e ambiental do esforço solicitado à Sociedade para o apoio às florestas portuguesa.


Quanto ao que ficou por fazer e sem ser exaustivo, regista-se o previsível “falhanço” na conclusão do cadastro rústico na presente legislatura. Este é um instrumento fundamental para definição de políticas de ordenamento do território, onde se inserem as medidas de política florestal. Num país com 98% das áreas florestais na posse de entidades não públicas, muitas delas sem cadastro rústico, sobretudo as situadas em regiões de maior risco de incêndios florestais, o objetivo político da conclusão do cadastro tem sido sucessivamente anunciado e sucessivamente adiado, remetido para comissões ou projetos-piloto.

Apesar de ter sido aprovada por unanimidade na Assembleia da República, quase 18 volvidos sobre a sua publicação, a Lei de Bases da Política Florestal (Lei n.º 33/96, de 17 de agosto) continua a aguardar a conclusão da sua regulamentação. Mais 3 anos se perderam. Este é um caso exemplar de desrespeito do Poder Legislativo por parte do Poder Executivo. Em causa está o cumprimento, por este e anteriores Governos, do disposto no Art.º 23.º da Lei aprovada por unanimidade pelo Parlamento. Se já não é para ser esta a Lei, haja coragem política para propor as alterações necessárias. O seu incumprimento é um péssimo exemplo do Estado, ao qual o presente Governo se veio também a associar.

Por último, um fator considerado fundamental para revitalizar as florestas e o setor florestal, a necessidade de acompanhamento dos mercados de produtos e serviços de base florestal. Durante três anos, a atual ministra recusou-se terminantemente a opor-se ao funcionamento desregulado dos mercados de produtos florestais, dominados que estes estão por oligopólios industriais. O preço desta atitude tem-se refletido, nas últimas décadas, em desflorestação (perda de área florestal), em contraciclo com a União Europeia, no declínio progressivo da economia silvícola e no aumento da área florestal sem gestão ativa (abandono). No final de três anos de mandato, o Ministério vem agora anunciar a intenção de criar, até final de 2014 (embora, o cumprimento de prazos não seja o seu forte), uma de plataforma de acompanhamento das relações nas fileiras florestais, ou seja, quase três anos após a criação da PARCA – Plataforma de Acompanhamento das Relações da Cadeia Agroalimentar. Alguém não o terá permitido antes? Esse mesmo alguém irá condicionar o seu funcionamento (se vier efetivamente a ser criada a plataforma)?

Para a Acréscimo, o desempenho destes últimos 3 anos é manifestamente negativo.


quarta-feira, 11 de junho de 2014

PDR 2020: os riscos do passado e o futuro

Uma das alterações cívicas que a atual crise aportou é a necessidade de acompanhar os destinos da despesa pública. No caso em concreto, preocupa à Acréscimo, enquanto organização cívica, acompanhar a despesa realizada no âmbito dos apoios às florestas. Ao contrário do sucedido no passado, importa garantir, hoje e no futuro, o retorno económico para a Sociedade, mas também o retorno social e ambiental dos fundos públicos investidos nas florestas.

O Governo submeteu já à apreciação da Comissão Europeia o novo Programa de Desenvolvimento Rural (PDR 2020), com vista à captação dos fundos da PAC e dos Orçamentos do Estado para o período de 2014 a 2020 (PDR 2020), entre os quais se inserem os apoios às florestas. De acordo com a informação disponibilizada pelo Ministério da Agricultura, não foi possível constatar mudanças significativas face aos antecessores do PDR 2020.

Mais, sobre os antecessores do PDR 2020, o Ministério tem-se recusado a responder às questões publicamente colocadas pela Acréscimo. Elas são:

- Em termos genéricos:

1 - Existem estudos de avaliação de desempenho, ao longo dos 28 anos decorridos de apoios da PAC às florestas em Portugal, que sirvam de diagnóstico à preparação do PDR 2020?

2 - Na sequência dos fundos públicos investidos nas florestas portuguesas desde 1989, qual o retorno registado para a Sociedade, quer em termos económicos, mas também nos planos social e ambiental?

3 – Quais os impactos dos fundos da PAC ao nível dos principais riscos que se têm colocado às florestas em Portugal nos últimos 28 anos, concretamente no que respeita aos incêndios florestais, mas também às pragas e às doenças?

4 - Quais os impactos dos fundos da PAC ao nível dos números expressos nas Contas Económicas da Silvicultura, publicadas pelo INE? Como explica o Ministério da Agricultura o declínio progressivo do peso do Valor Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura no VAB nacional registado nos últimos 28 anos?

VAB SILVICULTURA / VAB NACIONAL


5 – Apesar dos apoios concedidos às florestas e ao setor florestal, qual a explicação para a forte redução do emprego no setor florestal, de mais de 160 mil postos de trabalho, ao longo dos últimos 28 anos?

6 – Apesar dos significativos apoios públicos às florestas em Portugal, como explica o Ministério da Agricultura a desflorestação ocorrida no País nos últimos 28 anos, em mais de 150 mil hectares e em contraciclo com a União Europeia?

- Em termos específicos:

7 – Nos apoios atribuídos desde 1989, quais as áreas por espécie florestal, por região e por Quadro Comunitário de Apoio (QCA), que resultaram dos investimentos cofinanciados pelos fundos públicos?

8 - Houve interseção de áreas objeto de cofinanciamento público entre os diferentes QCA, ou seja, houve áreas intervencionadas por mais do que uma vez e para o mesmo tipo de investimento (florestação-incêndio-reflorestação)? No caso das interseções, quais as áreas envolvidas e os montantes financeiros envolvidos?

9 – Face aos montantes investidos pelos fundos públicos em pinheiro bravo, como se explica a regressão de área desta espécie em Portugal nos últimos 28 anos (menos cerca de 390 mil hectares?

10 - Face aos montantes investidos pelos fundos públicos em sobreiro, como se explica a manutenção de área desta espécie em Portugal ao fim destes 28 anos?

- Quanto ao futuro:

11 – Como será mensurado o retorno económico, social e ambiental esperado no apoio público às florestas a inscrever no PDR 2020, a suportar por fundos da PAC e do Orçamento do Estado entre 2014 e 2020?

12 – Face às crescentes preocupações decorrentes das Alterações Climáticas, manifestadas desde longa data quer a nível nacional quer internacional, mais recentemente no quadro das próprias Nações Unidas, qual o impacto do PDR 2020 na mitigação dos impactos negativos do aumento de riscos daí decorrentes, designadamente ao nível dos incêndios florestais e da desertificação?


Do lado da Acréscimo, para evitar o risco de alimentar a "indústria do fogo", continuaremos a insistir em obter tais respostas. A Sociedade tem direito a conhecer qual a eficiência e a eficácia dos esforços que, em seu nome, os vários Governos foram ou irão desenvolver através da afetação de fundos públicos às florestas, seja ao nível do retorno económico, seja ao nível do retorno social e ambiental.


terça-feira, 3 de junho de 2014

A Estratégia Nacional para as Florestas: um embuste?

O Governo prepara-se para anunciar a atualização da Estratégia Nacional para as Florestal (ENF), com a sua primeira versão aprovada por Resolução de Conselho de Ministro de setembro de 2006 (RCM n.º 114/2006, de 15/09).

Uma estratégia nacional pressupõe a elaboração de um diagnóstico no momento presente, a definição de uma visão para o futuro e os princípios para ação, com vista a atingir os objetivos pretendidos. Todavia, o diagnóstico utilizado na presente atualização assenta em 2006, não se identifica uma visão, nem consistentes princípios para a ação.

Uma estratégia nacional para as florestas não deve, não pode ser desinserida de um contexto mais amplo, de Desenvolvimento Rural, de Ordenamento do Território, de uma política ambiental e económica. Ora, a atualização que o governo agora apresenta carece em absoluto desta fundamental integração.

Pior, para a sua prossecução há que afetar fluxos financeiros. Inicialmente prevista a conclusão do processo de atualização da ENF para finais de 2013, a tempo da reparação do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) 2014/2020, verifica-se contudo que o processo está atrasado meio ano e que o PDR foi entretanto elaborado e submetido à aprovação pela Comissão Europeia. Ou seja, não existem garantias de compatibilidade entre as necessidades financeiras da ENF e os apoios comunitários que vierem a ser aprovados no âmbito do PDR 2014/2020.

Temos pois que a atualização da ENF, tal como na versão em vigor se carateriza por uma inconsistência financeira. Foram definidos objetivos, indicadores e metas, mas não estão definidos os respetivos planos de investimento, nem de financiamento.

Embora considerada historicamente fatal, a inconsistência financeira não está isolada. A proposta do Governo carateriza-se igualmente por fatais inconsistências de natureza política, estrutural e estratégica.

No plano político, a atualização da ENF, como aliás na versão inicial, não supre a necessidade, reconhecida historicamente, de aproximar os ciclos políticos, de curto prazo, aos ciclos florestais, estes últimos de médio e longo prazo.

No plano estrutural, a inconsistência revela-se na confusão entre causa, efeito e consequência. Priorizam-se as consequências, os incêndios, as pragas e as doenças. Reconhece-se o efeito, a ineficiente ou ausente gestão das florestas. Mas, despreza-se a causa, o que permite executar e custear uma gestão ativa, profissional e sustentável: as pessoas e os negócios.

Finalmente, no plano estratégico, a inconsistência fatal diagnosticada advém da visão tecnocrática que persiste na abordagem às florestas e à atividade florestal. As árvores continuam a sobrepor-se às pessoas, muito embora sejam estas últimas que possuem as superfícies onde se encontram as primeiras. O público alvo de uma estratégia para as florestas, num país onde mais de 90% da área florestal é privada, tem de ser constituído prioritariamente pelos agricultores, silvicultores e outros proprietários rústicos. Todavia, estes parecem continuar a ser considerados parceiros menores ou de difícil abordagem.

Estas inconsistências fazem da ENF uma proposta inócua, desinserida das necessidades das florestas e das atividades silvo-industriais, em especial nas fileiras que apresentam maiores vulnerabilidades, como as da madeira e mobiliário e da cortiça. É, neste contexto, um documento condenado ao insucesso (como se tem verificado de 2006 a esta parte).

Assim sendo para que serve? Trata-se de um embuste? Serve para tentar legitimar o quê?


Á vista salta o ímpeto para a alteração à Lei dos Baldios, com uma proposta já em discussão na Assembleia da República. Propriedade comunitária, com generosas dimensões em área, embora inseridas em regiões onde predomina o minifúndio em propriedade privada, com solos de boa fertilidade, abundante pluviosidade e temperaturas amenas, ajustam-se às anunciadas intenções de reforço da capacidade industrial no setor papeleiro, designadamente na unidade fabril de Cacia. Urge por isso, “simplificar”, “desburocratizar”, “flexibilizar os modelos gestão dos baldios”: por um modelo de gestão privado?

No que respeita a um plano estratégico para as florestas, a Acréscimo apresentou já, designadamente no Parlamento, uma alternativa para suprir as inconsistências detetadas. Se é de facto intenção do Governo dispor de uma Estratégia Nacional para as Florestas, o caminho tem de ser outro. O presente documento pode servir interesses, mas não será uma estratégia nacional.