quinta-feira, 27 de março de 2014

Resíduos industriais e certificação florestal

A Acréscimo manifestou, quer junto do Forest Stewardship Council (FSC), quer do Programme for the Endorsement of Forest Certification (PEFC), os dois sistemas de certificação florestal com representatividade em Portugal, as suas preocupações sobre a compatibilidade da aplicação de resíduos industriais em solos florestais, com os requisitos normativos inerentes à certificação da gestão florestal sustentável. A área sob gestão florestal certificada atingiu em 2013 em Portugal cerca de 442 mil hectares.

A eliminação de resíduos florestais, no caso de lamas de depuração e suas misturas, através da sua aplicação nos solos, tem o suporte legal dado pela Diretiva 86/278/CEE, transposta para o quadro jurídico nacional pelo Decreto-Lei n.º 276/2009, de 2 de outubro. Todavia, no que respeita aos seus impactos em solos florestais, em concreto os sujeitos a certificação florestal, são desconhecidos dados científicos independentes que compatibilizem esta possibilidade com os requisitos normativos inerentes a este tipo de certificação de sistemas.

Esta aplicação tem sido usual ao nível da indústria de pasta celulósica, onde os resíduos industriais produzidos pelas unidades fabris têm sido aplicados em solos florestais, nomeadamente em propriedades que estão na posse ou sob gestão dos grupos silvo-industriais que operam em Portugal.

Os dados científicos independentes de suporte a esta prática são essenciais. Por um lado, para determinar se tal prática se insere num programa adequado de fertilização florestal, que adequadamente respeite os requisitos normativos para certificação, ou se estamos perante um mero expediente de eliminação de resíduos industriais, face a outras alternativas, inclusive o envio para aterro. Por outro lado, urge esclarecer se desta prática, em áreas florestais, não resultam impactos para a fauna e flora, para os solos e a água, e bem assim para as populações rurais.

Nos contatos estabelecidos com o grupo industrial com a maior área de floresta certificada em Portugal, com cerca de 123 mil hectares, quer no âmbito do FSC quer do PEFC, bem como com a respetiva entidade certificadora, não foi possível chegar a conclusões sobre tal compatibilidade. Ficou mesmo a sensação que, antes desta manifestação de preocupação da Acréscimo, esta questão não era relevante.

A par da ação fiscalizadora do cumprimento legal do DL 276/2009, que se enquadra na esfera do Ministério da Agricultura e Mar e do Ministério do Ambiente, voluntariamente, as entidades com áreas florestais certificadas, adotam práticas de gestão mais exigentes do que as previstas na legislação. Daí também resultam mais valias aquando da comercialização de produtos de base florestal obtidos a partir de áreas certificadas, identificados estes nos mercados através da aposição dos logótipos do FSC ou do PEFC.


A inadequada aplicação de resíduos industriais em solos florestais pode ter consequências na emissão de gases para a atmosfera, no escoamento e lixiviação de compostos químicos e biológicos, inclusive de metais pesados e microrganismos nocivos. Um adequado controlo dos impactos, bem como a compatibilidade desta via para a eliminação de resíduos florestais com os exigentes requisitos da certificação florestal só pode ser obtido através de ações de investigação levados a cabo por entidades independentes.


quinta-feira, 20 de março de 2014

Copy Paste

O Gabinete de Planeamento e Políticas (GPP), organismo do Ministério da Agricultura e Mar, apresentou a 10 de março uma versão do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR), para o território continental. O documento menciona tratar-se ainda de um ponto de situação de desenvolvimento dos trabalhos, cuja programação final constituirá o guião para à aplicação de fundos da Política Agrícola Comum (PAC) no período 2014 a 2020.

No que aos apoios às florestas respeita e tendo em conta as críticas antes formuladas ao PRODER 2007/2013, o documento apresentado não evidencia ser mais do que um copy paste.

Pior, as propostas para os apoios às florestas não refletem os péssimos resultados de programações anteriores, aplicadas desde a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia.

Apesar dos péssimos resultados do passado, não se vislumbram alterações de fundo na arquitetura que serve de base à atribuição dos apoios públicos até 2020.

A PAC, desde 1989, tem atribuído à silvicultura nacional vários milhares de milhões de euros de apoios públicos, seja através dos impostos pagos pelos contribuintes nacionais, seja pelo financiamento suportado pelos demais contribuintes europeus.

Apesar do financiamento dos contribuintes nacionais e europeus, as florestas portuguesas e o setor florestal português viram reduzir-se em mais de 150% o número de postos de trabalho no sector entre 1993 e 2013.


A silvicultura nacional evidenciou um declínio económico progressivo, com uma redução de cerca de 67% do peso do seu Valor Acrescentado Bruto (VAB) no VAB nacional.

VAB Silvicultura / VAB Nacional

Pior, apesar do financiamento público de milhares de milhões de euros às florestas em Portugal, através do I Quadro Comunitário de Apoio (QCA), vigente 1986 e 1992, do II QCA, aplicável entre 1993 e 1999, do III QCA, que vigorou entre 2000 e 2006, e do PDR 2007/2013, os investimentos concretizados não registaram qualquer melhoria na gestão florestal a nível nacional, facto visível no considerável agravamento dos riscos, quer ao nível dos fatores abióticos, designadamente dos incêndios florestais, quer dos bióticos, das pragas e das doenças.


Numa análise mais abrangente do que apenas nas florestas, estas várias programações não surtiram qualquer impacto na redução do êxodo rural ou na consolidação do rendimento junto das populações rurais. A análise comparativa dos últimos Census revela a insignificância dos resultados obtidos com os apoios da PAC ao nível do Desenvolvimento Rural.

Nas florestas, apesar do péssimo histórico, insiste-se na receita. Fica evidente a pobreza estratégica do GPP neste domínio.

A Acréscimo reafirma a sua convicção na ineficiência dos apoios da PAC em setores onde prevalece a concorrência imperfeita.

Por esta razão, assumirá sempre a sua oposição á atribuição de apoios públicos para a viabilização, através dos contribuintes, de relações comerciais loose-win, estabelecidos entre uma produção silvícola perdedora e alguns grupos industriais, desta e de outras formas, protegidos pelos vários governos.

As diferentes fileiras florestais nacionais devem valer económica, ambiental e socialmente pela sustentabilidade das relações comerciais que conseguem construir entre os vários agentes económicos que nelas intervêm.

O PDR 2020, na versão agora apresentada pelo GPP não é mais do que um "balão de oxigênio" às relações loose-win que subsistem no setor florestal português.


terça-feira, 18 de março de 2014

Proposta de Enquadramento e Revitalização do investimento florestal em Portugal (síntese)

Comemora-se no próximo dia 21 de março o Dia Internacional da Floresta, este ano acompanhado pela comemoração dos 40 anos de vigência do regime democrático em Portugal, perfazendo ainda 28 anos desde a adesão do país à Comunidade Económica Europeia. A altura é oportuna para um diagnóstico do período decorrido e a análias aos seus impactos ao nível das florestas e do setor florestal nacional. Todavia, mais importante do que um diagnóstico, que não é famoso, o início da primavera é ideal para a apresentação de propostas que permitam atenuar erros do passado recente e revitalizar as florestas e, também por esta via, as regiões rurais de Portugal.

Efetivamente, apesar dos apoios da Política Agrícola Comum (PAC) às florestas portuguesas nos últimos 28 anos, através da alocução de milhares de milhões de euros de fundos públicos, não se constata uma redução dos riscos nas florestas, um reforço da economia florestal, um crescimento do emprego no setor, a valorização do território: o combate ao despovoamento e à desertificação, muito pelo contrário.

A oportunidade de futuros apoios públicos da PAC às florestas, agora no âmbito do Programa de Desenvolvimento Rural (PDR) para o período 2014 a 2020, pode aportar um de dois resultados:

1.     A persistência no histórico dos últimos 28 anos; ou,
2.     Um corte radical com os modelos anteriormente definidos para a atribuição dos apoios.

A Acréscimo envereda determinadamente pela opção que garanta o retorno económico, ambiental e social ao investimento dos contribuintes nas florestas em Portugal.

Neste contexto, a associação elaborou a sua Proposta de Enquadramento e Revitalização (PER) do investimento florestal em Portugal, adiante apresentada sinteticamente.

Para o enquadramento, parte-se de uma situação única a nível mundial: a posse das superfícies florestais assume em Portugal a caraterística de estar esmagadoramente sob o regime privado. As propriedades com superfícies florestais e silvestres pertencem essencialmente a famílias e a comunidades rurais (baldios). As pessoas, não as espécies arbóreas, têm de ser os agentes ativos na mudança, seja a nível individual, seja enquanto integrantes de estruturas representativas.

Os apoios públicos às florestas, como noutros domínios das atividades rurais, têm de estar centradas numa estratégia de desenvolvimento e valorização do mundo rural. Essa estratégia deve não só suster a sistémica perda de população, mas terá de garantir os meios para fomento das migrações litoral-interior, sobretudo dos estratos populacionais mais jovens e mais qualificados.

A presença constante e ativa das pessoas junto das suas áreas florestas é fundamental para o sucesso dos investimentos que em tais áreas venham a ser concretizados, seja enquanto gestores diretos ou através da delegação dessas funções nos seus representantes.

Todavia, não basta assegurar a presença das pessoas nos meios rurais, é fundamental garantir condições condignas para o seu sustento, ou seja, entre outros, proporcionando que estas possam desenvolver negócios sustentados economicamente, sustentáveis ambientalmente e socialmente responsáveis.

Temos assim dois fatores essenciais de enquadramento: pessoas e negócios.



Na PER, a Acréscimo sustenta que os apoios às florestas portuguesas de devem centrar em três pilares básicos: Pesquisa, Extensão e Regulação.

1. PESQUISA

Ao nível da pesquisa deverá ser dado especial destaque à investigação aplicada, a que permita responder a questões práticas, nomeadamente criar modelos de silvicultura e de gestão que permitam rentabilizar as produções florestais e minimizar os riscos, em particular os relativos aos incêndios florestais, mas também em relação às pragas e às doenças.

Preponderante deve ainda ser toda a investigação que se desenvolva com vista á quantificação e à qualificação de bens e serviços ainda sem valor de mercado (designadas por externalidades). Hoje em dia, dificilmente a economia florestal se sustenta apenas na produção dos tradicionais bens, como a madeira ou a cortiça. Estas produções têm cada vez mais de ser complementados com a produção de outros bens e com a prestação de serviços, nomeadamente dos serviços ambientais. Bens e serviços esses que terão de ter cotação nos mercados. As ações de investigação neste domínio serão fundamentais para a rotura com uma lógica de subsidiodependência e a sua substituição para uma coerente política de pagamento de serviços ambientais e sociais, associadas às superfícies florestais e concretizados pelas famílias e comunidades que as detêm.

2. EXTENSÃO

A extensão florestal, mais do que a divulgação ou a assistência técnica à produção, tem subjacente uma linha de comunicação entre a produção de conhecimento e a concretização de negócios nas florestas. Esta é a razão para a adoção desta terminologia. O PDR 2014-2020 deve ter aqui o seu campo de ação principal no que aos apoios às florestas respeita.

Mais, este serviço de extensão deve ser centrado nas organizações de agricultores e produtores florestais, sob supervisão da autoridade florestal nacional. Associado diretamente a este serviço de extensão florestal estarão necessariamente as Autarquias e as empresas florestais, seja ao nível dos serviços, seja as da indústria.

Na perspetiva do PER, no que aos apoios do PDR 2014-2020 respeita, a Acréscimo defende, como condição necessária para a atribuição de financiamento público a um investidor, a obrigatoriedade da sua filiação numa organização de produção florestal. Esta última, através de contratos-programa com o Estado, deverá ser o garante do retorno económico para a Sociedade do esforço desta para com as florestas.

Igualmente, o PDR 2014-2020 deverá dar destaque a investimentos da indústria florestal no reforço do seu autoabastecimento, seja por si, seja através de contratos específicos com as famílias e comunidades detentoras de superfícies florestais, diretamente ou através das suas organizações representativas.

Aspeto preponderante para uma boa concretização dos investimentos, sobretudo atendendo às características específicas dos florestais, é a intervenção de agentes devidamente qualificados, seja através de sistemas de certificação ou da criação de alvarás apropriados.

3. REGULAÇÃO

Pilar determinante para o sucesso, até face ao diagnóstico das últimas décadas, é a criação de uma entidade reguladora dos mercados de bens e de serviços de base florestal, dando inclusive concretização ao, a este respeito, definido no guião “Um Estado Melhor”, aprovado em Conselho de Ministros, a 30 de outubro de 2013 (pág. 60).

segunda-feira, 10 de março de 2014

Números e consequências (1)

Recentemente, o Grupo Portucel Soporcel, através de uma empresa de Comunicação, fez transparecer o seu peso na economia nacional. 

Em 2013, em referência a dados disponibilizados pelo INE, o grupo informa representar 1% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional. O Grupo foi no ano transato o 2.º maior exportador nacional em valor bruto, com um peso de cerca de 3% das exportações nacionais de bens. O conjunto das fileiras silvo-industriais nacionais assegura cerca de 10% das exportações nacionais.

Atualmente, pouco mais de 3% das exportações nacionais, em valor bruto, em pasta celulósica e em papel, menos de 1/3 das exportações nacionais de base florestal, dispõem da 5.ª maior área de eucaliptal do mundo, ou seja, de uma área superior à existente na Austrália, região de origem da espécie, ficando abaixo da Índia (8.005 mil hectares), do Brasil (3.407 mil hectares), da China (1.134 mil hectares) e (talvez ainda) da Espanha (931 mil hectares, em 2006).

Tendo em conta os dados históricos do Inventário Florestal Nacional, a área nacional de eucalipto mais do que duplicou (110,4%) desde a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia. Segundo o Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF), só entre 1995 e 2010 esse aumento foi de 13%.


Apesar do aumento significativo em área nos últimos 30 anos, a produtividade média dos eucaliptais nacionais regista atualmente um valor já identificado em 1928.

Temos assim que a estratégia das empresas deste setor e do próprio País assenta numa aposta em quantidade (massificação em área), não em qualidade (produtividade por área).
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Mas, tem sido esta aposta do País coerente com o interesse nacional?

Curiosamente, enquanto se tem vindo a efetivar esta aposta, da produção em quantidade de rolaria para trituração pela indústria de pasta e papel, entre 1990 e 2010, o peso do Valor Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura no VAB nacional, de acordo também com os dados do INE – Contas Económicas da Silvicultura, registou um declínio progressivo de 67%. O seja, registou-se um decréscimo acentuado da economia florestal (atividade produtiva, comércio de madeiras e prestação de serviços á produção).

Só entre 2000 e 2010, agora ao nível das fileiras silvo-industriais, foi registado um declínio de 40% no peso do setor florestal ao nível do Produto Interno Bruto (este já de si em declínio na década em causa). Curiosamente, o decréscimo do peso no PIB foi muito mais acentuado ao nível da indústria, do que na silvicultura.

Também no emprego no setor, o declínio é evidente, sobretudo ao nível da indústria.


Grosso modo, sem aprofundar as relações de interdependência, cresce o peso do Grupo Portucel Soporcel na economia nacional, aumenta a área de eucaliptal em Portugal, decresce o peso económico e social da floresta portuguesa, bem como o peso do setor florestal português (floresta + indústrias de base florestal).




sexta-feira, 7 de março de 2014

Contributo à consulta formulada pelo Grupo de Trabalho para Análise da Problemática dos Incêndios Florestais

Preâmbulo

A Acréscimo agradece a consideração manifestada pelo Grupo de Trabalho, constituído por iniciativa da Senhora Presidente da Assembleia da República, ao permitir que esta associação expresse o seu contributo num tema que assume elevada preocupação política, social, económica e ambiental.

A Acréscimo considera contudo que esta problemática decorre de uma consequência, determinada por uma causa.

Numa visão, autodefinida como eco-social, entendemos que o declínio na viabilidade do negócio florestal, a causa, está subjacente à ausência de adequadas práticas de gestão florestal, o efeito, o que tem gerado um acréscimo de risco na propagação dos incêndios florestais, a consequência que se tende a agravar com as alterações climáticas. Esta visão está na base das respostas às questões que gentilmente nos colocaram.



Questões e respostas

a)     Quais os principais estrangulamentos que identifica no âmbito do SNDFCI e quais as prioridades que o poder político deve ter em conta e procurar resolver, tendo em conta os constrangimentos a que o país está obrigado devido ao Programa de Assistência Económica e Financeira?

O SNDFCI enfrenta problemas decorrentes da causa e consequente efeito que, não estando na origem, potenciam condições para uma mais fácil propagação dos incêndios florestais.

A causa consubstancia-se na incapacidade, em parte significativa do território nacional, das superfícies florestais e silvestres gerarem rendimento que permita custear a adoção de práticas comerciais e de princípios técnicos florestais, o que em comum integram o conceito de gestão florestal, ao qual se associa ainda a componente da sustentabilidade.

Assumindo que o abandono da gestão de parte significativa dos espaços florestais e silvestres nacionais se consubstancia num modelo de gestão determinado pelas perspetivas de rendimento que as mesmas possam gerar, o facto é que este modelo não permite a concretização das operações silvícolas mínimas, sequer para a defesa das mesmas em caso de incêndio florestal. Isto, a par da concretização de medidas de proteção também contra a proliferação de pragas e de doenças.

Tendo em consideração os constrangimentos decorrentes do Programa de Assistência Económica e Financeira, que podem condicionar no imediato a adoção de medidas de carater estrutural, como o reforço da pesquisa, bem como o estabelecimento de um serviço de extensão florestal, suscita-se vivamente à concretização de medidas que, previstas no documento “Um Estado Melhor” aprovado em Conselho de Ministros a 30 de outubro de 2013, não acarretam acréscimo de encargos líquidos para o Estado.

Face ao reconhecido decréscimo do rendimento empresarial líquido na silvicultura, bem como o desequilíbrio existente nas relações comerciais nas principais fileiras de produção lenhosa, deverá o poder político, também no setor silvo-industrial, atribuir “maior importância às funções de regulação, supervisão e inspeção”, “por serem uma condição essencial da garantia de funcionamento dos mercados e das entidades que neles interagem”.

Todavia, numa abordagem de carácter estrutural, importa ter em consideração a aposta na pesquisa e na extensão, no imediato, na definição dos apoios às florestas a integrar o Programa de Desenvolvimento Rural 2014/2020.

A utilização presente do termo extensão visa reforçar que, a componente de divulgação e de assistência técnica à produção florestal, deverá estar claramente associada à produção de resultados pela investigação, servindo a extensão como veículo de transmissão destes mesmos resultados aos agricultores e demais gestores e proprietários de superfícies florestais e silvestres.


b)     Sendo as Redes primárias de Faixas de Gestão de Combustíveis uma infraestrutura fundamental e porque continuam a existir áreas de responsabilidade menos claras, quem considera que deve assumir o seu planeamento, execução e manutenção nas áreas onde não há ZIF’s constituídas ou que não sejam da administração central ou local?

As responsabilidades pela concretização de operações florestais, mesmo as integradas na DFCI, atendendo às características das superfícies florestais portuguesas, ou seja a posse de mais de 90% das mesmas por privados, devem estar tanto quanto possível dependentes destes agentes, no caso, devidamente organizados em estruturas representativas, com as quais o Estado deverá estabelecer contratos-programa.

A atual incapacidade, em parte significativa do País, em gerar rendimento a partir do negócio silvícola para custear os custos com o planeamento, execução e manutenção destas Redes, justificam, no âmbito do Interesse Público, a comparticipação do Estado nestes encargos.

Assume-se aqui claramente que, esta intervenção do Estado decorre da sua incapacidade, até ao momento, de assegurar dois elementos fundamentais em termos de DFCI: (1) a presença ativa de pessoas nos meios rurais, pela contenção do êxodo rural e inversão das migrações interior-litoral; e, (2) a viabilização dos negócios silvícolas e, consequentemente, à sustentação, à sustentabilidade e à responsabilização social dos investimentos silvo-industriais.



c)     Um dos problemas muitas vezes levantados com o qual é igualmente justificada a reduzida taxa de execução das faixas de gestão de combustíveis (rede primária e secundária), tem que ver com a falta de capacidade de identificação dos proprietários e o inconsequente levantamento dos autos por parte da GNR. Como podem ser ultrapassados estes problemas?

A identificação dos detentores das superfícies florestais, em especial no caso português, com a maior taxa mundial das mesmas sob o regime privado, é “indispensável”, tal como mencionado no Programa do XIX Governo Constitucional. Sem esta identificação, do nosso ponto de vista, não existirão medidas de política florestal consequentes, quanto mais não seja, porque o Legislador desconhece o público alvo dos diplomas legais que produz (tradicionalmente muito centrados no arvoredo, não nos detentores do arvoredo).


d)     Como é que um Plano Nacional do Uso do Fogo poderia diminuir a continuidade da carga combustível horizontal e vertical e que entidades deveriam estar creditadas para o fazer? Qual o papel das OPF´s nesse Plano Nacional?

O uso do fogo é uma das práticas possíveis para a diminuição da carga combustível.

Esta como outras práticas adequadas ao mesmo fim, deve assentar na opção dos detentores ou gestores das superfícies florestais e silvestres portuguesas, desejavelmente enquadrado no âmbito do negócio florestal (produção de bens e prestação de serviços a partir destas superfícies).

Assim, uma intervenção das OPF neste domínio é determinante, assumindo o Estado as consequentes funções de formação e supervisão.



e)     Considera importante que as Equipas de Sapadores Florestais continuem a fazer serviço público durante uma parte importante do ano? Quais são os constrangimentos e benefícios que este serviço público trás para a gestão operacional das ESF? A função das ESF no dispositivo de Especial de Combate a Incêndios está apropriada às características destas equipas?

A esmagadora maioria das superfícies florestais portuguesas estão submetidas ao regime privado, todavia, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 2.º da Lei n.º 33/96, de 17 de agosto, cabe a todos os cidadãos a responsabilidade de as conservar e proteger. Desta forma, é justificável a intervenção das ESF na concretização de serviço público.

No que respeita ao combate a incêndios, a Acréscimo defende a criação de corpos especializados de sapadores florestais bombeiros, num modelo similar ao existente na região francesa da Aquitânia, facto que determina o nosso posicionamento sobre o reforço das funções das ESF também neste domínio.


f)      Até onde deve ir a responsabilidade civil dos proprietários e produtores florestais na não gestão? Ou seja, um proprietário florestal deve ser penalizado se a sua opção de não gestão contribuir para causar danos em terceiros?

Como mencionado na abordagem à alínea a), a opção pela não gestão decorre das expectativas de rendimento do negócio florestal.

Desta forma, a responsabilização dos proprietários e produtores florestais tem de ser inserida no pressuposto de que o Estado assegure previamente as funções que lhe estão atribuídas, designadamente no que sob o rendimento dos negócios silvícolas possa incidir.

A responsabilização dos proprietários e dos produtores florestais privados é uma meta. Existem contudo pressupostos: o Estado, enquanto pessoa de bem, deve assumir previamente as suas próprias responsabilidades, o que até hoje não conseguiu demonstrar.


g)     A não execução da prevenção estrutural, nomeadamente no que diz respeito às Faixas de Gestão de Combustível (rede primária e rede secundária), associa-se a dois problemas de dimensões diferentes: i) financeiro; ii) identificação do proprietário. Como podem ser ultrapassados e quais as alterações, também legislativas, que podem ser implementadas?

Um fator determinante para a ultrapassagem dos problemas está bem definido no próprio Programa do Governo, a identificação dos agentes para uma mudança de estratégia na fruição de bens e de serviços a partir das florestas em Portugal.

Estamos convictos que a atuação na consequência só será efetiva se os esforços forem dirigidos à sua causa.

A viabilização de negócios a partir dos espaços florestais e silvestres, esmagadoramente sob o regime privado e num País de economia aberta, é fundamental. Este deve assentar na só na produção de bens, mas também na prestação de serviços, inclusive os que já hoje são prestados embora sem valor financeiro definido.

Mais do que na produção de mais diplomas legais, pratica que se tem mostrado ineficiente, importa redefinir a estratégia, assente nas pessoas e nos negócios que estas podem desenvolver em meio rural. Para o efeito, defendemos a aposta em três vetores essenciais: (1) na pesquisa; (2) na extensão; e, na regulação dos mercados.

Estamos ainda convictos que, o enquadramento da DFCI deve ultrapassar a própria estratégia florestal, deve enquadrar-se num âmbito mais alargado, numa estratégia de desenvolvimento rural.



h)     Conhecida que é a dimensão da nossa propriedade com pequenas áreas, dificultando o ordenamento florestal, qual a melhor forma de promover o emparcelamento de forma a aumentar a dimensão das áreas a gerir e promover uma melhor gestão florestal em toda as suas vertentes (rentabilidade, espécies, prevenção, etc)?

O modelo das Zonas de Intervenção Florestal pode ser um veículo para ultrapassar as especificidades, assumidas como menos adequadas, à viabilização de negócios sustentados, sustentáveis e socialmente responsáveis a partir das propriedades rústicas com superfícies florestais.

Todavia, face ao seu carácter informal, este veículo deve ser encarado como um meio, não como um fim. Desta forma, entendemos que as ZIF são um mero passo para a constituição futura de sociedades de gestão de grupo.

Considerar as ZIF como um fim poderá ser um erro, com resultados similares aos obtidos com as áreas agrupadas constituídas no âmbito do Programa de Ação Florestal (I QCA), ou do Programa de Desenvolvimento Florestal (II QCA).



Lisboa, 14 de fevereiro de 2014

terça-feira, 4 de março de 2014

Março, Portugal e a Floresta

O mês de março é tradicionalmente associado ao início da primavera, às árvores e às florestas.

No presente ano, associado à campanha “Portugal pela Floresta”, o governo português prepara o anúncio de um novo pacote de apoios públicos à atividade florestal, agora para o período 2014/2020. Tal pacote está a ser preparado sem que os contribuintes tenham conhecimento dos resultados alcançados por apoios anteriores, também concretizados no âmbito da Política Agrícola Comum (PAC), atribuídos desde o I Quadro Comunitário de Apoio (QCA).

Efetivamente, desde a adesão à CEE foram disponibilizados às florestas portuguesas vários milhares de milhões de euros. Com que resultados? Qual o retorno económico para o País?

Será que é possível solucionar os problemas existentes na atividade florestal em Portugal apenas deitando dinheiro sobre eles?

Será possível atenuar tais problemas sem uma intervenção direta nos mercados, caracterizados por uma concorrência imperfeita?

Apesar dos apoios públicos disponibilizados e a disponibilizar, concretizados através dos impostos pagos pelos cidadãos nacionais e europeus, foi ou será possível viabilizar negócios silvícolas sem a correção das disparidades evidentes nos mercados de produtos florestais?

Qual a fatia, no rendimento dos negócios silvícolas, decorrente do financiamento público face ao peso nesse rendimento decorrente dos mercados?

Ao que tudo indica, face ao histórico dos apoios da PAC, o financiamento público atribuído às florestas tem sido incapaz de dar garantias à Sociedade da viabilização dos negócios silvícolas. Negócios que custeiem uma adequada gestão florestal, uma administração das superfícies silvícolas que minimizem os riscos da propagação de incêndios ou da proliferação de pragas e de doenças.

Ainda em 2013, a Acréscimo colocou ao Ministério da Agricultura um conjunto de questões, todavia estas continuam sem resposta.


Elas foram:

1 - Quais as áreas, por espécie e região, que resultaram dos investimentos nas florestas cofinanciados pelos contribuintes no âmbito do I QCA (1996/1992), do II QCA (1993/1999), do III QCA (2000/2006) e do PDR 2007/2013?

2 - Houve interseção de áreas objeto de cofinanciamento público entre os diferentes períodos de apoios? Qual o montante em área e por tipo de investimento?

3 - Face aos montantes investidos, com cofinanciamento público, em pinheiro bravo, como se explica a regressão de área desta espécie em Portugal nos últimos 27 anos?

4 - Face aos montantes investidos, com cofinanciamento público, em sobreiro, como se explica a manutenção de área desta espécie em Portugal ao fim destes 27 anos?

5 - Existem estudos de avaliação de desempenho dos diferentes pacotes de apoio, na sua vertente florestal, ao longo dos 27 anos decorridos de apoios da PAC em Portugal?

6 - Na sequência dos fundos públicos investidos nas florestas portuguesas, qual o retorno respetivo para a Sociedade, quer em termos económicos, mas também ao nível ambiental e social?

Outras poderiam ter sido colocadas, designadamente no que respeita ao impacto dos fundos da PAC ao nível da propagação de incêndios florestais, bem como na proliferação de pragas e de doenças nas florestas em Portugal.

No que respeita aos incêndios florestais, os últimos 27 anos de apoios da PAC às florestas portuguesas não providenciaram um resultado animador.


Num outro nível, qual o impacto dos fundos da PAC, aplicados nas florestas portuguesas, ao nível dos números expressos no tempo nas Contas Económicas da Silvicultura (publicadas pelo INE)?

Curiosamente, apesar dos significativos apoios da PAC, o peso do Valor Acrescentado Bruto (VAB) da atividade florestal no VAB nacional tem registado, nos últimos 20 anos, um decréscimo progressivo.

VAB SILVICULTURA / VAB NACIONAL

Ao que tudo indica, o País andou a queimar e continuará a derreter dinheiro nas florestas.