terça-feira, 17 de março de 2015

As coimas nas florestas – ignorância ou má fé?

O Governo tem feito circular pela Comunicação Social o resultado do seu desempenho na cobrança de coimas na falta de limpeza das florestas. Mas poderá ser este desempenho considerado como medida de promoção ao desenvolvimento florestal no País? Será a estratégia da coima seguida por ignorância ou por má fé?


Há algum tempo atrás, era notícia na Comunicação Social o empenho dos produtores de castanha no acompanhamento da produção dos seus soutos. Chegou a ser noticiado que tais produtores chegavam a viajar de avião, da diáspora, para monitorizarem no local a produção dos seus castanheiros. Pelo contrário, no que respeita ao pinhal bravo, as superfícies florestais com esta espécie tendem a ser abandonadas ou a serem reconvertidas para outros usos. Igualmente, é notório o crescente abandono da gestão dos eucaliptais nacionais, sobretudo em regiões de minifúndio. O que haverá de diferente entre o entusiasmo no castanheiro e o abandono do pinhal, e mesmo do eucaliptal? Ocorrerá esta diferença no comportamento da oferta, ou será consequência da situação vigente na procura?

Ao contrário do mercado da castanha, a procura nos mercados de madeira de pinheiro bravo e de eucalipto esta fortemente concentrada. Nestes dois últimos casos, grandes grupos industriais dominam, impondo unilateralmente os preços à oferta. Embora este seja um facto conhecido há longos anos, também é facto que este comportamento de domínio tem sido protegido pelas várias governações.

Mas, o essencial da questão ainda não fica por aqui. Enquanto o funcionamento dos mercados em concorrência imperfeita vitima e favorece agentes económicos privados, embora no primeiro caso estejam centenas de milhares de famílias, o facto é que, em consequência, toda a Sociedade tem sido vítima. Não estão em causa apenas questões de natureza financeira, resultantes da quebra progressiva do rendimento líquido dos produtores florestais. Estão sobretudo em causa questões de natureza social, associados ao êxodo rural, na degradação da qualidade de vida, quer das populações rurais, mas também das urbanas, no emprego, com o encerramento de muitas pequenas e médias empresas de base local e regional, e questões de natureza ambiental, associadas à delapidação dos recursos naturais, à propagação de incêndios, à proliferação de pragas e de doenças, à perda de biodiversidade, á desregulação dos regimes hídricos e ao avanço de processos de desertificação, entre outros.

Se o negócio industrial não permite um rendimento na produção que sustente uma gestão florestal ativa, profissional e sustentável, tal negócio é nefasto ao País.


Sem um negócio florestal viável, seja do ponto de vista financeiro, mas também no domínio da sustentabilidade dos ecossistemas e da qualidade do emprego, não é possível custear uma adequada gestão florestal, com impactos na proteção da floresta nacional.

Os apoios públicos, por muito generosos que sejam, não substituem a regulação de mercados em concorrência imperfeita. O histórico dos apoios da Política Agrícola Comum (PAC) às florestas em Portugal é bem prova disso. Infelizmente, têm produzido desflorestação, menos emprego no setor, perda de valor económico da florestal e diminuição do peso do setor florestal nacional no Produto Interno Bruto (PIB). Resolver-se-á este problema com coimas a idosos e a ausentes? Ou, terão os governos competência para regular os “fortes”?


A culpabilização, em especial de migrantes e pensionistas, pela situação de declínio progressivo das florestas portuguesas é uma inequívoca manifestação de incompetência governativa. Será essa incompetência resultante de ignorância ou de má fé? Importa ter em conta que, ao proteger sistemática e conscientemente interesses financeiros a jusante das florestas, permitindo que os mercados funcionem em concorrência imperfeita, a dúvida dissipa-se. Em todo o caso, importa que a Sociedade tenha presente que essa incompetência tem tido elevados custos na economia nacional e no território, seja no plano social, seja no ambiental.


sexta-feira, 13 de março de 2015

O Presidente e as florestas

O Presidente da República, numa recente deslocação à região Centro, manifestou a necessidade de empenho dos Portugueses para com as florestas. Não haverá muito a comentar, para além do realce a dois pormenores: um sobre o real empenho dos Portugueses e o outro sobre o retorno desse empenho.


Porventura, o senhor Presidente da República está mal assessorado. Os Portugueses têm dado um importante contributo para as florestas. Muito para além da participação de muitos cidadãos em ações de voluntariado, importa realçar o contributo dos contribuintes no cofinanciamento ao investimento florestal, seja através do esforço em sede de fundos da Política Agrícola Comum, seja do Orçamento do Estado. Desde a adesão à União Europeia, o contributo tem envolvido centenas de milhões de euros provenientes dos nossos impostos. Mais, os Portugueses demonstram o seu empenho para com as florestas portuguesas a cada deslocação a um posto de venda de combustíveis líquidos, no regular abastecimento das suas viaturas. Seria aliás legítimo um agradecimento público, por parte dos decisores políticos, por estas evidentes provas de empenho. Enquanto contribuem para as florestas, os cidadãos deixam para segundo plano outros investimentos, incluindo as necessidades das suas famílias.

O segundo pormenor prende-se com o retorno deste empenho dos Portugueses. Com os mercados de produtos florestais em manifesta concorrência imperfeita, será que esse empenho tem tido resultados positivos? O diagnóstico realizado às florestas e ao setor florestal nas últimas décadas está longe de o comprovar, seja no plano económico, seja no social e no ambiental. Centenas de milhões de euros de empenho dos Portugueses geraram um retorno de menos área florestal, florestas cada vez mais degradadas, decréscimo do peso do setor no PIB (que já de si não tem tido uma evolução brilhante), muito menos postos de trabalho no setor, mais emissões de dióxido de carbono decorrente dos incêndios florestais, menos biodiversidade, recursos naturais cada vez mais delapidados. Esse empenho, para além de mais incêndios, mais pragas e doenças, maiores áreas com espécies invasoras, contínuo êxodo rural, tem assistido ao crescimento de oligopólios que cativam importantes somas em benefícios fiscais e que, a qualquer momento encontrarão motivos para se deslocalizar, mas nós ficaremos com o território, esse não se deslocaliza.

Tudo indica pois que os problemas que envolvem as florestas em Portugal não se resolvem apenas pelo empenho dos Portugueses. Ou melhor, talvez esse empenho tenha de ser redirecionado. Não tanto no cofinanciamento ao investimento florestal, através dos seus impostos e das taxas que lhes são cobradas, nem mesmo no seu empenho em ações de voluntariado, em plantações esporádicas de arvorezinhas, mas talvez pela exigência de mercados transparentes e a funcionar em concorrência perfeita. Talvez este último empenho tenha resultados decisivamente positivos.