segunda-feira, 8 de junho de 2015

Certificação, hipocrisia e florestas

João Ferreira do Amaral, presidente da AIFF, Associação para a Competitividade da Indústria da Fileira Florestal, veio recentemente a público anunciar que a área florestal em Portugal tem vindo a diminuir nas últimas décadas. A Acréscimo entendeu a mensagem subjacente ao anúncio do presidente da AIFF.


O presidente da AIFF aparenta andar distraído, o facto que aponta em 2015 é conhecido há anos. Mas, vamos dar mais umas informações que nos parecem relevantes, estas do lado da indústria florestal:
  • O peso do emprego na indústria florestal tem decrescido abruptamente nas últimas décadas, de mais de 250 mil postos de trabalho na década de 90 do seculo passado, para menos de 100 atualmente:
  • O peso do setor florestal nas exportações também, dos 12% do início da década de 90 do seculo passado, para perto de 9% atualmente; mais,
  • O peso da indústria florestal no PIB nacional tem decrescido substancialmente nas últimas décadas.

Importará é questionar o porquê da contração da área florestal nacional.
  • Temos tido uma política florestal que salvaguarde a floresta nacional, essencialmente privada, por forma a garantir a sustentabilidade de um setor silvo-industrial em Portugal?
  • Os instrumentos e medidas de política florestal em Portugal têm contribuído para o crescimento do rendimento da atividade silvícola, permitindo assegurar uma ajustada gestão florestal (nas suas vertentes técnica, comercial e ambiental) e assim melhorar a produtividade e assegurar uma adequada resposta à procura de produtos florestais?
  • Tem havido um regular e transparente funcionamento dos mercados de bens florestais, ou algumas empresas industriais, com a proteção governamental, tem determinado a “regras do jogo”?


Uma coisa sabemos: uma floresta que gera rendimentos aos seus proprietários, em que o Estado assegure funções claras de regulação dos mercados, não estará sob risco de abandono. Ou melhor, sob risco de os seus proprietários adequarem a gestão dos seus espaços florestais às expectativas de rendimento que nestes possam ser gerados. Alguns iluminados chamam a isso de abandono. Iluminados ou interesseiros do lado da procura?

Também sabemos que, num país onde esse rendimento é condicionado pela procura, onde os governos protegem oligopólios, acabam por ser os contribuintes a pagar a fatura dos riscos e a suportar forçadamente negócios industriais (acabam por ser seus acionistas à força).



A mensagem do presidente da AIFF tem alegadamente por base, não o desconhecimento dos factos, mas a sua manipulação. O que o presidente da AIFF parece pretender é chamar os contribuintes a pagar uma fatura que os proprietários florestais têm manifestado reservas em pagar: a certificação florestal. A certificação florestal deveria beneficiar todas as partes, mas ao que parece não beneficia uma delas, a dos proprietários florestais. Daí o apelo aos contribuintes, reclamando ao Governo a afetação de ajudas públicas para suportar um negócio com um só vencedor. Não, não são os proprietários florestais, nem tão pouco os contribuintes.

A “ameaça” latente sobre o recuo da área florestal nacional será sempre inadmissível. Parece servir apenas para lembrar os “pecadores” que há que pagar a “dízima”. Assim, ficarão libertos dos seus “pecados”. E alguns especuladores financeiros mantêm seguras as distribuições de dividendos aos seus acionistas (ou melhor, a alguns deles, não a nós contribuintes).

A Acréscimo manifestou anteriormente total discordância com a afetação, anunciada pelo governo, de fundos públicos (via PDR 2020) a um negócio que se deve desenvolver apenas entre privados, o da certificação florestal. Não há justificação para apelar ao apoio dos contribuintes num negócio que já suportam como consumidores (quando voluntariamente optam por adquirir bens de base florestal certificados).