quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Estratégia nacional para as florestas: um novo paradigma.


Nos últimos 20 anos, o valor económico da floresta portuguesa tem conhecido um declínio progressivo, com as consequentes repercussões sociais e ambientais.

·        O peso do Valor Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura no VAB nacional registou um variação de - 66,7% (dos 1,2% registados em 1990, passou para apenas 0,4% em 2010).



·        Por sua vez, o impacto da fileira florestal (floresta e indústria de base florestal) no Produto Interno Bruto (PIB) teve uma variação de - 40% (dos 3% registados em 2000, para os 1,8% mensurados em 2010).

·        O setor vivência atualmente uma situação de relações win-lose entre a indústria e a produção, com sintomas evidentes de concorrência imperfeita (monopólio) nas suas principais fileiras, fruto da ausência de regulação nos mercados de produtos florestais, acarretando um progressivo declínio do rendimento empresarial líquido dos proprietários florestais, o qual registou, na última década (2000/2010), uma variação de - 250 milhões de euros.



·        Já em 1996, um estudo independente, desenvolvido entre outras pela consultora florestal internacional Poyry, evidenciava que a floresta portuguesa registava em simultâneo um situação de subaproveitamento e de sobre-exploração. A par do abandono progressivo dos solos, hoje com uma expressão que varia entre os 1,5 e os 2 milhões de hectares, os povoamentos florestais existentes sofrem uma forte pressão face à cada vez maior necessidade de abastecimento das diferentes fileiras silvo-industriais nacionais. A sustentabilidade dos recursos florestais nacionais, embora renováveis, está posta em causa.

·        A Lei de Bases da Política Florestal, apesar da aprovação em 1996 por unanimidade na Assembleia da República, continua no essencial, volvidos 16 anos, por implementar.

·        Estratégias e planos são aprovados, publicados e rapidamente substituídos, sem avaliação de resultados. Os objetivos e metas neles definidos não dão adequado impacto ao facto incontornável de que mais de 90% da floresta portuguesa é privada, pertença de centenas de milhares de pequenos proprietários rústicos, em grande parte não identificados.

·        O cadastro rústico foi entretanto (na presente legislatura), mais uma vez, adiado, muito embora seja um instrumento essencial ao ordenamento do território e bem assim para a implementação de políticas de desenvolvimento rural, em particular as de incidência nas superfícies florestais e silvestres.

·        Os diplomas legislativos entretanto publicados, com incidência sobretudo nas árvores, rapidamente se tornam caducos por impossibilidade de cumprimento ou ausência de fiscalização.

·        Perderam-se para os incêndios florestais centenas de milhões de euros dos contribuintes, nos fundos públicos disponibilizados à atividade florestal desde a adesão à União Europeia. Ao contrário do retorno económico, social e ambiental esperado pela Sociedade, assistiu-se ao crescimento da “indústria do fogo”, fruto da incapacidade política quer na definição do enquadramento dos apoios, quer na fiscalização e avaliação da sua implementação.

Os ecossistemas florestais portugueses, salvo raras e meritórias exceções, embora de cariz regional, chegaram a uma situação de insustentabilidade, quer sobre o ponto de vista ambiental, mas também social (êxodo rural) e económico.

Urge assim protagonizar uma mudança de paradigma.

·        A política florestal tem de assentar na realidade rural nacional, concretamente deve ser centrada nas centenas de milhares de proprietários rústicos com superfícies de aptidão florestal, tornando-os os agentes efetivos da mudança, bem como deverá integrar-se numa visão mais abrangente que incorpore outras políticas de desenvolvimento rural.

·        O planeamento estratégico florestal deve ser definido no sentido down to top, alicerçando as necessidades das diferentes fileiras na rentabilidade das superfícies florestais existentes e potenciais, respeitando os princípios da gestão florestal sustentável.



·        Deve ser criado o estatuto do silvicultor (produtor florestal), onde constem os direitos (à cabeça o de posse) e os deveres (concretamente a obrigatoriedade de, por si ou por terceiros, gerir), identificando quer as linhas de incentivos (financeiros e fiscais) para a gestão florestal sustentável, quer as penalizações e responsabilizações por sinistros decorrentes da persistência no absentismo.

·        O Estado deve definir, em pacto de regime, o apoio a médio e longo prazo ao associativismo agroflorestal, concretizando, por contratualização, os direitos e os deveres, bem como os mecanismos de avaliação de desempenho, que enquadre a atividade das organizações sócio-profissionais e sócio-económicas de silvicultores ou produtores florestais.

·        Para a rentabilidade dos solos com aptidão florestal, a aposta do Estado deve consistir:

o   Na definição de um serviço de extensão florestal, com recurso às potencialidades do associativismo florestal, assegurando assistência técnica e formação aos diferentes agentes económicos, com a aposta no aumento das produtivdades e na sustentabilidade dos recursos naturais;

o   Na criação de mecanismos para a regulação dos mercados, assegurando a concorrência perfeita entre a produção e os demais agentes económicos; e,

o   No reforço da investigação aplicada, como suporte ao serviço de extensão florestal, tendo em vista o acréscimo sustentável das produtividades dos bens oriundos da florestal, bem como, com importância futura determinante, na quantificação e na qualificação de bens e serviços ambientais ainda sem valor de mercado, bem como na adaptação dos ecossistemas florestais às alterações climáticas.

·        Os incentivos financeiros futuros, designadamente os decorrentes da PAC 2014/2020, devem assentar na contratualização, com os beneficiários, de garantias reais de uma efetiva e eficiente gestão florestal ativa, como garante de retorno económico à Sociedade. O Fundo Florestal Permanente deve centrar-se na remuneração aos proprietários pelos serviços ambientais proporcionados pelas gestão ativa e sustentável das suas explorações (a comprovar por certificação adequada).

·        A par dos incentivos financeiros públicos, devem ser apoiados fundos de garantia, para facilitar o recurso à banca, bem como incentivados os fundos privados de investimento imobiliário florestal, designadamente os que possam ser geridos por agentes económicos do setor, concretamente para a garantia de um sustentável autoabastecimento industrial.

Longe de querer ser exaustiva, a proposta da Acréscimo assenta na imperiosa e urgente necessidade de Sociedade Portuguesa encarar os problemas das florestas portuguesas e, bem assim, de suscitar a discussão para que os mesmos sejam resolvidos ou atenuados, com claros ganhos económicos, sociais e ambientais para o País.

quinta-feira, 22 de novembro de 2012

Os conceitos e os números: como tapar o Sol com a peneira.


Nem sempre os números publicamente avançados pelos responsáveis políticos se adequam aos conceitos invocados. Como exemplo, registam-se as recentes declarações proferidas pela ministra Assunção Cristas sobre o peso da floresta no Produto Interno Bruto (PIB). Haverá nisto intenção de tapar o Sol com a peneira ou será caso de má assessoria à governante?

Assim, de acordo com o glossário do Instituto Nacional de Estatística (INE), o conceito de floresta está associado a terrenos dedicados à atividade florestal, onde se incluem os povoamentos florestais, áreas ardidas de povoamentos florestais, áreas a corte raso e outras áreas arborizadas. Enquadrando o setor primário, este conceito não enquadra a indústria florestal, embora esta última se possa associar à atividade silvícola quando abordada numa ótica de fileira, setor florestal ou silvo-industrial.

Aqui chegados e de acordo com dados publicados em dezembro último pelo Gabinete de Planeamento e Políticas do MAMAOT, tendo por base as Contas Nacionais do INE, a floresta registou em 2010 um peso no PIB de apenas 0,5%. Já as indústrias florestais registaram, nesse mesmo ano, um peso no PIB de 1,3%. No conjunto da fileira florestal, o peso no PIB foi em 2010 de apenas 1,8%. Em 2000, o peso do setor florestal foi efetivamente de 3%, valor não mais registado desde então.

Importância do complexo agroflorestal no PIB

Desta forma, a ministra Assunção Cristas, ao afirmar que a floresta “vale três por cento” do PIB, ou foi mal informada, ou está a querer iludir ao tentar tapar o Sol com a peneira.

Seria porventura mais útil à floresta e ao setor florestal se o MAMAOT anuncia-se medidas de regulação dos mercados de produtos florestais, que permitam uma maior rentabilidade da floresta, e assim uma ativa e sustentável gestão da mesma, com impacto positivo na redução da propagação dos incêndios e da proliferação de pragas e de doenças, riscos que hoje condicionam gravemente qualquer iniciativa de investimento florestal.

Efetivamente, a atividade silvícola registou na última década (2000/2010) um declínio progressivo, isto apesar do saldo fortemente positivo evidenciado pela indústria florestal no período 2006/2011.

A floresta apresentou, entre 2000 e 2010, taxas de variação médias anuais negativas de 2,0% em volume e de 2,3% em valor, o que refletiu o efeito da diminuição dos preços no produtor.

Por sua vez, o custo dos meios de produção teve nesse período um impacto bastante negativo na atividade florestal (+7,1%), dado que a evolução dos preços da produção não acompanhou o aumento daqueles, em particular o custo da energia.

Para além dos discursos redondos, aguardam-se medidas concretas que permitam conferir credibilidade ao investimento florestal, mais ainda quando o mesmo é cofinanciado pelos contribuintes.

Referências da Imprensa:


quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Incêndios Florestais - 1,5 milhões de hectares em 11 anos.


No presente ano registaram-se 20.969 ocorrências, menos 1.307 ocorrências abaixo da média registada entre 2002 e 2011, considerando o período que vigora entre 1 de janeiro e 15 de outubro. Embora não seja possível vislumbrar uma tendência degressiva, importa salientar a presente redução, muito embora seja necessário manter e mesmo reforçar os esforços de sensibilização e de educação, de vigilância e de intervenção rápida em sinistros, de investigação criminal e adequação da Justiça a crimes de natureza ambiental, social e económica.

Todavia, a par da diminuição das ocorrências, é evidente no presente ano um aumento significativo da área ardida face a 2011. A área ardida em 2012, no período de 1 de janeiro a 15 de outubro, cresceu 55% face a 2011, sendo que mais de 45% correspondem a povoamentos florestais. Embora abaixo da média registada entre 2002 e 2011, no presente ano os valores de área ardida superaram os registados no quadriénio de 2006 a 2009.

Apesar das potenciais interseções de áreas, no período entre 1 de janeiro e 15 de outubro, arderam nos últimos 11 anos (2002-2012) mais de 1.500.000 hectares, sendo que 53% destes correspondem a áreas de povoamentos florestais.

Nas regiões com maior pressão demográfica persistem os maiores números de ocorrências, muito embora se registem as menores áreas ardidas. Já no interior, onde o êxodo rural é uma realidade, menores números de ocorrências proporcionam significativas áreas ardidas, situação que tende a agravar ainda mais o despovoamento, proporcionando ainda as condições inerentes ao avanço de processos de desertificação.

Considerando os incêndios florestais uma consequência da nula ou fraca rentabilidade dos solos de aptidão florestal, que inviabiliza financeiramente a prática de operações de gestão florestal ativa, a Acréscimo insiste na necessidade do Ministério com a tutela adotar uma atitude pró-ativa, que até aqui não tem tido:

  • Intervindo no acompanhamento das relações das cadeias silvo-industriais, caracterizadas por relações win-lose, de oligopólio industrial, sistematicamente desfavoráveis à silvicultura (produção e exploração florestal), tal como comprovado pelas estatísticas específicas do INE;
  • Assegurando por si ou em parceria com o associativismo agroflorestal e empresas técnicas um serviço nacional de extensão rural, proporcionando aos proprietários com superfícies florestais as condições mínimas de assessoria técnica, que lhes permita uma gestão ativa das suas propriedades de acordo com as melhores práticas silvícolas; e,
  • Investindo na investigação aplicada, no sentido de aumentar a produtividade florestal, no respeito pelos requisitos da gestão florestal sustentável, adotando as melhores práticas silvícolas, bem como para a quantificação e qualificação dos serviços ambientais e de outras produções associadas aos espaços florestais e silvestres.

O anunciado adiamento da concretização do cadastro rústico não é um bom presságio para a redução do impacto dos incêndios florestais em Portugal, tal como o não é para o combate à proliferação de pragas e de doenças que cada vez mais afetam os ecossistemas florestais nacionais. A irresponsável proposta legislativa para a massificação do eucaliptal em regiões de minifúndio também não ajuda à credibilidade do Ministério da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território.

As oscilações dos números ao longo dos anos, comprovam que o Ministério com a tutela das florestas não está a desempenhar cabalmente as funções que lhe estão atribuídas, com claros prejuízos para os contribuintes e para a Sociedade Portuguesa.

terça-feira, 13 de novembro de 2012

Extrativismo ou Desenvolvimento Rural.


As estratégias de algumas fileiras silvo-industriais em Portugal aparentam ter características terceiro-mundistas, de índole meramente extrativista, dissociadas do crescimento sustentável da atividade silvícola, que lhes garante o suporte de abastecimento de matéria-prima nacional, e bem assim desenquadradas de políticas de Desenvolvimento Rural.

Tais estratégias industriais evidenciam estar assentes num relacionamento de egoísmo face aos demais agentes da cadeia silvo-industrial, em particular da produção florestal, o que se pode constatar pela análise dos mais recentes dados específicos publicados pelo Instituto Nacional de Estatística.

Assim, segundo o INE, a par de um “saldo fortemente positivo” da balança comercial portuguesa de produtos industriais de base florestal entre 2006 e 2010, o período de 2000 a 2010 registou um “declínio progressivo da atividade silvícola”, com uma taxa de variação média anual de -2,0% em volume e de -2,3% em valor, muito embora os custos intermédios tenham registado, nesse mesmo período, um acréscimo de 7,1%. A esta situação é imputável quer o aumento do abandono na gestão dos espaços florestais, quer o acréscimo na propagação dos fogos em povoamentos, como registado em 2012, apesar da diminuição das ocorrências.

A estes factos aparecem associadas evidências de subjugação do poder político ao poder económico, abstraindo-se a tutela política da sua função de regulação dos diferentes interesses económicos, ambientais e sociais em presença.

Como exemplo destas evidências aparece o recente caso da proposta governamental de massificação da cultura do eucalipto. O aumento da área de eucaliptal, em teoria a cultura financeiramente mais atrativa para os proprietários florestais tem sido acompanhada por uma diminuição do rendimento empresarial líquido e do peso da silvicultura na economia nacional. Apesar da duplicação da área de eucaliptal em Portugal nos últimos 30 anos, ocupando o país o 5.º lugar a nível mundial nas plantações com estas espécies, neste mesmo período, o Valor Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura (produção e exploração florestal), face ao VAB nacional, registou um decréscimo de 1,2% em 1990 para 0,4% em 2010.


Um outro exemplo, ocorre na fileira energética, concretamente na produção de pellets energéticas, onde as garantias de sustentabilidade de recursos naturais está longe de ser comprovada. Portugal exporta mais de 90% das mais de 900 mil toneladas de pellets que produz, mas durante quanto tempo o conseguirá fazer? 10 anos? 15 anos? Quais as consequências desta produção ao nível da delapidação dos recursos naturais, que embora renováveis carecem de um esforço para uma renovação consequente, assente numa adequada gestão cultural. Neste contexto, afigura-se fundamental a participação desta industria na aquisição e/ou na gestão de área florestal para garantia de autoabastecimento, que sirva simultaneamente para o desenvolvimento e a consolidação das melhores práticas culturais associadas a produções dedicadas.

A indústria florestal portuguesa tem assim, apesar do seu forte impacto exportador, de comprovar ser geradora de resultados líquidos positivos para a Sociedade, não só no plano económico, mas igualmente nos planos ambiental e social, facto que está longe de se poder vislumbrar atualmente. Para o efeito, deve começar por ajustar as suas relações com a produção florestal nacional, conferindo-lhes maior grau de altruísmo, hoje residual, com o intuito de controlar o abandono da gestão dos solos, que hoje representam já cerca de 20% da área continental portuguesa.

Exorta-se assim as principais empresas da indústria pesada de transformação de base florestal a comunicarem à Sociedade as suas estratégias de Responsabilidade Social, não apenas as que envolvam os locais onde têm instaladas as suas unidades fabris, mas fundamentalmente junto das populações rurais dos concelhos nos quais extraem recursos naturais, matérias-primas para a sua atividade industrial

Afinal de contas, quem não deve, não teme.