segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

A ministra da Agricultura e a prevenção dos incêndios florestais

Recentemente, no concelho da Pampilhosa da Serra e no âmbito da campanha “Portugal pela Floresta”, a ministra da Agricultura protagonizou, por breves instantes, uma ação de promoção à prevenção dos incêndios florestais, através do corte por meios motomanuais de vegetação herbácea e arbustiva.

O estímulo à concretização de ações de redução dos riscos dos investimentos florestais, em concreto dos incêndios florestais, mais ainda na proteção de pessoas e bens, é de aplaudir.


Mas, será esta ação mediática protagonizada pela própria ministra condizente com a prática governativa deste membro do Governo de Portugal?

Em quase três anos de mandato da ministra Assunção Cristas, foram várias as ocasiões em que foram trazidas a público notícias dando conta de ineficiências no financiamento público às equipas de sapadores florestais, o que por várias vezes colocou em causa a sua operacionalidade. Ora, sendo as ações de prevenção dos incêndios florestais tão importantes para levarem a própria ministra a equipar-se como sapador florestal, não será a estabilidade operacional das equipas e dos profissionais que as integram fundamental para a salvaguarda do nosso património florestal?

Apesar do protagonismo que assumiu na prevenção dos incêndios florestais, a ponto de se envolver diretamente em operações de campo, porque terá sido a ministra politicamente incapaz de reverter a aplicação de fundos dos Orçamentos do Estado de 2012, 2013 e 2014, priorizando em montante a prevenção ao invés do combate aos incêndios florestais? Com efeito, nestes Orçamentos facilmente fica visível um substancial desequilíbrio nas verbas atribuídas às ações de combate, face ao disponibilizado para as ações de prevenção.

Sendo a redução dos riscos um fator inerente à gestão dos investimentos e estando esta última dependente do rendimento expectável, qual a razão para a ministra se inibir de intervir no acompanhamento dos mercados de produtos florestais, sendo sabido que o rendimento líquido da atividade silvícola tem manifestado um declínio progressivo nas últimas décadas, a ponto de levar ao abandono da gestão de áreas significativas do território e ao incontrolável êxodo rural?

A ausência de expectativas de rendimento na atividade silvícola está na base de uma gestão florestal minimalista ou de abandono, o que coloca em causa as ações de prevenção dos riscos deste tipo de investimentos, não apenas no plano da propagação dos incêndios, mas também na proliferação de pragas e de doenças.

Os encargos com as ações de prevenção dos riscos dos investimentos florestais deveriam ser suportados pelas receitas dos negócios silvícolas. Porque o não são? Porque são os contribuintes chamados a suportar os custos inerentes aos desequilíbrios dos mercados de produtos florestais, quando o Governo protege interesses financeiros, cada vez mais exógenos aos meios rurais?

Face às questões colocadas e à incapacidade de resposta da ministra, fica visível que esta aposta mediática não tem paralelo na ação governativa.

Desta forna, esta aposta no marketing pessoal aparenta ser apenas um meio de encobrir a falta de uma estratégia política para encontrar soluções que permitam atenuar ou erradicar os problemas que se colocam à economia florestal (a montante da atividade industrial), à sustentabilidade dos recursos florestais e com as migrações populacionais do interior para o litoral ou exterior.

Teme-se contudo um reforço destas ações de marketing pessoal nos próximos três meses, bem como um subsequente “eclipse” da equipa ministerial aquando da próxima época estival.


quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Fomento, financiamento público e mercados florestais

Sem conseguir solucionar os problemas existentes ao nível dos mercados de produtos florestais e, consequentemente, da gestão (na componente técnica e também na componente comercial) das superfícies florestais em Portugal, com destaque para as regiões de propriedades rústicas de reduzida e muito reduzida dimensão, o atual governo, a par dos seus antecessores, persiste num caminho de elevado risco, a aposta avulsa em florestações e reflorestações (fomento florestal).

É neste domínio que se insere a mais emblemática iniciativa da ministra Assunção Cristas, o Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho, que alterou o regime de arborização e rearborização com espécies de rápido crescimento, diploma desde sempre fortemente contestado, agora motivo para a constituição da “Plataforma pela Floresta”, iniciativa subscrita pela Acréscimo.

Persistindo no caminho do risco, sem querer intervir no acompanhamento dos mercados, o Ministério tem em preparação o novo pacote de apoios às florestal, a enquadrar no Programa de Desenvolvimento Rural 2014/2020.

Mas, será que é possível solucionar os problemas existentes nas florestas portuguesas deitando dinheiro sobre eles?

Será possível atenuar tais problemas sem uma intervenção direta em mercados caracterizados por uma concorrência imperfeita?

Apesar dos apoios públicos a disponibilizar entre 2014 e 2020, concretizados através dos impostos pagos pelos cidadãos nacionais e europeus, será possível viabilizar negócios silvícolas sem a correção das disparidades evidentes nos mercados de produtos florestais?

Qual a fatia, no rendimento dos negócios silvícolas, decorrente do financiamento público face ao peso nesse rendimento decorrente dos mercados? Ao que tudo indica, face ao histórico dos apoios da PAC às florestas portuguesas, o financiamento público tem sido incapaz de dar garantias à Sociedade da viabilização de negócios silvícolas que custeiem uma adequada gestão florestal, uma administração das superfícies silvícolas que minimizem os riscos produzidos pelos incêndios, pelas pragas e pelas doenças. 

Na antecâmara da preparação do PDR 2014/2020, que diagnóstico foi produzido sobre um histórico de 27 anos de apoios da PAC às florestas portuguesas?

As questões colocadas em 2013 ao Ministério da Agricultura continuam sem resposta. Elas foram:

1 - Quais as áreas, por espécie e região, que resultaram dos investimentos nas florestas cofinanciados no âmbito do I Quadro Comunitário de Apoio (QCA) (1996/1992), do II QCA (1993/1999), do III QCA (2000/2006) e do PDR 2007/2013?

2 - Houve interseção de áreas objeto de cofinanciamento público entre os diferentes períodos de apoios? Qual o montante em área e por tipo de investimento?

3 - Face aos montantes investidos, com cofinanciamento público, em pinheiro bravo, como se explica a regressão de área desta espécie em Portugal nos últimos 27 anos?

4 - Face aos montantes investidos, com cofinanciamento público, em sobreiro, como se explica a manutenção de área desta espécie em Portugal ao fim destes 27 anos?

5 - Existem estudos de avaliação de desempenho dos diferentes programas, na sua vertente florestal, mas também noutros domínios de apoio, ao longo dos 27 anos decorridos de apoios da PAC em Portugal?

6 - Na sequência dos fundos públicos investidos nas florestas portuguesas, qual o retorno respetivo para a Sociedade, quer em termos económicos, mas também ao nível ambiental e social?

Existem mais questões, designadamente no que respeita ao impacto dos fundos da PAC ao nível da propagação de incêndios florestais, bem como na proliferação de pragas e de doenças nas florestas em Portugal. Nos últimos 27 anos, apesar do significativo apoio da PAC, o panorama nas florestas em Portugal, no que respeita a incêndios florestais, a pragas e a doenças, não é nada animador.


Num outro nível, qual o impacto dos fundos da PAC, aplicados nas florestas portuguesas, ao nível dos números expressos no tempo nas Contas Económicas da Silvicultura (publicadas pelo INE)? Curiosamente, apesar dos significativos apoios da PAC, o peso do Valor Acrescentado Bruto (VAB) da atividade florestal no VAB nacional tem registado, nos últimos 27 anos, um acentuado decréscimo.

VAB SILVICULTURA / VAB NACIONAL

Aparentemente, parece que o País anda e continuará a derreter dinheiro nas florestas.


segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

Indicadores da aplicação do DL 96/2013

O Instituto de Conservação da Natureza e das Florestas (ICNF) disponibilizou recentemente a primeira nota informativa, correspondente ao período de 17 de outubro a 31 de dezembro de 2013, com os principais indicadores do regime jurídico aplicável às ações de arborização e rearborização, decorrente da publicação do Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho.

Os elementos estatísticos disponibilizados nesta nota informativa eram os já esperados.

Efetivamente, com a anunciada intenção do governo, manifestada no início de 2012, em alterar o regime jurídico definido pelo Decreto-Lei n.º 175/88, de 17 de maio, que regulamentava as ações de arborização e rearborização com recurso a espécies de rápido crescimento, designadamente do eucalipto, muitas das intenções de investimento com recurso a esta espécie terão ficado em carteira a aguardar um regime de licenciamento que lhes fosse mais favorável. Naturalmente, tais intenções de investimento manifestaram-se agora, no período subsequente à entrada em vigor do Decreto-Lei n.º 96/2013, de 19 de julho.

Desta forma, os dados expressos em número de processos e em áreas por espécie refletem a predominância do investimento em eucaliptais face a outras espécies florestais, sendo que, nestas últimas as eventuais intenções de investimento estarão a aguardar a disponibilização de recursos públicos a inserir nos apoios às florestas do Plano de Desenvolvimento Rural (PDR) 2014/2020. Tem-se assim que, dos 8% em área afeta a intenções de investimento com outras espécies, que não o eucalipto, cerca de 2% correspondem a intenção de investimento por parte do próprio ICNF.

(Fonte: TVI 24, Programa "Olhos nos Olhos", edição de 23/09/2013)

Atestada a esmagadora preponderância da presença do eucalipto nas intenções de investimento, expressas no período de tempo em análise, quer em número de processos submetidos, quer em área a intervir, importa realçar o que parece essencial e que não consta da nota informativa. Ou melhor, o que se esboça apenas em vagas considerações, que ocupam tão só quatro meras linhas, sem quadros de apoio sequer.

Independentemente da espécie em presença, é comummente aceite que o principal fator de risco associado ao investimento florestal se centrar numa inadequada gestão subsequente à instalação dos povoamentos florestais.

A gestão florestal é caracterizada pela aplicação de métodos comerciais e de princípios técnicos florestais na administração sustentável de uma propriedade florestal. Esta está necessariamente dependente das capacidades dos investidores em atingirem rentabilidades no negócio que permitam custear uma adequada administração dos espaços que possuem ou gerem.

Face ao histórico na formação dos preços nos principais mercados de produtos silvícolas e aos rendimentos líquidos na silvicultura, esta questão não pode ser desprezada.

Ora, neste domínio, na nota informativa em causa, muito consta sobre as árvores, até um gráfico com a distribuição do número de processos por data de entrada, mas nada consta sobre as pessoas que detêm os espaços florestais onde se pretende intervir. Ou seja, não é disponibilizada informação sobre o perfil do investidor, muito embora este seja essencial para a Sociedade pode avaliar, face ao histórico conhecido, qual a probabilidade de risco dos investimentos que a Administração tem por obrigação avaliar num espetro mais alargado.

Na presente nota informativa apenas é disponibilizada a informação de que 78% dos processos respeitam a investidores privados não industriais. Todavia, não é disponibilizada informação fundamental sobre a distribuição em área dos processos por tipo de investidor (requerente). Nem sobre a dispersão dos investidores por região do território, muito embora o risco dos investimentos florestais varie em função destas.

Ainda no âmbito da gestão florestal e na necessidade de redução do risco dos investimentos florestais, não é disponibilizada qualquer informação sobre quais das intenções de investimento têm subjacente um Plano de Gestão Florestal (PGF), necessariamente aprovado pela Administração.

Por avaliar está igualmente a viabilidade financeira das intenções de investimento apresentadas e a apresentar, muito embora este seja um fator decisivo para a Sociedade poder ter garantias mínimas na contenção de riscos.