O Governo prepara-se para anunciar a
atualização da Estratégia Nacional para as Florestal (ENF), com a sua primeira
versão aprovada por Resolução de Conselho de Ministro de setembro de 2006 (RCM
n.º 114/2006, de 15/09).
Uma estratégia nacional pressupõe a
elaboração de um diagnóstico no momento presente, a definição de uma visão para
o futuro e os princípios para ação, com vista a atingir os objetivos
pretendidos. Todavia, o diagnóstico utilizado na presente atualização assenta
em 2006, não se identifica uma visão, nem consistentes princípios para a ação.
Uma estratégia nacional para as
florestas não deve, não pode ser desinserida de um contexto mais amplo, de Desenvolvimento
Rural, de Ordenamento do Território, de uma política ambiental e económica.
Ora, a atualização que o governo agora apresenta carece em absoluto desta
fundamental integração.
Pior, para a sua prossecução há que afetar
fluxos financeiros. Inicialmente prevista a conclusão do processo de
atualização da ENF para finais de 2013, a tempo da reparação do Programa de
Desenvolvimento Rural (PDR) 2014/2020, verifica-se contudo que o processo está
atrasado meio ano e que o PDR foi entretanto elaborado e submetido à aprovação
pela Comissão Europeia. Ou seja, não existem garantias de compatibilidade entre
as necessidades financeiras da ENF e os apoios comunitários que vierem a ser
aprovados no âmbito do PDR 2014/2020.
Temos pois que a atualização da ENF,
tal como na versão em vigor se carateriza por uma inconsistência financeira.
Foram definidos objetivos, indicadores e metas, mas não estão definidos os
respetivos planos de investimento, nem de financiamento.
Embora considerada historicamente
fatal, a inconsistência financeira não está isolada. A proposta do Governo
carateriza-se igualmente por fatais inconsistências de natureza política, estrutural
e estratégica.
No plano político, a atualização da ENF,
como aliás na versão inicial, não supre a necessidade, reconhecida historicamente,
de aproximar os ciclos políticos, de curto prazo, aos ciclos florestais, estes
últimos de médio e longo prazo.
No plano estrutural, a inconsistência
revela-se na confusão entre causa, efeito e consequência. Priorizam-se as
consequências, os incêndios, as pragas e as doenças. Reconhece-se o efeito, a
ineficiente ou ausente gestão das florestas. Mas, despreza-se a causa, o que
permite executar e custear uma gestão ativa, profissional e sustentável: as
pessoas e os negócios.
Finalmente, no plano estratégico, a
inconsistência fatal diagnosticada advém da visão tecnocrática que persiste na
abordagem às florestas e à atividade florestal. As árvores continuam a
sobrepor-se às pessoas, muito embora sejam estas últimas que possuem as
superfícies onde se encontram as primeiras. O público alvo de uma estratégia
para as florestas, num país onde mais de 90% da área florestal é privada, tem
de ser constituído prioritariamente pelos agricultores, silvicultores e outros
proprietários rústicos. Todavia, estes parecem continuar a ser considerados
parceiros menores ou de difícil abordagem.
Estas inconsistências fazem da ENF uma
proposta inócua, desinserida das necessidades das florestas e das atividades
silvo-industriais, em especial nas fileiras que apresentam maiores
vulnerabilidades, como as da madeira e mobiliário e da cortiça. É, neste
contexto, um documento condenado ao insucesso (como se tem verificado de 2006 a
esta parte).
Assim sendo para que serve? Trata-se
de um embuste? Serve para tentar legitimar o quê?
Á vista salta o ímpeto para a
alteração à Lei dos Baldios, com uma proposta já em discussão na Assembleia da
República. Propriedade comunitária, com generosas dimensões em área, embora inseridas
em regiões onde predomina o minifúndio em propriedade privada, com solos de boa
fertilidade, abundante pluviosidade e temperaturas amenas, ajustam-se às
anunciadas intenções de reforço da capacidade industrial no setor papeleiro,
designadamente na unidade fabril de Cacia. Urge por isso, “simplificar”,
“desburocratizar”, “flexibilizar os modelos gestão dos baldios”: por um modelo
de gestão privado?
No que respeita a um plano estratégico
para as florestas, a Acréscimo apresentou já, designadamente no Parlamento, uma
alternativa para suprir as inconsistências detetadas. Se é de facto intenção do
Governo dispor de uma Estratégia Nacional para as Florestas, o caminho tem de
ser outro. O presente documento pode servir interesses, mas não será uma
estratégia nacional.
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