Em entrevista à Antena 1, o secretário de Estado das Florestas e do Desenvolvimento
Rural admitiu vir a dar um “murro na mesa”, ao assumir que o governo se prepara
para substituir os proprietários privados na gestão das respetivas áreas
florestais.
Importa esclarecer que, o governo tem sob sua alçada direta a gestão de áreas
públicas de floresta. Matas que representam tão só 2% das superfícies
florestais nacionais. O Estado tem ainda a responsabilidade direta na gestão
florestal de algumas áreas florestais pertencentes a comunidades rurais, os
baldios (baldios que no seu conjunto, geridas pelo Estado ou pelos compartes,
representam 12% da área florestal portuguesa). No conjunto das áreas geridas
pelo Estado, as públicas e as comunitárias sob sua gestão, ao contrário de se evidenciarem
exemplos a seguir, estas revelam atualmente o pior da imagem que pode ser
transmitida em prol de uma gestão florestal ativa e sustentável. São aliás hoje
um ultraje do que foram no passado.
Não estará o governo, através do secretário de Estado, a querer atirar
pedras aos telhados dos vizinhos? Cuidado com os seus próprios!
Retirando as áreas indústrias (6% da área florestal portuguesa), que alguns
“opinadores” estivais assumem como exemplo de gestão (algo muito discutível),
pretende o secretário de Estado intervir em mais de 80% das áreas florestais em
Portugal? Sejamos justos, retiremos as áreas florestais certificadas na posse de
famílias, contudo com uma área pouco superior a 100 mil hectares.
Com que meios o pretende fazer? Sabendo-se da ausência de meios para
intervir sequer nas áreas na posse ou sob gestão do Estado, pretende o governo
transferir o problema para as autarquias? Mas será que concretizou previamente
o trabalho de casa? Sem a conclusão do cadastro rústico (ou instrumento similar)
como podem as autarquias saber quem são os legítimos proprietários dos
terrenos? Ah, o tema do cadastro continua a ser abordado por uma comissão. Um
instrumento básico para intervenção no território continua em abordagem numa
comissão. Um falhanço monumental!
Sob orientação técnica de quem? Os putativos trabalhos de limpeza em matas
privadas, admitindo a constitucionalidade da intervenção, terão acompanhamento
técnico qualificado, ou serão concretizados por quem estiver disponível? É
conhecida a intervenção em florestas de empresas de construção civil. Quem
avalia os impactos dessas intervenções nos ecossistemas florestais? Saiba o
secretário de Estado que a operação de limpeza de florestas é uma intervenção técnica,
distinta da limpeza do pó doméstico, da recolha de lixo depositado em floresta,
e muito distinta da limpeza de terrenos para construção (decapagem de solos),
ou mesmo da limpeza para fins agrícolas.
Adivinha-se contudo que a proposta do governo nesta matéria, aliás já anunciada
em 2010, não é mais do que uma gaffe de Verão, como bem caracterizou na
altura o Eng. Jorge Moreira da Silva, atual Ministro do Ambiente.
Reforçamos que, os terrenos que agora o governo pretende ocupar, são património
das famílias que os seus antecessores obrigaram a migrar para o litoral ou a
emigrar, deixando no interior os mais idosos e vulneráveis.
Reforça-se que, os terrenos privados que o governo agora anuncia
intervencionar, são os mesmos nos quais permite a intervenção de indústrias
extrativistas, abstendo-se de regular mercados em concorrência imperfeita,
deixando os respetivos proprietários reféns de uma atividade florestal em declínio
progressivo à décadas. Afinal, não será este o verdadeiro motivo do abandono da
gestão florestal? Sem garantia de rentabilidade silvícola, como se custeia a
gestão das florestas?
Cuide o governo de garantir a justa rentabilidade na produção de bens e na
prestação de serviços nas áreas florestais privadas, para depois impor normas
de gestão na floresta.
Cuide o governo de definir e concretizar uma estratégia de Desenvolvimento
Rural, para fixar e motivar as famílias a regressar ao interior. Não se gerem
florestas sem pessoas. Neste domínio, a Secretaria de Estado das Florestas e do
Desenvolvimento Rural é uma negação de si própria.
Cuide o governo de fugir ao facilitismo dos anúncios populistas pós-estivas,
porque há gente que morre na floresta. Pessoas que merecem, no mínimo, o anúncio
e a concretização de medidas de fundo credíveis, para que todos possamos dizer
que a sua fatalidade não foi em vão.
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