Foi recentemente publicada em Diário da República a atualização da
Estratégia Nacional para
as Florestas (ENF). Esta iniciativa do governo, apresenta contudo graves inconsistências,
que colocam em causa a sua efetiva concretização.
O
processo de revisão da ENF peca logo pelo diagnóstico, que remonta a 2007. Isto,
mesmo depois de uma atualização mais recente do Inventário Florestal Nacional.
No
processo de revisão da ENF foram mantidas as inconsistências apontadas em 2013
pela Acréscimo. Logo à partida, uma de natureza política: não está assegurada
uma compatibilização entre ciclos eleitorais e ciclos florestais, estes últimos
de médio e longo prazo. A assunção do documento apenas pelo poder executivo não
lhe dá a consistência necessária para assegurar as condições de investimento a
mais logo prazo, sobretudo o que tenha por base as espécies autóctones.
Acrescem
ainda mais duas inconsistências, a estratégica e a estrutural.
Por
um lado, é menorizado o papel dos principais agentes da mudança, os proprietários
florestais, sobretudo os não industriais, embora sejam detentores de mais de 90%
das superfícies florestais em Portugal, agentes que deveriam constituir o principal
público alvo da ENF. A métrica do seu envolvimento pelo crescimento pífio do
associativismo florestal é consideravelmente falível, sobretudo em regiões de
minifúndio e quando os interesses das organizações associativas nem sempre
coincidem com os dos que asseguram representar: atente-se à evolução do
rendimento empresarial líquido na última década, difundida nas Contas Económicas
da Silvicultura, publicadas anualmente pelo INE.
Posse da floresta
Por
outro lado, na ENF são priorizadas sobretudo as consequências, ou seja os
riscos do investimento florestal, nomeadamente os incêndios florestais; os
efeitos, a gestão florestal, ou melhor, a sua ausência em parte muito
significativa dos espaços florestais nacionais; mas, menospreza-se a causa, a
expetativa de rendimento nos investimentos em floresta, ou seja, a obtenção de
receita que permita concretizar uma gestão profissional e sustentável e, dessa
forma, mitigar o efeito dos riscos, quer na propagação dos incêndios, quer na
proliferação de pragas e de doenças. A aposta na causa dos problemas
vivenciados nas florestas portuguesas assume tanto mais relevo quanto mais for
necessário assegurar o investimento no acréscimo de riscos decorrentes das
alterações climáticas. Não haverá florestal protegida, gerida, sem a existência
de negócio nos espaços florestais, negócio esse enquadrado nos princípios da
Economia Verde.
Uma última
inconsistência é de natureza financeira, o desenquadramento entre a ENF e o seu
plano de financiamento público. O novo Programa de Desenvolvimento Rural (PDR
2020) está acometido dos mesmos vícios do passado, dos envelopes financeiros
que o antecederam e que geraram mais problemas nas florestas do que os benefícios
que se desejaria promover. O sucesso do financiamento público às florestas
estará sempre condicionado pela intervenção nos mercados (regulação), pelo
apoio técnico á produção (extensão) e pelo desenvolvimento de um programa coerente
de investigação. Ora, estes aspetos não constam num plano de financiamento
adequado à prossecução dos objetivos e das metas traçadas na ENF.
Uma
estratégia vertida em muito papel, não é em si sinal de uma boa estratégia. A
Acréscimo defende que uma estratégia nacional para as florestas deverá
assegurar os meios para suprir as inconsistências ora apontadas, sob pena de este
não passar de mais um documento morto, aliás como outros no passado.
Interessará
que a ENF seja um documento morto? A avaliar pela política florestal prosseguida
pelo atual governo, tudo indica que sim. A estratégia do governo, como do seu
antecessor, tem passado por proteger interesses financeiros, em detrimento do
território, das populações rurais e da própria economia.
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