Preâmbulo
A
Acréscimo agradece a consideração manifestada pelo Grupo de Trabalho,
constituído por iniciativa da Senhora Presidente da Assembleia da República, ao
permitir que esta associação expresse o seu contributo num tema que assume
elevada preocupação política, social, económica e ambiental.
A
Acréscimo considera contudo que esta problemática decorre de uma consequência,
determinada por uma causa.
Numa
visão, autodefinida como eco-social, entendemos que o declínio na viabilidade
do negócio florestal, a causa, está subjacente à ausência de adequadas práticas
de gestão florestal, o efeito, o que tem gerado um acréscimo de risco na
propagação dos incêndios florestais, a consequência que se tende a agravar com
as alterações climáticas. Esta visão está na base das respostas às questões que
gentilmente nos colocaram.
Questões
e respostas
a) Quais
os principais estrangulamentos que identifica no âmbito do SNDFCI e quais as
prioridades que o poder político deve ter em conta e procurar resolver, tendo
em conta os constrangimentos a que o país está obrigado devido ao Programa de
Assistência Económica e Financeira?
O
SNDFCI enfrenta problemas decorrentes da causa e consequente efeito que, não
estando na origem, potenciam condições para uma mais fácil propagação dos
incêndios florestais.
A
causa consubstancia-se na incapacidade, em parte significativa do território
nacional, das superfícies florestais e silvestres gerarem rendimento que
permita custear a adoção de práticas comerciais e de princípios técnicos
florestais, o que em comum integram o conceito de gestão florestal, ao qual se
associa ainda a componente da sustentabilidade.
Assumindo
que o abandono da gestão de parte significativa dos espaços florestais e
silvestres nacionais se consubstancia num modelo de gestão determinado pelas
perspetivas de rendimento que as mesmas possam gerar, o facto é que este modelo
não permite a concretização das operações silvícolas mínimas, sequer para a
defesa das mesmas em caso de incêndio florestal. Isto, a par da concretização
de medidas de proteção também contra a proliferação de pragas e de doenças.
Tendo
em consideração os constrangimentos decorrentes do Programa de Assistência
Económica e Financeira, que podem condicionar no imediato a adoção de medidas
de carater estrutural, como o reforço da pesquisa, bem como o estabelecimento
de um serviço de extensão florestal, suscita-se vivamente à concretização de medidas
que, previstas no documento “Um Estado Melhor” aprovado em Conselho de
Ministros a 30 de outubro de 2013, não acarretam acréscimo de encargos líquidos
para o Estado.
Face
ao reconhecido decréscimo do rendimento empresarial líquido na silvicultura, bem
como o desequilíbrio existente nas relações comerciais nas principais fileiras
de produção lenhosa, deverá o poder político, também no setor silvo-industrial,
atribuir “maior importância às funções de regulação, supervisão e inspeção”,
“por serem uma condição essencial da garantia de funcionamento dos mercados e
das entidades que neles interagem”.
Todavia,
numa abordagem de carácter estrutural, importa ter em consideração a aposta na
pesquisa e na extensão, no imediato, na definição dos apoios às florestas a
integrar o Programa de Desenvolvimento Rural 2014/2020.
A
utilização presente do termo extensão visa reforçar que, a componente de
divulgação e de assistência técnica à produção florestal, deverá estar
claramente associada à produção de resultados pela investigação, servindo a
extensão como veículo de transmissão destes mesmos resultados aos agricultores
e demais gestores e proprietários de superfícies florestais e silvestres.
b) Sendo
as Redes primárias de Faixas de Gestão de Combustíveis uma infraestrutura
fundamental e porque continuam a existir áreas de responsabilidade menos
claras, quem considera que deve assumir o seu planeamento, execução e
manutenção nas áreas onde não há ZIF’s constituídas ou que não sejam da
administração central ou local?
As
responsabilidades pela concretização de operações florestais, mesmo as
integradas na DFCI, atendendo às características das superfícies florestais
portuguesas, ou seja a posse de mais de 90% das mesmas por privados, devem
estar tanto quanto possível dependentes destes agentes, no caso, devidamente
organizados em estruturas representativas, com as quais o Estado deverá
estabelecer contratos-programa.
A
atual incapacidade, em parte significativa do País, em gerar rendimento a
partir do negócio silvícola para custear os custos com o planeamento, execução
e manutenção destas Redes, justificam, no âmbito do Interesse Público, a
comparticipação do Estado nestes encargos.
Assume-se
aqui claramente que, esta intervenção do Estado decorre da sua incapacidade, até
ao momento, de assegurar dois elementos fundamentais em termos de DFCI: (1) a
presença ativa de pessoas nos meios rurais, pela contenção do êxodo rural e
inversão das migrações interior-litoral; e, (2) a viabilização dos negócios
silvícolas e, consequentemente, à sustentação, à sustentabilidade e à
responsabilização social dos investimentos silvo-industriais.
c) Um
dos problemas muitas vezes levantados com o qual é igualmente justificada a
reduzida taxa de execução das faixas de gestão de combustíveis (rede primária e
secundária), tem que ver com a falta de capacidade de identificação dos
proprietários e o inconsequente levantamento dos autos por parte da GNR. Como
podem ser ultrapassados estes problemas?
A
identificação dos detentores das superfícies florestais, em especial no caso
português, com a maior taxa mundial das mesmas sob o regime privado, é
“indispensável”, tal como mencionado no Programa do XIX Governo Constitucional.
Sem esta identificação, do nosso ponto de vista, não existirão medidas de política
florestal consequentes, quanto mais não seja, porque o Legislador desconhece o
público alvo dos diplomas legais que produz (tradicionalmente muito centrados
no arvoredo, não nos detentores do arvoredo).
d) Como
é que um Plano Nacional do Uso do Fogo poderia diminuir a continuidade da carga
combustível horizontal e vertical e que entidades deveriam estar creditadas
para o fazer? Qual o papel das OPF´s nesse Plano Nacional?
O
uso do fogo é uma das práticas possíveis para a diminuição da carga combustível.
Esta
como outras práticas adequadas ao mesmo fim, deve assentar na opção dos
detentores ou gestores das superfícies florestais e silvestres portuguesas,
desejavelmente enquadrado no âmbito do negócio florestal (produção de bens e
prestação de serviços a partir destas superfícies).
Assim,
uma intervenção das OPF neste domínio é determinante, assumindo o Estado as
consequentes funções de formação e supervisão.
e) Considera
importante que as Equipas de Sapadores Florestais continuem a fazer serviço
público durante uma parte importante do ano? Quais são os constrangimentos e
benefícios que este serviço público trás para a gestão operacional das ESF? A
função das ESF no dispositivo de Especial de Combate a Incêndios está
apropriada às características destas equipas?
A
esmagadora maioria das superfícies florestais portuguesas estão submetidas ao
regime privado, todavia, nos termos do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º
2.º da Lei n.º 33/96, de 17 de agosto, cabe a todos os cidadãos a
responsabilidade de as conservar e proteger. Desta forma, é justificável a
intervenção das ESF na concretização de serviço público.
No
que respeita ao combate a incêndios, a Acréscimo defende a criação de corpos
especializados de sapadores florestais bombeiros, num modelo similar ao
existente na região francesa da Aquitânia, facto que determina o nosso
posicionamento sobre o reforço das funções das ESF também neste domínio.
f) Até
onde deve ir a responsabilidade civil dos proprietários e produtores florestais
na não gestão? Ou seja, um proprietário florestal deve ser penalizado se a sua
opção de não gestão contribuir para causar danos em terceiros?
Como
mencionado na abordagem à alínea a), a opção pela não gestão decorre das
expectativas de rendimento do negócio florestal.
Desta
forma, a responsabilização dos proprietários e produtores florestais tem de ser
inserida no pressuposto de que o Estado assegure previamente as funções que lhe
estão atribuídas, designadamente no que sob o rendimento dos negócios
silvícolas possa incidir.
A
responsabilização dos proprietários e dos produtores florestais privados é uma
meta. Existem contudo pressupostos: o Estado, enquanto pessoa de bem, deve
assumir previamente as suas próprias responsabilidades, o que até hoje não
conseguiu demonstrar.
g) A
não execução da prevenção estrutural, nomeadamente no que diz respeito às
Faixas de Gestão de Combustível (rede primária e rede secundária), associa-se a
dois problemas de dimensões diferentes: i) financeiro; ii) identificação do
proprietário. Como podem ser ultrapassados e quais as alterações, também
legislativas, que podem ser implementadas?
Um
fator determinante para a ultrapassagem dos problemas está bem definido no
próprio Programa do Governo, a identificação dos agentes para uma mudança de
estratégia na fruição de bens e de serviços a partir das florestas em Portugal.
Estamos
convictos que a atuação na consequência só será efetiva se os esforços forem
dirigidos à sua causa.
A
viabilização de negócios a partir dos espaços florestais e silvestres, esmagadoramente
sob o regime privado e num País de economia aberta, é fundamental. Este deve
assentar na só na produção de bens, mas também na prestação de serviços,
inclusive os que já hoje são prestados embora sem valor financeiro definido.
Mais
do que na produção de mais diplomas legais, pratica que se tem mostrado
ineficiente, importa redefinir a estratégia, assente nas pessoas e nos negócios
que estas podem desenvolver em meio rural. Para o efeito, defendemos a aposta
em três vetores essenciais: (1) na pesquisa; (2) na extensão; e, na regulação
dos mercados.
Estamos
ainda convictos que, o enquadramento da DFCI deve ultrapassar a própria
estratégia florestal, deve enquadrar-se num âmbito mais alargado, numa
estratégia de desenvolvimento rural.
h) Conhecida
que é a dimensão da nossa propriedade com pequenas áreas, dificultando o
ordenamento florestal, qual a melhor forma de promover o emparcelamento de
forma a aumentar a dimensão das áreas a gerir e promover uma melhor gestão
florestal em toda as suas vertentes (rentabilidade, espécies, prevenção, etc)?
O
modelo das Zonas de Intervenção Florestal pode ser um veículo para ultrapassar
as especificidades, assumidas como menos adequadas, à viabilização de negócios
sustentados, sustentáveis e socialmente responsáveis a partir das propriedades
rústicas com superfícies florestais.
Todavia,
face ao seu carácter informal, este veículo deve ser encarado como um meio, não
como um fim. Desta forma, entendemos que as ZIF são um mero passo para a
constituição futura de sociedades de gestão de grupo.
Considerar
as ZIF como um fim poderá ser um erro, com resultados similares aos obtidos com
as áreas agrupadas constituídas no âmbito do Programa de Ação Florestal (I
QCA), ou do Programa de Desenvolvimento Florestal (II QCA).
Lisboa, 14 de fevereiro de
2014
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