segunda-feira, 18 de maio de 2020

Estudo do Observatório Técnico Independente sobre biomassa para energia serve lóbi industrial


O Observatório Técnico Independente, criado na Assembleia da República, tornou público, em abril último, um “estudo técnico” intitulado “Redução do risco de incêndio através da utilização de biomassa lenhosa para energia”.

O documento, voluntária ou involuntariamente, presta-se a servir interesses do lóbi da bioenergia. Esta indústria é fortemente subsidiada, tem forte impacte na perda de biodiversidade, de solos, de postos de trabalho no sector silvo-industrial, e contribuiu para o acréscimo de emissões atmosféricas de dióxido de carbono.

Foi com estranheza que a Acréscimo tomou conhecimento desta iniciativa do Observatório Técnico Independente (OTI). Com efeito, ao contrário de relatórios anteriores, de análise, acompanhamento e avaliação dos incêndios florestais e rurais que ocorram no território nacional, desta vez o OTI desenvolveu um documento indutor de uma área de negócio em concreto, num domínio onde várias intervenções técnicas são possíveis, em alternativa ou em complementaridade à queima.

Independente de uma análise e avaliação mais exaustiva, para a qual a Acréscimo já se disponibilizou junto da Comissão Parlamentar de Agricultura e Mar, a associação destaca três fragilidades maiores deste “estudo técnico”:
  1. O documento apresentado agora pelo OTI demonstra ignorar Relatório, de junho de 2013, desenvolvido no âmbito da Comissão de Agricultura e Mar, sobre a solução que agora privilegia para a redução do risco de incêndio, ou seja, a queima de biomassa florestal. Com certeza, todo o esforço desenvolvido pela Comissão, em múltiplas horas de redação e de audições, deveria merecer uma análise por parte do OTI, mais ainda, quando o documento de 2013 revela preocupações sobre a queima de material lenhos para a produção de energia.
  2. O documento do OTI, enquanto estudo técnico, falha na não justificação da opção que adota, pela ausência de comparação com medidas alternativas ou complementares, para o fim em causa – a redução do risco de incêndio florestal e rural. Isto, quer no que respeita a alternativas que envolvam outras áreas de negócio, nos sectores energético ou silvo-industrial, quer no que respeita a medidas complementares de política florestal, de desenvolvimento rural e de ordenamento do território, entre outras.
  3. O documento do Observatório, ao apresentar recomendações para a definição de medidas de política, evidencia uma enorme fragilidade. Com efeito, o estudo em causa não só não se faz acompanhar de uma análise financeira, mínimo essencial para consolidar uma tomada de decisão política, como carece ainda de análise nos domínios económico, ambiental, social e institucional.



Em resumo, não nos parece transparente, menos ainda justificada a independência deste estudo do Observatório, com a opção claramente direcionada que adota para a redução do risco de incêndio. Mesmo que seja mencionado respeitar ao tratamento da biomassa nas redes primária e secundária de faixas de gestão de combustíveis, estas últimas são hoje uma aberração em termos de política de desenvolvimento rural. Uma importação mal-adaptada.


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