O final de 2019 revelou as intenções do
Governo de abdicar
da criação de uma taxa sobre as celuloses e de elaborar um projeto de lei para
permitir a ocupação
de propriedade privada sob o pretexto de “arrendamento compulsivo”.
Depois da
decisão em Conselho de Ministro e da necessária autorização legislativa de
2019, na proposta de Orçamento para 2020, o Governo deixa cair a criação da “contribuição
especial para a floresta” a incidir sobre a indústria.
A indústria
florestal em geral e a de celulose em particular tem forte responsabilidade na
atual situação dos espaços florestais em Portugal. As celuloses estão na base
da enorme epidemia de eucaliptos que prolifera pelo país. Uma epidemia de plantações
ao abandono, fonte de propagação de incêndios e de proliferação de pragas e
doenças. A influência sobre as governações para fomento da oferta, enquanto pressionam
os preços da matéria prima em baixa, fruto de mercados a funcionar em
concorrência imperfeita, é gerador da quebra de expectativas na produção e do
subsequente abandono da gestão de parte muito significativa do território. Essa
parte significativa ultrapassa 2/3 da atual área ocupada por eucalipto. Um
barril pronto a explodir. Desta forma, a indústria tem de ser chamada a
corrigir os desequilíbrios que causou no território, bem como nos mercados.
Importa
ainda ter em conta que a indústria florestal tem usufruído, a cada ano, de
muito generosos benefícios fiscais atribuídos pelo Estado. As celuloses assumem
neste domínio um lugar muito privilegiado, aparecendo geralmente em lugar de
destaque, logo após as entidades do sector energético.
Para além
da taxa de resgate do território sob epidemia, a Acréscimo defende ainda o
contributo da indústria para o funcionamento de uma entidade reguladora, face
ao funcionamento dos mercados em concorrência imperfeita. Tal contributo não é
original, já vigorou entre 1972 e 1989. A extinção da entidade reguladora
favoreceu a indústria, mas prejudica o território e as suas populações.
Ao mesmo
tempo que prescinde da intervenção da indústria no resgate ao território
florestal sob abandono, o Governo ameaça a produção com “arrendamento
compulsivo” da propriedade rústica.
A dupla
penalização sobre a produção, por um lado pelos mercados a funcionar em concorrência
imperfeita, com preços impostos unilateralmente pela procura industrial, por
outro com a ameaça de ocupação das propriedades rústicas por este facto
penalizadas, é socialmente inaceitável.
De facto, o
território florestal necessita urgentemente de resgate, sob pena de vivenciarmos
um novo 2017 ou situação similar à que ocorre atualmente na Austrália, mas,
nesse resgate a indústria não pode ficar de fora, nem pode continuar a monopolizar
os mercados. O Governo ao privilegiar a indústria prejudica a produção, mas vitimiza
sobretudo o território e as suas populações.
Pior! Na
sua responsabilidade de validar e autorizar investimentos florestais sem uma análise
financeira, o Governo promove oferta de risco, com o fomento de catástrofes anunciadas.
Certo é que a ausência de avaliação financeira desses licenciamentos favorece a
indústria. O excesso de oferta permite-lhe manter uma estratégia de pagamento
de preços em baixa.
Fica
evidente a cedência do Governo aos “fortes” e a ameaça aos “fracos”. Os riscos
desta cedência potenciam danos colaterais. Tais danos fazem-se sentir, de forma
crescente, sobre o território e as suas populações. A epidemia de eucaliptal
sem gestão ativa constitui um risco potenciador da propagação de incêndios e
proliferação de pragas e doenças. Mais do que observar com enorme preocupação
para os recentes acontecimentos na Austrália, há que ter presente que situação
similar já teve lugar em território nacional e de que estão criadas as
condições para se repetir, até com maior agressividade
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