Portugal é o segundo Estado Membro da União Europeia que registou a maior perda relativa de áreas naturais e seminaturais entre 1992 e 2020, de acordo com dados da OCDE [1].
Nos últimos meses, o país tem assistido a verdadeiros atentados contra as áreas de conservação da natureza, protagonizados pelo Governo, autarquias e até pelo Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas.
Em causa está o aumento da pressão humana em áreas onde o objetivo principal deveria ser o da manutenção dos ecossistemas que nos permitem preservar a biodiversidade, os solos e os recursos hídricos. De facto, as paisagens naturais são transformadas, por exemplo através da instalação de extensos passadiços ou de baloiços, sem a devida avaliação dos impactos ambientais associados. Nos tempos que correm, urge reaproximar a sociedade humana da natureza, mas as estruturas que apoiam a visitação a áreas de conservação da natureza não podem pôr em causa o seu objetivo principal - a proteção da biodiversidade e da integridade ecológica dos seus habitats. Na gestão das áreas naturais, a vertente economicista tem, em certos casos, tendido a assumir prioridade face à vertente ecológica, o que agrava o cenário de perda de áreas naturais, já muito desfavorável para Portugal no contexto europeu e internacional.
Adicionalmente, o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas, com recurso a financiamentos públicos, comunitários e nacionais, tem efetuado brutais operações de corte e trituração de arvoredo, com os argumentos de prevenção de fogos e de controlo de espécies exóticas invasoras. Estas operações utilizam maquinaria pesada em solos sensíveis, incluindo habitats como dunas e zonas húmidas, potenciam as emissões de dióxido de carbono, comprometem os solos e os recursos hídricos, destroem fauna e flora autóctone e acentuam o risco de incêndio. Quanto ao arvoredo autóctone abatido, face à elevada procura de madeira nos mercados, não está claro se a operação resulta na obtenção de receitas para o Estado ou para entidades privadas, situação que urge ser investigada.
O que se tem passado na Mata Nacional do Medos, Reserva Botânica que integra a Paisagem Protegida da Arriba Fóssil da Costa da Caparica [2], às portas de Lisboa, é elucidativo da destruição levada a cabo pelo ICNF. Esta situação está longe de ser isolada, casos semelhantes ocorreram e ocorrem noutras áreas de conservação, como a Reserva Natural das Dunas de São Jacinto [3], a Serra da Lousã [4] [5] ou o Paul do Taipal [6], em Montemor-o-Velho.
Enquanto que as diretrizes da União Europeia apontam para a necessidade de descarbonização e de conservação da natureza, a prática do Governo Português tem caminhado no sentido inverso, com altas emissões de gases poluentes, e projetos de construção que promovem o declínio da biodiversidade autóctone e o aumento de espécies invasoras, para além de acentuarem a degradação dos solos e a capacidade de armazenamento de água.
Contra a destruição do património natural nacional, protagonizado pelo Governo, as organizações signatárias apoiam a ação pública do próximo dia 8 de janeiro, promovida pelo grupo de cidadãos do Movimento em defesa da Mata dos Medos.
Foto de Zito Colaço
As organizações signatárias,
ACRÉSCIMO - Associação de Promoção ao Investimento Florestal
FAPAS - Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade
GEOTA - Grupo de Estudos de Ordenamento do Território e Ambiente
IRIS - Associação nacional de Ambiente
MILVOZ - Associação de Protecção e Conservação da Natureza
QUERCUS - Associação Nacional de Conservação da Natureza
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Referências
[1] OECD (2020), "Land resources: Land cover change in countries and regions", OECD Environment Statistics (database) using data from the European Space Agency CCI-Land Cover project.
[2] Expresso: “Impacto brutal”: associaç~ºoesm ambientalistas denunciam intervenção do Instituto de Conservação da Natureza na Mata dos Medos, em Almada” - 07/12/2021
[3] FAPAS - Associação Portuguesa para a Conservação da Biodiversidade: “Nota sobre a Reserva Natural das Dunas de S. Jacinto, para memória futura” - 08/11/2021
https://drive.google.com/file/d/12UZTtJ0UnEZcDsllANNjo_TfHnqBuSM-/view?usp=sharing
[4] Público: “Cortes rasos de árvores na Serra da Lousã motiva queixa às autoridades” - 10/11/2021
[5] Público: “Associações da Lousã travam cortes de árvores com acção popular” - 17/11/2021
[6] Público: “No Mondego, está em construção um passadiço que passa por um refúgio de aves” – 03/12/2021
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