terça-feira, 20 de novembro de 2018

O “manifesto das celuloses” e a certificação florestal


O “manifesto das celuloses”, publicado na passada semana, dá grande destaque ao negócio da certificação florestal

Um negócio de supostas garantias a serem reconhecidas pelos consumidores, que acabam por ser suportadas pelos contribuintes


A designada certificação florestal é um negócio privado que assenta numa garantia transmitida aos consumidores de que um determinado produto, que incorpora madeira ou cortiça, é proveniente de uma floresta sob uma gestão sustentável. Em Portugal acabam por ser os contribuintes a garantir a subsistência do negócio, num processo de transmissão de responsabilidade do Estado, em matéria de compromissos internacionais de gestão sustentável das florestas nacionais, para as entidades que asseguram o negócio da certificação florestal.

A ACRÉSCIMO tem alertado para a duvidosa credibilidade do negócio, entre outros, por dois motivos:

1.    Não é transparente o processo de monitorização, se existente, da aplicação de resíduos industriais, concretamente os provenientes das fábricas de celulose, em áreas de eucaliptal “certificadas”. Em causa pode estar a Saúde Pública, tendo em conta a elevada probabilidade de infiltração de resíduos nos lençóis freáticos ou a escorrência para as linhas de água. Facilmente se percebe, pelos factos ocorridos no rio Tejo, que esta indústria tem problemas de autocontrolo na preservação de cursos de água. O Instituto Nacional de Investigação Agrária e Veterinária não dispõe de estudos publicados sobre a aplicação destes resíduos em culturas florestais (habitualmente a ocupar encostas de vales). Ficamos assim restritos aos resultados da investigação privada ou a estudos financiados pela indústria de celulose.

2.    Igualmente, não é transparente o processo de certificação pré-corte raso. Ou seja, não existe um período de nojo entre a obtenção de um certificado e o abate de arvoredo, com mais valias no preço decorrentes da certificação. A certificação é atribuída antes de corte no pressuposto de que os seus princípios serão assegurados após a venda do arvoredo. Serão, ou o processo repete-se previamente a novo corte (10-12 anos após)?

Nos dois casos, a situação de falta de transparência interessa à indústria da celulose, destacado cliente da certificação florestal.

Todavia, o pior é o facto de, perante a falta de reconhecimento dos proprietários florestais e dos consumidores em geral por estes sistemas de certificação, os governos terem transferido os encargos deste negócio para os contribuintes, seja os nacionais (via componente do Orçamento do Estado), sejam os europeus (via componente dos fundos europeus de apoio ao Desenvolvimento Rural). Quando um consumidor opta por um produto com certificação florestal acaba por pagar duas vezes pela garantia que lhe asseguram estar a dar.


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