No
último quarto de século, Portugal tem vindo a perder anualmente floresta a um ritmo
médio equivalente à área da cidade de Lisboa (> 10.000 hectares/ano). Em 25
anos, de acordo com estatísticas publicadas pela FAO e confirmadas pelo
Eurostat, o país perdeu mais de um quarto de milhão de hectares de floresta
(> 254.000 hectares). Na sua grande maioria, a área perdida de floresta foi ocupada
por matos. A desflorestação só não é mais expressiva face ao aumento da área de
plantações de eucalipto registada na última década e meia (> 105.000
hectares, entre 1995 e 2010).
A
27 de outubro último, o Governo fez o anúncio da “reforma do sector florestal”.
Mas, será que a anunciada “reforma” tende a produzir efeito sobre a
desflorestação em curso no país?
1. Nas medidas anunciadas na “reforma”,
alias como já era evidente no Programa do Governo, não se vislumbra ações sobre
os mercados e sobre o rendimento silvícola. Reconhecidamente, os mercados
funcionam em concorrência imperfeita, dominados por oligopólios. O rendimento
silvícola tem acompanhado o declínio da área florestal nacional.
Como contraponto à ausência de medidas
diretas sobre os mercados e, consequentemente, sobre o rendimento silvícola,
surgem medidas governamentais de natureza fiscal, anúncios de apoios
financeiros públicos (PDR2020 e Fundo Florestal Permanente) e o apelo à
certificação florestal. Mas, serão tais medidas substitutas das ausências na “reforma”?
Os incentivos fiscais, a par do ocorrido
no passado não surtem efeito de relevo sobre a desejada gestão florestal ativa,
desejavelmente sustentável. A expressão do IMI, do IMT e do Imposto de Selo
proveniente das florestas é residual.
No que respeita aos apoios públicos,
importa ter em conta o histórico registado com o PEDAP, o PAMAF, o AGRO e o
PRODER. Ou seja, apesar do forte apoio público, de todos nós afinal, a desflorestação
tem seguido o seu curso. Os riscos têm aumento e persistido com peso
significativo, seja no que respeita aos incêndios (agentes abióticos), seja no
que concerne à proliferação de pragas e de doenças (agentes bióticos). Apesar
do investimento público nas florestas, os impactos destes agentes na economia,
mas também no ambiente e no plano social têm sido catastróficos. Tendo em conta
este histórico, não é difícil concluir que, apesar de importantes, os apoios públicos
(com impacto no início e a meio do ciclo produtivo florestal) não substituem a
falta de rendimento silvícola (no final desse ciclo).
A certificação florestal é um
instrumento de mercado, que tem vindo a ser promovida pelos últimos governos
para responder a uma necessidade da indústria. Esta aporta custos iniciais avultados,
que a grande maioria dos produtores florestais não tem condições para suportar.
Este facto levou à criação de apoios públicos para que estes custos sejam transferidos
para os contribuintes. A opção pela certificação florestal estará sempre
condicionada pelo rendimento silvícola, nunca será medida compensatória de um
desequilibrado funcionamento dos mercados.
2. Com a contração da área florestal
nacional, pela desflorestação em curso no país, tende a aumentar a
sobre-exploração dos recursos florestais. A existência de uma situação de
sobre-exploração destes recursos foi diagnosticada em meados da década de 90 do
século passado, num estudo que envolveu uma das principais consultoras
internacionais na área florestal. Todavia, desde essa época, tem aumentado significativamente
a capacidade industrial instalada no país. O licenciamento para a transformação
de recursos florestais, apesar da desflorestação, não teve limites, nem a atual
“reforma” prevê medidas neste domínio.
Para além do aumento da capacidade
industrial instalada na produção papeleira, suportada ultimamente pelo perigoso
crescimento de uma oferta de risco (70% da área ardida em 2016 em povoamentos
florestais ocorreu em plantações com eucalipto), foram surgindo múltiplas unidades
fabris associadas à utilização de recursos florestais para energia. Estas últimas
estão muito associadas à “oportunidade” criada pelo declínio do pinhal, fruto
de uma incontrolada proliferação de pragas e doenças, com destaque para o nemátodo
da madeira de pinho.
Desta forma, a “reforma do sector florestal” apresentada pelo Governo em
outubro último carece de medidas credíveis para o combate à desflorestação. Em
causa estão os ecossistemas florestais, a atividade económica e as exportações de base florestal, o combate ao avanço da desertificação e a luta contra as alterações climáticas.
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