A 14 de julho, o Jornal de Negócios publica uma notícia com o
título “Floresta
volta aos anos 80 e cria mais riqueza”. O tratamento que na notícia é feita
aos dados estatísticos, uns indicando as fontes, outros não, suscitam à Acréscimo
comentários pouco abonatórios.
Comecemos pelo final, talvez pelo dado mais surpreendente, o relativo
à área de floresta em Portugal.
Se bem que sem citar fontes, a notícia menciona que a floresta em
Portugal ocupa 2.986 mil hectares.
Este valor é menor do que o apontado pela FAO e pelo Eurostat, tendo por base
os resultados apurados pelo Inventário Florestal Nacional. O valor avançado
pelo Jornal de Negócios, sem fonte identificada, reduz em 196 mil hectares o valor oficial estimado em 2015 para a área ocupada
por floresta em Portugal. Sendo assim, a desflorestação ocorrida em Portugal,
desde 1990, não será de 254 mil hectares (de 3.436 mil hectares para 3.182 mil
hectares), apontados pelas autoridades nacionais (ICNF) e instâncias
internacionais (FAO e Eurostat), mas de 450
mil hectares (para os agora mencionados 2.986 mil hectares). Não existem muitas
opções não oficiais de tratamento de dados estatísticos sobre florestas em
Portugal. Será que a fonte do jornal estará ligada à indústria papeleira?
Ainda sobre o mesmo paragrafo da notícia, importa ter em conta
que, a área de eucalipto em Portugal aumentou, entre 1995 e 2010, quase 95 mil hectares (Fonte: IFN6. ICNF,
2013), de cerca de 717 mil para muito próximo dos 812 mil hectares (embora aqui
existam dúvidas sobre os valores oficiais, por defeito, tendo por base outros
relatórios da FAO). O que entende o jornal por “não aumentaram muito”? Sob que ponto de vista? O da indústria
papeleira? A produtividade média por hectare estagnou, contudo, abaixo dos 6
metros cúbicos hectare ano, ou seja, o aumento tem sido de oferta de risco (em
quantidade, não em qualidade).
Sobre o aumento da riqueza, num país essencialmente de floresta
privada, convirá analisar, com maior detalhe a evolução do rendimento
empresarial líquido da silvicultura (REL), também disponibilizado pelo INE nas
Contas Económicas da Silvicultura (embora com um desfasamento de 2 anos sobre o
momento presente), onde em 2013 se estava muito longe dos valores registados em
2000, e em 2014 voltou a decrescer.
A evolução dos preços e dos consumos intermédios associados às
principais matérias primas de base florestal deverá também suscitar analise
mais detalhada. O ICNF dá uma ajuda:
(Fonte:
GPP a partir do INE. ICNF, 2013)
Efetivamente,
no período de análise escolhido pelo jornal, de 2008 a 2014 (na Acréscimo
preferimos analises em períodos mais longos, de 25-30 anos, menos manipuláveis),
em 2009 foi atingido o pico mínimo e em 2013 o máximo desse período no que
respeita ao REL. O que merece curiosidade, do ponto de vista dos interesses
associados à indústria papeleira, é que, apesar da “liberalização” da cultura
do eucalipto, com efeitos práticos desde outubro de 2013, em 2014, o REL voltou
a contrair (assim como o VAB a preços constantes). Importa ter em conta que o
REL contabiliza também os valores associados a produção dos viveiros, no qual a
indústria papeleira tem um peso significativo. Atendendo a que, segundo números
do Regime Jurídico das Ações de Arborização e Rearborização (RJAAR), o
eucalipto foi a espécie mais plantada em Portugal nesse ano, estranha-se a
contração registada no REL. Quanto a 2015 e 2016, veremos as futuras Contas do
INE, a publicar respetivamente em 2017 e em 2018.
Sobre
o Valor Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura no VAB nacional, este representava
1,2% em 1990, estando em 0,6% (metade) em 2014. Aumento da riqueza? Quanto ao
emprego no sector, o decréscimo em postos de trabalho, desde essa altura,
ultrapassa os 160 mil. O peso do sector no PIB contraiu 40% (apesar de tudo, na
floresta, a queda foi significativamente menor do que o registado na indústria).
Talvez o título e o tratamento dos dados
não devessem surpreender, afinal de contas existem interesses silvo-industriais
talvez demasiadamente próximos.
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