A propósito da inauguração do viveiro florestal do grupo Portucel
Soporcel em Moçambique, na passada semana, terão sido tecidos vários
comentários que geram grandes preocupações.
Desde
já se espera que neste investimento do grupo em Moçambique tenham sido criadas
oportunidades a fornecedores nacionais, estimulando a transferência de
tecnologia nacional e fomentando o emprego mais qualificado em Portugal. Esta
oportunidade corresponde aliás à contrapartida esperada face aos benefícios
fiscais de que o grupo goza por parte do Estado Português.
Pelos
montantes financeiros anunciados, a aposta em Moçambique parece corresponder à
concretização de um investimento antes falhado no Brasil. Ao que tudo indica
por incapacidade em usufruir de terra para o cultivo de eucalipto neste último
país. Em todo o caso, independentemente do local, a concretização do
investimento pode aportar bons resultados aos acionistas, esperemos que com
retorno para Portugal.
Todavia,
subjacente à inauguração e segundo a Imprensa, o presidente do grupo terá
tecido comentários que geram grande preocupação.
Por um
lado, não se entende se o investimento em curso em Moçambique é alternativo ou
complementar ao investimento que o grupo anunciou para Portugal em maio de
2012. Pelos produtos a fabricar, apenas pasta de celulose, e pelos mercados a
que se destinam, sobretudo na Ásia, parece complementar. A ser assim não se
justificam as desprestigiantes lamúrias pela opção por aquele país face a
Portugal.
Por
outro lado, o responsável parece apontar para a necessidade de maior área de
eucaliptal em Portugal para um maior investimento do grupo no nosso país.
Estranha-se esta afirmação, já que a indústria de celulose em Portugal se
desfez, nos últimos anos, de mais de 30 mil hectares só de eucaliptal.
Reforça-se, não está em causa a transferência de áreas de menor para outras de
maior produtividade. Os dados anunciados pela associação deste sector apontam
para um efetivo desinvestimento na floresta portuguesa. Quer-se mais em
discurso, mais opta-se por menos nos factos.
A
estranheza adensa-se já que, de acordo com o senso comum, a gestão florestal
por parte destas empresas é melhor e gera menos riscos à Sociedade do que a
gestão que é possível concretizar por parte dos seus fornecedores privados,
essencialmente famílias e empresas familiares, limitados estes últimos pela
imposição dos preços de aquisição de rolaria de eucalipto por parte das celuloses.
Salienta-se que esta definição unilateral dos preços pela indústria é protegida
pela governação do país.
Mais.
Por pressão do grupo, o governo alterou em 2013 a legislação que impunha
algumas restrições legais ao desenvolvimento da cultura do eucalipto em
Portugal. Fê-lo partindo de uma proposta do próprio grupo. Não se entende pois de
que se queixa este responsável já que o eucalipto assume hoje o lugar cimeiro,
em área ocupada, no conjunto das espécies florestais em Portugal, atingindo
próximo de um milhão de hectares. Aliás, Portugal ocupava, em 2006, o quinto
lugar a nível mundial com área destinada a eucaliptos (porventura, com a
redução de área em Espanha e aumento em Portugal, poderá ocupar agora o quarto
lugar). Afinal de contas, tudo aponta para que o aumento da capacidade do
“armazém” para usufruto da empresa tem progredido a seu favor no nosso país.
Mas o
que mais preocupa é o facto destas afirmações de lamúria precederem
historicamente a apresentação de cadernos reivindicativos por parte do grupo à
governação.
Foi
assim aquando do governo do primeiro-ministro José Sócrates para a criação de
favores à instalação da fábrica de papel em Setúbal, como se este não fosse o
local, no mundo, mais favorável à empresa para este tipo de investimento.
Consta ainda no programa eleitoral do Partido Socialista de 2011 a eventual
afetação de áreas de regadio, suportadas por todos nós para a produção
agroalimentar, à cultura do eucalipto.
Foi
assim, mais recentemente, no governo do primeiro-ministro Passos Coelho, para a
alteração da legislação mais restritiva a esta cultura, com o objetivo de, pelo
aumento desordenado da oferta, perpetuar o condicionamento de preços à
produção. Uma “excelente” prestação da ministra da Lavoura. Importa ter
presente que, esta estratégia não condiciona apenas o rendimento aos
proprietários florestais, gera em consequência uma gestão florestal de
abandono, com destaque para as áreas de minifúndio, as que apresentam maior
risco de catástrofe económica, social e ambiental. Ora, este facto já nos diz
respeito a todos nós, pagamos caro as consequências.
A Acréscimo condena a prossecução de uma estratégia de Calimero
por parte do responsável do grupo Portucel Soporcel. Gostaria ainda que fosse
do conhecimento público a situação respeitante às contrapartidas à alteração da
legislação que afeta a cultura do eucalipto em Portugal, operadas sob a égide
da ministra Assunção Cristas, designadamente sobre os 15 mil postos de trabalho
que iriam ser criados. Ao contrário do senso comum, a Acréscimo tem ainda
levantado questões sobre a qualidade da gestão florestal do grupo, aguardando a
disponibilidade deste para a realização de visitas especializadas conjuntas.
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