Comemoraram-se na passada semana os 40
anos da restauração da Democracia em Portugal. Passaram igualmente 28 anos
desde a adesão do País à Comunidade Económica Europeia.
O período de tempo decorrido tem servido
à realização de diagnósticos nos mais variados domínios. Esta é também uma
oportunidade para uma análise aos impactos do tempo e das decisões tomadas ao
nível das florestas e do setor florestal nacional.
No período de tempo decorrido, mais
precisamente após a adesão de Portugal à CEE, apesar dos apoios da Política
Agrícola Comum (PAC) às florestas portuguesas, pela alocução de milhares de
milhões de euros de fundos públicos, não é possível vislumbrar uma redução dos
riscos de degradação das florestas, um reforço da economia florestal, um
crescimento do emprego no setor, a valorização do território ou resultados
positivos no combate ao despovoamento e à desertificação, muito pelo contrário.
De acordo com os dados disponíveis, quer os respeitantes às estatísticas dos incêndios florestais, quer à proliferação de pragas e de doenças, não se pode concluir por resultados positivos ao nível da diminuição dos riscos de investimento nas florestas. A incapacidade em controlar a sua evolução tem sido evidente ao longo dos anos.
No que respeita à
evolução da área florestal portuguesa, ao contrário do que aconteceu na União
Europeia onde a taxa de arborização tem aumentado ao longo das últimas décadas,
Portugal registou uma significativa diminuição na sua área florestal. De acordo
com os dados do Inventário Florestal Nacional, entre 1995 e 2010 a floresta
portuguesa viu contrair a sua área em mais de 150 mil hectares.
Já no que respeita à
evolução da economia florestal (o conjunto da produção, do comércio de bens
silvícolas e dos serviços à produção), a avaliar pelo peso do Valor
Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura sobre o VAB nacional, este viu
regredir o seu valor em cerca de 67% só nas últimas duas décadas. De um peso de
1,2% registado em 1990 contraiu para 0,4% em 2010.
Todavia, o peso do
emprego no setor florestal registou o decréscimo mais significativo. Em 1995
foram contabilizados cerca de 259 mil postos de trabalho, em 2010 não chegavam
aos 100 mil. Obviamente, tal registo decorre de opções de política florestal e
industrial, opções essas que persistem ativas nos dias de hoje.
Reforça-se que, estas
evoluções ocorreram perante a disponibilização ao País de centenas de milhões
de euros de fundos públicos, provenientes em parte significativa da União
Europeia, ou seja, dos impostos pagos pelos contribuintes europeus (onde se
incluem os portugueses), supostamente para reduzir os riscos do investimento
florestal, reforçar a economia florestal (e assim, a economia rural), promover
o crescimento ou a manutenção do emprego, em particular em meios rurais,
valorizar o território, combater o despovoamento e a desertificação.
Não havendo registos
positivos nestes domínios, quais os proveitos com a despesa pública realizada?
E o futuro?
A oportunidade de futuros apoios
públicos da PAC às florestas, agora através do Programa de Desenvolvimento
Rural 2014/2020 (PDR 2020), pode aportar um de dois resultados:
1. A persistência no histórico dos últimos
28 anos; ou,
2. Um corte radical com os modelos
anteriormente definidos para a atribuição dos apoios.
A Acréscimo envereda determinadamente
pela opção que garanta o retorno económico, ambiental e social ao investimento
dos contribuintes nas florestas em Portugal.
Neste contexto, a associação elaborou uma
Proposta de Enquadramento e Revitalização (PER) do investimento
florestal em Portugal, apresentada já sinteticamente no Parlamento, junto da
Comissão de Agricultura e Mar.
Para o enquadramento, parte-se de uma
situação única a nível mundial: a posse das superfícies florestais assume
em Portugal a caraterística de estar esmagadoramente sob o regime privado
(98%). As propriedades com superfícies florestais e silvestres pertencem
essencialmente a famílias e a comunidades rurais (>90%). As pessoas, não as
espécies arbóreas, têm de ser os agentes ativos na mudança, seja a nível
individual, seja enquanto integrantes de estruturas representativas.
Os apoios públicos às florestas, como
noutros domínios das atividades rurais, têm de estar centradas numa estratégia
de desenvolvimento e valorização do mundo rural. Essa estratégia deve não só
suster a sistémica perda de população, mas terá de garantir os meios para
fomento das migrações litoral-interior, sobretudo dos estratos populacionais
mais jovens e mais qualificados.
A presença constante e ativa das
pessoas junto das suas áreas florestas é fundamental para o sucesso dos
investimentos que em tais áreas venham a ser concretizados, quer enquanto
gestores diretos ou através da delegação dessas funções nos seus representantes.
Todavia, não basta assegurar a presença
das pessoas nos meios rurais, é fundamental garantir condições condignas para o
seu sustento, ou seja, entre outros, proporcionando que estas possam
desenvolver negócios sustentados economicamente, sustentáveis ambientalmente e
socialmente responsáveis.
Temos assim dois fatores essenciais de
enquadramento: pessoas e negócios.
Na PER, a Acréscimo sustenta que
os apoios às florestas portuguesas de devem centrar em três pilares básicos:
Pesquisa, Extensão e Regulação.
- Pesquisa:
Ao nível da pesquisa deverá ser dado
especial enfoque à investigação
aplicada, a que permita
responder a questões práticas, nomeadamente criar modelos de silvicultura e de
gestão que permitam rentabilizar as produções florestais e minimizar os riscos,
em particular os relativos aos incêndios florestais, mas também em relação às
pragas e às doenças.
Preponderante deve ainda ser toda a investigação
que se desenvolva com vista á quantificação e à qualificação de bens e
serviços ainda sem valor de mercado (designadas por externalidades).
Hoje em dia, dificilmente a economia florestal se sustenta apenas na produção
dos tradicionais bens, como a madeira ou a cortiça. Estas produções têm cada
vez mais de ser complementados com a produção de outros bens e com a prestação
de serviços, nomeadamente dos serviços ambientais. Tais bens e serviços terão assim
de ter cotação nos mercados. As ações de investigação neste domínio serão
fundamentais para a rotura com uma lógica de subsidiodependência
e a sua substituição para uma coerente política de pagamento de serviços
ambientais e sociais.
- Extensão:
A extensão florestal, mais do que a
divulgação ou a assistência técnica à produção, tem subjacente uma linha
de comunicação entre a produção do conhecimento e a concretização de negócios
nas florestas. O PDR 2020 deve ter aqui o seu campo de ação principal
no que aos apoios às florestas respeita.
Mais, este serviço de extensão
deve ser centrado nas organizações de agricultores e produtores florestais,
sob supervisão da autoridade florestal nacional. Associado diretamente a este
serviço de extensão florestal estarão necessariamente as Autarquias e as
empresas florestais, seja ao nível dos serviços, seja as da indústria.
Na perspetiva do PER, no que aos apoios
do PDR 2020 respeita, a Acréscimo defende, como condição necessária para a
atribuição de financiamento público a um investidor, a obrigatoriedade da
sua filiação numa organização de produção florestal. Esta última,
através de contratos-programa com o Estado, deverá ser o garante do
retorno económico para a Sociedade do esforço desta para com as florestas.
Igualmente, o PDR 2020 deverá dar destaque
a investimentos da indústria de base florestal no reforço da sua taxa de
autoabastecimento, por exemplo através de contratos específicos com as
famílias e comunidades detentoras de superfícies florestais, diretamente ou
através das zonas de intervenção florestal (quando estas forem dotadas de
personalidade jurídica, que hoje não têm).
Aspeto preponderante para uma boa
concretização dos investimentos, sobretudo atendendo às características
específicas dos florestais, é a intervenção de agentes devidamente
qualificados, a comprovar no âmbito de sistemas de certificação ou pela
criação de alvarás.
- Regulação:
Pilar determinante para o sucesso, até face ao diagnóstico das últimas
décadas, é a criação de uma entidade reguladora dos mercados de bens e de
serviços de base florestal, dando inclusive concretização ao, a este
respeito, definido no guião “Um Estado Melhor”, aprovado em Conselho de
Ministros, a 30 de outubro de 2013.
Os apoios públicos que sejam atribuídos
ao investimento florestal versam apenas sobre uma fase concreta do ciclo de
produção florestal. Já as condições de acesso aos mercados e as relações que os
caraterizam têm incidência sobre todo este ciclo. Ou seja, os apoios públicos
continuarão a ser ineficientes se continuarem a ser permitidas posições
dominantes baseadas em relações loose-win no seio dos mercados de
produtos florestais.
No País do Mundo em que 98% das
superfícies florestais são detidas por agentes privados, a ausência de
condições para a existência de negócios sustentados, sustentáveis e socialmente
responsáveis, implicará na persistência de uma estratégia de destruição do património
florestal nacional. Sem perspetivas de rentabilidade nos negócios nas
florestas, não serão criadas as condições para uma gestão florestal ativa
(despesa), logo para o controlo dos riscos que as ameaçam, estes suportados
pelos detentores dessas áreas, mas também e de forma significativa por toda a
Sociedade Portuguesa.
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