Os fogos em espaços rurais em Portugal são em parte Inevitáveis,
tal como acontece em países vizinhos do sul da Europa. Efetivamente, no caso
português, estimam-se que 5% das ocorrências decorram de causas naturais, designadamente
no decurso de descargas elétricas (raios) provocadas por trovoadas.
A par das causas naturais,95% das ignições decorrem de causas associadas
à ação humana, seja através do uso do fogo (p.e., queimadas, lançamento de
foguetes ou de cigarros), de acidentes (p.e., junto à rede ferroviária), de
causas estruturais (p.e., conflitos e atividades de defesa contra incêndios) e
do incendiarismo.
Após uma ocorrência, independentemente da causa, a subsequente propagação
do fogo tem uma forte componente silvícola, dependente que está das práticas de
gestão dos povoamentos e do ordenamento dos espaços florestais. É neste domínio
que tem especial destaque a rentabilidade expectável nestes espaços, conhecido
que, na sua ausência não são executadas práticas de gestão (i.e., a aplicação
de métodos comerciais e de princípios técnicos na administração de uma propriedade),
elevando assim substancialmente o risco de mais fácil propagação do incêndio.
Em Portugal, a redução do risco de incêndio rural é matéria
complexa:
- Nas ignições especialmente por motivos sócio-culturais; e,
- Na propagação pela evolução demográfica, pela estrutura da propriedade rústica, pela inoperacionalidade do Estado e pela ausência de razoáveis expectativas de rentabilidade em parte significativa dos solos (coincidente com as áreas de maior impacto dos incêndios).
A estratégia política para atenuar os impactos dos incêndios tem
sido errática e mal enquadrada. É evidente uma maior aposta no combate do que
em prevenção, com acréscimo de custos para o Estado, não só no plano
orçamental, mas igualmente nos decorrentes dos impactos económicos (800 a 1000
M€/ano), sociais e ambientais (emissão de 2,4 Mton/ano de CO2 eq.). Em
ambos os casos é notório o desenquadramento das medidas face à realidade rural
portuguesa, do acentuado êxodo e envelhecimento da população rural, da dimensão
e dispersão da propriedade rústica, da queda acentuada da economia rural, com
destaque aqui para o valor económico das florestas, das práticas de concorrência
imperfeita em várias fileiras silvo-industriais, da inexistência de apoio técnico
e de instrumentos de transmissão do conhecimento.
Portugal registou uma acentuada perda e envelhecimento da população
em determinadas áreas do território rural. Tais áreas coincidem com os registos
de maiores áreas ardidas por ignição (os distritos do litoral norte, com maior
densidade populacional, registam os maiores números de ocorrências e as menores
áreas ardidas por ocorrência, já a região interior evidencia exatamente o
oposto).
Fig. 1 - Posse das áreas florestais (fonte: FAO)
O País regista a maior percentagem, a nível mundial, de área
florestal no regime de propriedade privada. Assim, cerca de 97% da área
florestal nacional é pertença de centenas de milhares de famílias, de
comunidades rural e também de empresas, com destaque para o setor da pasta e do
papel. As propriedades são caracterizadas por baixas áreas médias e pela sua
dispersão. As regiões de minifúndio registam os maiores riscos de incêndio
(regiões do Centro e do Norte).
Fig. 2 - Número e dimensão das propriedades rústicas (fonte: DGCI)
Fig. 3 - Área ardida 1975 - 2008 (fonte: ICNF)
A par da evolução demográfica e da estrutura da propriedade, que
se interrelacionam, associam-se aa baixas expectativas de rentabilidade dos
solos nos espaços florestais e silvestres. A atividade silvícola, de acordo com
dados do INE, registou um declínio progressivo. Entre 1990 e 2010, o peso do Valor
Acrescentado Bruto (VAB) da silvicultura no VAB nacional recuou 67%. Em 1990 este
indicador representava 1,2%, tendo decrescido em 2000 para 0,8% e atingindo em
2010 o valor de 0,4%. O peso do setor florestal no PIB (floresta e indústria
florestal) registou, entre 2000 e 2010, uma queda de 40%, ou seja, de 3,0% em
2000 para 1,8% em 2010.
Fig. 4 - Peso do VAB silvicultura no VAB nacional (fonte INE, CES 2010)
Por último, urge concluir o cadastro rústico, efetivar tamb+em na
silvicultura o acompanhamento dos mercados de protuso florestais, dominados que
estão por oligopólios, criar um serviço de Extensão Florestal que permita o
acompanhamento técnico e a transmissão dos resultados da Investigação aos
proprietários florestais. A dissociação da posse e da gestão, pela criação de
sistemas de gestão florestal em grupo e a organização técnica e comercial da
produção são elementos fundamentais
Desta forma, é necessário um novo paradigma para atenuar as
consequências dos incêndios em Portugal, assente em estratégias de
desenvolvimento rural, na fixação das populações em meio rural e na geração
sustentada de riqueza com impacto direto em meio rural (contrariando atuais práticas
extrativistas).
Não chega só a limpeza ocasional de matos por desempregados, ou os
anúncios de responsabilização coerciva dos proprietários, isto na ausência de
cadastro em parte significativa do País e na inexistência quase generalizado de
acompanhamento técnico. Não chegam os aviões, os helicópteros ou os carros-tanque
(mais buldozers ajudariam). Será mesmo necessária uma estratégia
integrada, que para além dos Serviços Florestais, da Proteção Civil e dos Bombeiros,
das Forças Policiais e das Autarquias, envolva as populações rurais, os
proprietários agroflorestais e suas organizações, equipas multidisciplinares de
investigadores e técnicos, seguradoras e mais ainda os sapadores florestais (bombeiros).
Estratégia essa preferencialmente assente na geração de negócios florestais inseridos
nos princípios da Economia Verde (produção de bens e prestação de serviços),
libertando os contribuintes para esforços direcionados a conservação de ecossistemas
em risco e para investimentos de longo prazo com espécies autóctones.
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