quinta-feira, 11 de agosto de 2022

Instalar eucaliptos em áreas de matos irá aumentar passivo ambiental para a sociedade

É mais barato arborizar do que intervir em áreas abandonadas e mal geridas 


Na sequência da recente tomada de posição conjunta por parte da associação que representa as empresas de celulose (CELPA) e de uma organização representativa de associações de produtores de eucalipto, na qual se defende a eucaliptização de áreas de matos como meio de aumentar a resiliência do território aos incêndios florestais, a ACRÉSCIMO e a ZERO vêm manifestar o total repúdio por esta tentativa de criar pressão sobre o Governo para voltar a desregulamentar as arborizações com eucalipto, quando o que verdadeiramente está em causa é a existência de um passivo ambiental que a indústria não tem qualquer intenção de solucionar mas sim de acentuar.

Importa referir que as áreas de eucaliptal mal gerido e abandonado representam cerca de 2/3 da área total de eucalipto em Portugal, ou seja, 560 mil hectares de um total de ocupação oficial de 845 mil hectares – mas que rondará já, muito provavelmente, cerca de 1 milhão de hectares, com esta espécie exótica a dominar a paisagem florestal a norte do rio Tejo (dados de 2015 do 6.º Inventário Florestal Nacional ).

Mas será que é esse aumento de resiliência do território aos incêndios florestais que está verdadeiramente em causa com a proposta de aligeirar as restrições à instalação de novos eucaliptais? Na verdade, o que está em causa é um aspeto pecuniário, ou seja, é mais barato plantar em áreas de matos do que replantar atuais áreas de eucaliptal abandonado ou mal gerido, sendo que a diferença de custos ronda valores por hectare 50% superiores nas replantações.

De salientar que não é possível arborizar com eucaliptos (ação de instalar árvores de espécies florestais, por sementeira ou plantação em terrenos que não tenham sido ocupados por floresta nos últimos 10 anos), mas é possível rearborizar (ação de reinstalar árvores de espécies florestais, por sementeira ou plantação, em terrenos que já tenham sido ocupados por floresta, nos últimos 10 anos), prevendo-se que, no caso de arborização exista uma compensação com a recuperação de áreas onde o eucalipto tem menor produtividade. O problema é que a indústria parece não querer internalizar os custos económicos e ambientais, situação que se comprova com o facto de existiram disponíveis 45 áreas de compensação, representado estas apenas 4 167 hectares, o que cria uma pressão indesejável sobre as entidades públicas para a atribuição de um significativo volume de fundos públicos para reabilitar o enorme passivo existente.

Acresce que a narrativa está completamente enviesada, uma vez que na análise de tendência do envolvimento das áreas de matos e das áreas de eucaliptal na área total ardida, conforme os registos de 1996 a 2021, a presença das áreas de matos tem vindo a decrescer e o envolvimento das áreas de eucaliptal na área ardida total apresenta uma tendência crescente.

Assim, a eucaliptização das áreas de matos, aliada à manutenção das atuais áreas de eucalipto mail geridas ou abandonadas, não só não aumentará a resiliência dos territórios aos incêndios florestais, como agravará o passivo ambiental e os impactes associados às alterações climáticas.

Por estes motivos, a ACRESCIMO e a ZERO repudiam a pressão exercida pela associação das celuloses sobre a ação governativa, baseada apenas em interesses financeiros insustentáveis, que colocam em causa a economia, o bem-estar das populações, rurais e urbanas, e o património ambiental do país.


Em conclusão:

A ACRÉSCIMO e a ZERO recusam qualquer tentativa promova a expansão da área de plantações de eucalipto em Portugal, sendo importante relembrar que  país já possui a maior área relativa com estas plantações a nível mundial, sendo detentor da maior área absoluta a nível europeu e a quinta a nível global, mas apresenta a produtividade média unitária mais deplorável e a maior área relativa de risco de incêndio e de propagação de pragas e de doenças.

A ZERO e a ACRÉSCIMO exigem ao Governo que assuma os compromissos de redução de área destas plantações em Portugal, bem como da meta, estabelecida na Estratégia Nacional para as Florestas, para atingir uma produtividade média unitária não inferior a 10 metros cúbicos por hectare e ano. Ambas estão associadas a ações de replantação, mas, sobretudo, de reconversão de grande parte de eucaliptal abandonado para outras ocupações dos solos, nomeadamente para ações de restauro dos ecossistemas, na aposta em sistemas agroflorestais e em espécies arbóreas autóctones de maior valor ecológico e económico.


quinta-feira, 4 de agosto de 2022

Quercus e Acréscimo denunciam ilegalidade em projeto promovido pelas celuloses em Pedrógão Grande



A QUERCUS e a ACRÉSCIMO têm visitado regularmente a região de Pedrógão Grande, no distrito de Leiria, na sequência do grande incêndio de 2017. Neste território é patente a inexistência de ações públicas para o prometido reordenamento da floresta, nomeadamente com espécies autóctones, que a tornem mais resiliente aos incêndios.

 

A omissão do Estado gerou a oportunidade para a intervenção das celuloses.

 

No início de junho, a associação da indústria papeleira (CELPA) anunciou, através de um vídeo, estar a promover o projeto demonstrativo “ReNascer Pedrógão”. Apresenta-o como uma “iniciativa emblemática no país”, de “gestão florestal exemplar”, baseado num processo “rigoroso” e com “apoio técnico continuado”. Um “projeto que tem por objetivo a certificação florestal”, que pretende “contribuir para a reposição dos serviços do ecossistema”.

 

Todavia, a realidade difere do anunciado.

 

Num projeto de (re)arborização, identificado com o código P_ARB_047406, visitado no início de julho de 2022,  a QUERCUS e a ACRÈSCIMO depararam-se com uma situação de evidente ilegalidade, reflexo de um projeto que foi adulterado na sua execução:

 

·  Na parcela aprovada pelo ICNF, em setembro de 2020, para a instalação de medronheiro, foi confirmada a presença de uma plantação de eucalipto.

 

Neste e em núcleos adjacentes, a QUERCUS e a ACRÉSCIMO constataram que, na anunciada intervenção na construção e beneficiação de caminhos e aceiros, tendo em vista uma “maior resiliência aos incêndios”, os eucaliptos só não se visualizam nas faixas de rodagem. Foram plantados até aos limites de caminhos e aceiros.

 

A QUERCUS e a ACRÉSCIMO denunciam ainda os fortes impactos decorrentes da extrema mobilização dos solos. A mobilização em causa, com a construção de terraços em plena margem direita do rio Zêzere, gerou um enorme volume de carbono emitido para a atmosfera, bem como produz um significativo acréscimo do risco de erosão. Esta injustificável mobilização do solo ocorreu em plena Reserva Ecológica Nacional (REN) e no enquadramento do Plano de Ordenamento das Albufeiras de Cabril, Bouçã e Santa Luzia (POAC).

 

A QUERCUS e a ACRÉSCIMO reforçam que esta insistência no eucalipto revela falta de visão estratégica e compromete o futuro do território pela maior vulnerabilidade aos incêndios e pela perda de serviços dos ecossistemas. A aposta em espécies mais resilientes ao fogo, como é o caso do medronheiro e a de muitas outras plantas da nossa floresta nativa é essencial para uma resposta estrutural aos problemas que enfrentamos.

 

Em conclusão:

 

A QUERCUS e a ACRÉSCIMO, pela ilegalidade que denunciam, têm sérias dúvidas quanto aos projetos que as celuloses elaboram ou promovem e o que é efetivamente instalado no terreno. Desafiam assim a CELPA a comprovar a inexistência de mais ilegalidades noutros projetos da sua responsabilidade ou por si promovidos, bem como pelas suas associadas.

 

Mais, denunciam a incapacidade do Estado, nomeadamente do ICNF, na fiscalização das ações de arborização e rearborização que autoriza. Essa incapacidade converte-se num prémio à especulação e à infração, com a consequente expansão da área de eucalipto.

 

Por último, a QUERCUS e a ACRÉSCIMO exigem ao ICNF que acione os mecanismos previsto em lei para a reposição da legalidade na parcela prevista para a instalação de medronheiro, a par de outras em que sejam identificadas situações de adulteração de projeto. Exigem ainda que o Instituto comprove a situação de rearborização com eucalipto na área global de intervenção do projeto demonstrativo. Importa ter presente que, em 2017, a Lei proíbe a arborização com espécies do género Eucalyptus sp.