segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Porque somos contra os apoios financeiros públicos à certificação florestal?

O Estado Português definiu medidas de apoio financeiro público a investimentos imateriais no âmbito de processos de certificação florestal (via PDR 2020),

A certificação florestal é um instrumento de mercado que assenta no pressuposto de que os consumidores reconhecem e valorizam, pelo acréscimo de preço, produtos de base florestal, seja uma resma de papel, um móvel da sala ou uma rolha da garrafa de vinho, entre outros, sobre os quais, entidades e sistemas de certificação, lhes dão garantias de serem provenientes, na sua totalidade ou em parte, de áreas submetidas a uma gestão florestal sustentável.

Em Portugal, existem dois sistemas internacionais de certificação florestal a operar:
·         O Forest Stewardship Council (FSC), representado pela Associação para uma Gestão Florestal Responsável (AGFR); e,
·         O Programme for the Endorsement of Forest Certification (PEFC), representado pela associação Conselho da Fileira Florestal Portuguesa (CFFP).

Porque somos contra o apoio financeiro público à certificação florestal?

A.   Por duplo tributo. Sendo um instrumento de mercado, suportado em acréscimo de preço pelos consumidores face a contrapartidas por estes reconhecidas, não faz sentido que os mesmos suportem duplamente esse reconhecimento, desta feita como contribuintes. Este duplo tributo desvirtua o compromisso entre a cadeia florestal e o consumidor, a menos que o produto, cujo sistema e entidades de certificação sejam objeto de apoio financeiro público, surja no mercado a preço idêntico a um concorrente não certificado.
B.   Por financiamento indireto à indústria. Sendo o sistema de certificação florestal suportado financeiramente pelo consumidor final, um apoio financeiro público surge como um indicador de que a mais valia reconhecida ao produto certificado, pelo acréscimo de custo, não é distribuída ao longo da sua cadeia produtiva de forma justa, concretamente face aos custos e riscos assumidos pelas partes intervenientes. Ora, os contribuintes não devem ser chamados a suportar desequilíbrios entre os agentes económicos das fileiras florestais, esse papel compete às autoridades, através do acompanhamento dos mercados. A manter-se este apoio financeiro público ele é um claro financiamento indireto à indústria florestal, a partir de um instrumento financeiro de apoio à produção florestal.
C.   Por desresponsabilização do Estado. O apoio financeiro público à certificação florestal pode ainda ser considerado uma forma de desresponsabilização do Estado, nas suas obrigações face à gestão florestal sustentável, decorrentes inclusive de compromissos internacionais, através de transferência das mesmas para entidades privadas de credibilidade discutível.

Reconhecendo o esforço meritório de algumas organizações de produtores florestais na implementação de sistemas de gestão florestal sustentável, tendo em vista também a sua certificação, em geral as mesmas que têm maior intervenção na defesa do rendimento dos seus associados, não deixa de ser discutível a credibilidade dos sistemas de certificação florestal num país em desflorestação, em perda sistemática de área líquida de florestas. 


Colocam-se por isso, ainda, as seguintes questões?

1.    Como convive a credibilidade dos sistemas de certificação florestal num país que perde em média 10.000 hectares de floresta por ano desde 1990?
2.    Como convive a credibilidade dos sistemas de certificação florestal num país onde não é cumprida a Lei de Bases da Política Florestal, nem são sistematicamente atingidas as metas mínimas definidas na Estratégia Florestal Nacional?
3.    Como convive a credibilidade do FSC e do PEFC num país em desflorestação, com perda de área líquida de florestal, mas em que as florestas autóctones têm vindo a ser crescentemente substituídas por plantações de exóticas invasoras? O facto é que Portugal detém atualmente uma maior área de plantações de eucalipto do que Espanha (em 2010, de 812.000 hectares face a 759.778 hectares), assumindo já a 4.ª maior área neste domínio a nível mundial. E tudo isto para um uso exclusivo protegido pelas várias governações, a produção de celulose para pasta e papel.


terça-feira, 15 de dezembro de 2015

FLORESTAS: Balanço de 2015

Para o presente ano, a Acréscimo mantém o enunciado em balanços de anos transatos. Não se registaram alterações para a inversão de um rumo de declínio nas florestas portuguesas. Existem, todavia, cinco aspetos que importa realçar em 2015.

1.    No presente ano foi reconhecido, a nível mundial, a situação ímpar de Portugal como o país com o mais grave caso de desflorestação no continente europeu. As Nações Unidas revelam, no palco internacional, o que já era conhecido no plano interno. No período compreendido entre 1990 e 2015, o País perdeu mais de 150 mil hectares de área líquida de floresta. Sabemos ainda que, nesse período, o sector silvo-industrial português perdeu mais de 150 mil postos de trabalho, e que se agravaram as situações respeitantes ao êxodo rural, à delapidação dos recursos naturais, à depreciação do território e ao avanço da desertificação. O impacto nas exportações é imprevisível.

2.    No decurso da Conferência de Paris, a 6 de dezembro último, foi igualmente anunciada a queda de posição de Portugal no que respeita ao Índice de Desempenho de combate às Alterações Climáticas (Climate Change Performance Index). A queda de 10 posições face a 2014, de 9.º para 19.º, decorre de uma forte penalização das emissões, associadas à deflorestação e à degradação da floresta, devido aos incêndios. Portugal passou de uma classificação “boa” para “moderada”.

3.    A ação governativa, como em anos anteriores, não passou de folclore mediático. Não ocorreram as imprescindíveis alterações aos vícios nos mercados. Mantiveram-se as periódicas falhas no financiamento às equipas de sapadores florestais, com impacto especialmente inadmissível em período estival. Foi fomentado o investimento de risco. Não foi sequer demonstrada capacidade mínima para a conclusão de regulamentação da Lei de Bases da Política Florestal.


4.    O País ficou também a conhecer em 2015 as acusações formuladas nos Estados Unidos da América contra o terceiro maior exportador nacional, o maior no que respeita a bens de base florestal. Tais acusações respeitam a alegadas práticas imorais nos mercados, naquele que é um importantíssimo destino das exportações portuguesas. As acusações visam o mesmo grupo empresarial que entre 2010 e 2014, soube-se em 2015, foi beneficiado pelo Estado Português em mais de 94 milhões de euros, só no que respeita a Benefícios Fiscais. Tal montante poderia ter sido canalisado para o investimento florestal, compensando uma parte da perda líquida de área florestal registada desde 1990. São opções das governações em Portugal!

5.    Em 2015, reside ainda a suspeita de que Portugal terá passado a dispor da 4.ª maior área de eucalipto plantado do mundo. Ultrapassou já Espanha neste “ranking”. Todavia, a produtividade média por hectare manteve-se igual à registada na década de 30 do século passado, revelando uma aposta única na quantidade em área. No período de 1990 a 2015, o valor pago por metro cúbico de madeira de eucalipto, à porta das fábricas, contraiu significativamente. Mas, os custos da gestão do eucaliptal têm sofrido avultados aumentos, seja nos custos com pessoal, ou nos custos com energia e combustíveis. Os efeitos na gestão do eucaliptal são muito negativos, sobretudo nas regiões de maior risco associado ao investimento florestal. Com a aprovação do Decreto-lei n.º 96/2013, de 17 de julho, a perpetuação desta situação pode estar assegurada para os próximos tempos, com o aumento de uma oferta de risco crescente, mas a baixos preços perpétuos para a indústria papeleira.

A grande novidade em 2015 decorre de não restarem dúvidas de que Portugal é um país em desflorestação e que se tornou numa “seara” da Portucel Soporcel.

Em todo o caso, estamos agora perante um novo ciclo político, como o estivemos em 2011, esperemos não nos voltarmos a desiludir. Para já mantemos alguma esperança, reservada, muito reservada.