- Ardem porque a floresta produtiva
portuguesa hoje, no meio rural, não gera expectativas de negócio (salvo
em situações específicas), não gera riqueza, não proporciona emprego, nem
bem-estar às populações, facto que contribui, com outros, para o incontrolável êxodo rural que grassa
no País (catastroficamente registado pelo INE, censo após censo).
As florestas em Portugal encontram-se, desde
há anos, numa situação de sustentabilidade duvidosa, sujeita simultaneamente a
situações de subaproveitamento e de sobre-exploração, não se garantindo hoje sequer
a conservação dos recursos naturais que lhe estão associados.
Segundo dados da autoridade florestal
nacional (atualmente com a designação de Instituto de Conservação da Natureza e
das Florestas), apesar da ausência de cadastro rústico em parte significativa
do Território, a área florestal nacional é em mais de 90% detida por
proprietários privados, dos quais 75% possuem propriedades com menos de 20
hectares (área insuficiente para viabilizar economicamente uma exploração
florestal). Este grupo específico de proprietários é caracterizado pela
ausência ou por investimentos residuais nas suas explorações, nas quais
predominam espécies de produção lenhosa (fundamentalmente o pinheiro bravo e o
eucalipto), estando as práticas de gestão e o rendimento gerado associados à
satisfação de necessidades económicas conjunturais.
Apesar dos tradicionais números imputados ao
setor silvo-industrial português, sobejamente identificados nos discursos
políticos e empresariais, quer o peso no PIB, nas exportações (agora em moda),
quer no emprego (industrial), o facto é que, segundo os dados publicados nas
Contas Económicas da Silvicultura, do INE, as florestas em Portugal geram cada
vez menos expectativas de negócio (se ainda geram). Importa então analisar os
dados menos publicitados da Floresta Portuguesa.
Nos últimos 11 anos (2000-2010), a atividade
silvícola e de exploração florestal, que está na base da fileira de atividades
económicas relacionada com a indústria transformadora da madeira e da cortiça,
registou um declínio progressivo. Segundo o INE, em 2000, o Valor Acrescentado
Bruto (VAB) atingiu o valor máximo da década, tendo terminado em 2010 com um
valor real inferior em cerca de 19,2%. Quando ao peso do VAB da silvicultura no
VAB nacional, verificou-se no período uma perda de importância do setor
silvícola na economia nacional, passando de 0,8% em 2000, para 0,4% em 2010
(dados provisórios), ou seja, uma quebra de 50%. A Produção registou no período
uma taxa de variação média anual de -2,0% em volume e de -2,3% em valor, facto
que reflete a diminuição dos preços no produtor. Por sua vez, no que respeita à
relação entre o Consumo Intermédio da silvicultura e a Produção, o INE
registou, para o período em análise, um acréscimo de 7,1% desfavorável ao
produtor florestal. A diminuição dos preços ao produtor e o aumento dos
consumos intermédios traduzem claramente uma situação adversa à atividades
silvícola. Refletindo o comportamento da Produção e do VAB, o Rendimento Empresarial
Líquido registou no período um decréscimo acentuado (superior a ¼ de milhar de milhões
de euros):
Fonte: INE – CES 2010.
Simultaneamente, com base nos dados do
Inventário Florestal Nacional, especialistas
nacionais identificaram indícios do aumento de situações de deficiência ou,
mesmo, ausência de gestão florestal nas áreas das duas principais espécies florestais produtoras
de madeira, o pinheiro bravo e o eucalipto. No caso do eucalipto, a espécies
que nos últimos 30 anos registou maior acréscimo de áreas, os dados recolhidos podem
mesmo significar um aumento acentuado de eucaliptais abandonados entre 1992 e
2005 (últimos dados oficiais). Importa registar que, em Portugal se encontram
em estado de abandono ou semi-abandono cerca de 1,5 a 2 milhões de hectares, o
correspondente a cerca de 20% do Território Nacional (não haveria do País de
estar na situação económica em que se encontra).
Com impacto determinante nas florestas
produtivas nacionais, regista-se que nas três principais fileiras
silvo-industriais são evidentes relações comerciais impostas pelo setor
industrial. A produção florestal portuguesa, por incapacidade de exportar diretamente
os seus produtos, vê-se na dependência da indústria transformadora, a qual
determina os preços à porta da fábrica. Importa ter presente que, em cada uma
das três fileiras: a do pinheiro bravo, a do eucalipto e a do sobreiro; existe
uma empresa industrial que tem posição dominante no mercado respetivo, seja o
Grupo Sonae do setor do pinho, seja o Grupo Portucel Soporcel no setor do
eucalipto, seja o Grupo Amorim no setor corticeiro. Curiosamente, por tradição,
o Ministério que tutela a atividade florestal em Portugal, abstém-se de
intervir no acompanhamento das relações comerciais no setor, acentuando a
dependência da produção florestal nacional face à indústria que lhe está a jusante.
Não estarão os imponentes números do setor silvo-industrial português
associados ao declínio da produção florestal nacional? Importa ter presente que
a indústria entrará posteriormente em declínio (já iniciou), ou
deslocalizar-se-à para o exterior. Em todo o caso, o País dificilmente se
livrará do despovoamento e da desertificação que grassam no interior.
Fonte: DGRF – Evolução dos preços da madeira de eucalipto e pinho para trituração à porta da fábrica.
Ao nível dos apoios públicos às florestas,
exige-se uma mudança de paradigma, com uma aposta obrigatória na gestão
florestal; na organização dos espaços florestais: seja através de Zonas de
Intervenção Florestal (conceito a atualizar), de Sociedades de Gestão
Florestal, de Fundos de Investimento Imobiliário Florestal ou de bolsas de
terras; na investigação e na melhoria das qualificações das empresas e dos
profissionais do setor. O País não pode continuar a desperdiçar fundos públicos,
originados do esforço dos contribuintes, para derreter em sistemáticas
florestações, muitas delas destinadas a arder. Importa ter presente que, no período
1989-2005, foram gastos, só em novas arborizações de pinheiro bravo, cerca de
700 milhões de euros, tendo a área desta espécie, ao invés de aumentar,
regredido quase 400 mil hectares, um desperdício criminoso.
Ao nível da investigação florestal, tendo em
vista quer o aumento das produtividades, mas também a diversificação dos
produtos (que não apenas a madeira e a cortiça) e a prestação de serviços
ambientais, existe um longo caminho por percorrer. A este nível o investimento
tem sido insignificante. O Estado tem de definir uma estratégia clara para a
investigação aplicada, sobretudo nas áreas relacionadas com a quantificação e a
qualificação de bens e de serviços intangíveis, ou seja atualmente sem valor de
mercado, criando os meios para que a Sociedade possa remunerar o recreio e
lazer, a conservação do solo, o sequestro de carbono, entre outros proporcionados
pelos espaços florestais.
Recorrendo a meios públicos, privados e
mistos, o País tem de fornecer à produção florestal portuguesa meios de assessoria
técnica. Em ligação com a investigação aplicada, tem de ser criado um serviço
de extensão florestal (ou rural), que proporcione a transmissão da informação
até ao agricultor e produtor florestal, ou a outros gestores de espaços agroflorestais.
Este é um instrumento fundamental para gerar expectativas de negócio nestes
espaços, quer para uma maior e melhor produção de madeira, ou de cortiça, para
a produção de aproveitamento racional da biomassa, quer para uma utilização em
regime de multifuncionalidade dos espaços agroflorestais, com a diversificação
de produtos e serviços, gerando assim emprego em meio rural (ao contrário do
que hoje acontece com as grandes unidades da indústria transformadora), proporcionando
melhores condições de bem-estar às populações, combatendo o êxodo rural e a
desertificação.
Em conclusão, para uma verdadeira defesa da
floresta contra os incêndios (mas também das pragas e das doenças), urge
definir uma aposta politica nos fatores de sucesso das florestas portuguesas. São
eles:
- A extensão florestal (ou rural) - ligar a investigação, a formação e a assessoria técnica à produção florestal;
- O acompanhamento das relações comerciais nas fileiras silvo-industriais – ajustar o peso dos diferentes agentes, regulando as posições de monopólio industrial;
- A quantificação
e a qualificação de outros bens e serviços – diversificando as opções de
negócio para os espaços florestais.
O objetivo fundamental é garantir a gestão
florestal ativa, desejavelmente sustentável, dos espaços florestais em
Portugal.
A condição de base - as florestas têm de
gerar expectativas de negócio aos seus detentores e gestores.