quinta-feira, 28 de abril de 2016

Posição assumida na Audição Pública promovida pelo Partido Ecologista Os Verdes

Matérias em abordagem:
  1. Novo quadro legislativo que enquadra a plantação de eucaliptos e de outras espécies exóticas em Portugal;
  2. Medidas económicas e fiscais a implementar nesta área, nomeadamente a criação de um imposto sobre grandes áreas de eucalipto, cujo montante venha a reverter para um fundo de apoio à plantação de novas áreas de montado de sobro;
  3. Definição de outras medidas de apoio à ciência e à pesquisa no sentido de proteger as espécies autóctones ameaçadas e de impulsionar o seu cultivo.
Abordagem genérica

A Acréscimo integrou um conjunto de 20 organizações e de 15 personalidades subscritoras da Plataforma pela Floresta que, a 21 de janeiro de 2014, exigiu a revogação do Decreto-lei n.º 96/2013, de 19 de julho.

A Acréscimo não norteia as suas posições com base em espécies florestais, mas sim em função dos modelos de negócio que a estas se associam. Nas suas posições tem em conta a sustentação económica, a sustentabilidade ambiental e a responsabilidade social inerente a tais modelos.

O Decreto-lei n.º 96/2013, de 19 de julho, pela sua gênese, mereceu sempre por parte da Acréscimo uma abordagem politica, tendo em conta a vinculação deste diploma a interesses financeiros que se associam a modelos de negócio silvo-industrial que não são nem economicamente sustentados, nem ambientalmente sustentáveis e nem socialmente responsáveis.

A iniciativa onde se insere a elaboração deste diploma não é díspar da que sustentou a “campanha do trigo”, com a consequente exploração da lavoura em beneficio de interesses a jusante desta. Na base do diploma, inserindo-o numa estratégia protecionista de interesses a jusante da lavoura, está o fomento de uma oferta de risco, para assim assegurar a perpetuação de preços baixos à procura. O condicionamento do rendimento silvícola tem fortes efeitos ao nível da gestão, designadamente na sua componente técnica. Num país em que mais de 90% dos espaços florestais são detidos por famílias e comunidades, não é difícil antever que este modelo de negócio aportará, tal como a “campanha do trigo” fortes impactos negativos às futuras gerações.

Sobre a justificação do maior controlo que o Decreto-lei n.º 96/2013, de 19 de julho, proporciona face à legislação revogada, importa efetuar uma análise cuidada sobre o numero de plantas de viveiro comercializadas no período de vigência do RJAAR, face ao número de plantas envolvidas em projetos de comunicação prévia e de autorização prévia aprovados pelo ICNF no decurso desse período. A certificação oficial da atividade viveirista facilita essa análise. A questão foi suscitada pela Acréscimo à Secretaria de Estado das Florestas e do Desenvolvimento Rural, mas ainda não obteve resposta.

Importa ainda justificar, nos planos político e técnico, a expansão da área de expansão de eucalipto face ao disposto nas alíneas a) e b) do Art.º 3.º da Lei n.º 33/96, de 17 de agosto.


Abordagem específica

1. A Acréscimo manifesta a sua concordância com os objetivos enunciados no preambulo do Decreto-lei n.º 96/2013, de 19 de julho, concretamente:
  • A simplificação e atualização do quadro legislativo incidente sobre as arborizações e rearborizações de cariz florestal, concentrando num único diploma o seu regime jurídico, em especial o procedimento de autorização e o quadro sancionatório aplicável;
  • A eliminação dos regimes jurídicos que se revelaram inconciliáveis com os princípios, objetivos e medidas de política florestal nacional, aprovados pela Lei n.º 33/96, de 17 de agosto e, bem assim, daqueles que não asseguram a realização do interesse público associado ao ordenamento florestal e do território, e à conservação dos ecossistemas e da paisagem;
  • O conhecimento das ações de alteração do uso do solo ou de ocupação florestal enquanto instrumento fundamental para o acompanhamento das dinâmicas associadas ao território e como fonte importante de informação sobre o regime e estrutura da propriedade em regiões sem cadastro, mas com elevado potencial silvícola;
  • O reforço da componente de acompanhamento e fiscalização da execução das intervenções florestais, em detrimento do simples controlo administrativo prévio, permitindo o acompanhamento posterior pelas entidades públicas com atribuições nesse domínio;
  • A adequada alocação de atribuições e competências entre as diferentes entidades públicas responsáveis;
  • A diminuição dos custos de contexto, associados aos procedimentos administrativos, apostando na sua desmaterialização em reforço da transparência dos processos de decisão.

A associação questiona é se o articulado condiz com tais objetivos.

A Acréscimo defende que, consubstanciando a arborização e a rearborização ações de investimento florestal, nos respetivos projetos, a par da análise técnica, tais ações devem incorporar cumulativamente uma ANÁLISE DE RENTABILIDADE, tendo por suporte o disposto na alínea c) do Art.º 4.º da Lei de Bases da Politica Florestal, e uma ANÁLISE DE RISCO (tal como ocorre em áreas de plantações industriais, com tomada de decisão suportada nos normativos publicados pelo IASB, International Accounting Standards Board). Aparentemente, terá sido uma análise financeira a determinar a redução, na última década, de mais de 30 mil hectares de plantações de eucalipto na posse de empresas industriais associadas na CELPA.

Não advogando uma diferenciação entre espécies na abordagem legislativa às ações de arborização e rearborização, a Acréscimo entende que devem, contudo, ser tidos em conta PARÂMETROS ESPECÍFICOS na analise de rentabilidade e de risco em projetos de investimento com espécies autóctones, em cumprimento ao disposto na alínea g) do Art.º 4.º da Lei n.º 33/96, de 17 de agosto.

Os ELENCOS DE ESPÉCIES a privilegiar definidos nos PROF, devem ainda ser determinantes na decisão de autorização de ações de arborização e de rearborização.


2. Sem querer desvalorizar uma iniciativa de criação de um imposto sobre grandes áreas de eucalipto, a Acréscimo alerta para a dificuldade da operacionalização da mesma fora das áreas de plantação na posse ou sob gestão de empresas industriais, em particular em áreas contínuas destas plantações em regiões de minifúndio.

Todavia, a Acréscimo advoga da necessidade de inverter a tendência de redução de áreas de autoabastecimento, por transferência de risco para as famílias e comunidades detentoras de plantações de eucalipto, concretamente através da criação de um IMPOSTO DE REPOSIÇÃO FLORESTAL. Este imposto seria operacionalizado com o estabelecimento de um valor-unidade, a cobrar à procura nas aquisições a terceiros e a converter em mais uma fonte de receita do Fundo Florestal Permanente.

(Uma medida similar foi no passado estabelecida entre entidades privadas, uma do lado da oferta, outras da procura, com resultados positivos para ambas. Os valores por metro cúbico ajustados na época, no fase final de 0,75 Euros por metro cúbico adquirido pela procura, careceriam contudo de ajustamento aos fins agora em prespetiva.)

Generalizando, este imposto de reposição florestal deveria estender-se para as demais espécies florestais, sobretudo em fileiras onde a procura não dispõe de áreas de autoabastecimento, ou seja, onde se ausenta da área de risco do negócio silvo-industrial.


3. Reconhecendo os problemas na área de Investigação e Desenvolvimento, nomeadamente no que respeita à melhoria da produtividade florestal, dos modelos de silvicultura, da quantificação e qualificação de bens e serviços, oriundos dos espaços florestais, mas hoje sem valor de mercado, da abertura de novos mercados e da experimentação de novos sistemas de gestão agroflorestal, a Acréscimo tem vindo a defender da determinante necessidade de aposta na transmissão de conhecimento, quer no plano técnico, quer no comercial, em concreto pela criação de um SERVIÇO DE EXTENSÃO FLORESTAL.

Não basta produzir conhecimento, mais importante será disponibilizá-lo ao seu público-alvo, no caso, a produção florestal. Esta iniciativa é fundamental num país em que mais de 98,4% dos seus espaços florestais não são públicos e onde a área de maior risco está associado a regiões de minifúndio, nas quais, uma mudança de atitude carece de um imperativo apoio técnico e comercial.

Assembleia de República, a 26 de abril de 2016

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Celtejo, crimes ambientais e certificação

De acordo com denúncia pública, a Celtejo assume que não consegue cumprir um dos parâmetros fundamentais da licença ambiental que o Estado lhe atribuiu: o parâmetro relativo ao oxigénio, fundamental para a vida. A denúncia alega a prática de crime ambiental no rio Tejo, através de descargas ilegais de resíduos industriais.


A Celtejo – Empresa de Celulose do Tejo, SA, é uma empresa, pertencente ao universo do Grupo ALTRI e que produz pasta de eucalipto branqueado do tipo BEKP (Bleached Eucalyptus Kraft Pulp)

A Celtejo dispõe de certificação de cadeia de responsabilidade emitida pelo FSC (Forest Stewardship Council) e pelo PEFC (Programme for the Endorsement of Forest Certification), tendo como entidade certificadora a APCER.

A certificação de cadeia de responsabilidade florestal pressupõe o integral cumprimento da legislação aplicável à atividade da empresa, incluindo necessariamente o cumprimento das condições do licenciamento que lhe foi atribuído pelo Estado.

A empresa dispõe ainda de certificação ao abrigo da norma ISO 14001:2015.

A denúncia foi emitida pelo canal público de televisão de Portugal, a RTP, no programa “Sexta às 9”, disponível do sítio da emissora na Internet.


A Acréscimo considera que as certificações atribuídas à Celtejo não devem ser consideradas válidas, face à denuncia de não conformidades graves, exigindo a realização de auditorias a nível internacional, seja pelo FSC, pelo PEFC e pela ISO.

(versão em Inglês disponível)

quarta-feira, 13 de abril de 2016

O valor da certificação florestal em Portugal

A certificação florestal é um instrumento de mercado que argumenta basear-se no reconhecimento de uma utilização sustentável dos recursos florestais. Como coexiste este instrumento com uma situação de desflorestação na Europa?

É reconhecido o esforço de alguns proprietários privados florestais em Portugal e de algumas das suas organizações na melhoria da gestão das suas áreas florestais, ao ponto de investirem, em grupo, no reconhecimento externo da sustentabilidade da mesma.

Todavia, os sistemas de certificação que operam em Portugal, designadamente o FSC e o PEFC, pretendem avançar para modelos de certificação regional. Mais, para o efeito pretendem usufruir de apoios públicos, integrados no âmbito da PAC, desvirtuando os princípios onde argumentam basear-se. Ou seja, pretendem ver ultrapassada a fraca adesão a este instrumento, em mercados a funcionar em concorrência imperfeita, através da sua viabilização por apoio direto dos contribuintes. Estes últimos correm assim o risco de financiarem duplamente um negócio de alegada transparência, uma enquanto contribuintes, outra como consumidores.

A convivência entre os sistemas de certificação em Portugal com uma situação de desflorestação sem controlo é gritante. O país perdeu num quarto de século mais de um quarto de milhão de hectares da sua área de floresta. Em média anual, está em causa uma desflorestação equivalente à da área de Lisboa, de 10 mil hectares por ano, desde 1990. 


Os incumprimentos à Lei de Bases, à Estratégia Florestal Nacional e a compromissos internacionais assumidos por Portugal em matéria de Desenvolvimento Sustentável e de combate às Alterações Climáticas, no que à gestão das suas florestas respeita, são estatisticamente e sucessivamente notórios. O facto é revelado pela FAO, p elo Eurostat e pela Agência Europeia do Ambiente. Mas, nada disso parece ser tido em conta quando se pretende viabilizar o negócio da certificação florestal.

Os organismos que em Portugal representam o FSC (Forest Stewardship Council) e o PEFC (Programme for the Endorsement of Forest Certification) tem uma forte dependência financeira e diretiva de entidades que no país sustentam mercados a funcionar em concorrência imperfeita. Isto num país com forte concentração na procura e onde a oferta se caracteriza por 98,4% das florestas sob gestão não pública, onde mais de 80% das quais estão na posse de famílias ou de empresas familiares. Todavia, o facto também parece irrelevante para a sustentação do negócio da certificação florestal, muito embora esse modelo de funcionamento dos mercados venha há anos a acarretar fortes consequências ao nível da destruição dos recursos naturais, na depreciação do território, como é o caso da propagação catastrófica dos incêndios, onde o país se destaca no plano internacional, e na proliferação descontrolada de pragas e de doenças.


A questão que se coloca é se, ao nível internacional, quer o FSC quer o PEFC são coniventes com a situação de desflorestação em Portugal. Aparentemente são! Em causa está a sua credibilidade interna e internacional.

Portugal encontra-se numa situação de descontrolada desflorestação. A viabilidade da certificação florestal enquanto negócio não se sobreporá à transparência que pretende transmitir aos mercados? Não será este um instrumento que se baseia na hipocrisia?


terça-feira, 5 de abril de 2016

O descaramento da indústria papeleira na defesa do “diploma da Mitrena”

Portugal possui a 4.ª maior área de plantações de eucalipto do mundo, ao dispor de menos de meia dúzia de unidades industriais de produção de pasta celulósica.

As considerações de discriminação ao eucalipto em Portugal, com base no compromisso do Governo na revogação do “diploma da Mitrena” (Decreto-lei n.º 96/2013, de 19 de julho, que instituiu o regime jurídico das ações de arborização e rearborização). alegadas pela indústria papeleira são, a vários títulos, vergonhosas.

Vergonhoso é o facto desta fileira ser “orientada” em regime de oligopólio, que condiciona o rendimento destas plantações, esmagadoramente na posse de famílias, ao ponto de cerca de 80% das mesmas estarem votadas a uma gestão deficiente ou de abandono.

Vergonhoso é ainda o facto de as empresas industriais estarem a abandonar a sua presença na área de risco do negócio, quando nos últimos anos reduziram as suas áreas próprias em mais de 30.000 hectares de eucaliptal. Desta forma, optaram por transferir os riscos da gestão destas plantações a quem condicionam rendimentos, reduziram a sua capacidade de autoabastecimento e tem a descarada ousadia de invocar agora a necessidade de importação de matéria prima lenhosa ou uma maior expansão do eucaliptal privado em Portugal.

Envergonha ainda o facto de, em consequência do atual condicionamento do mercado da rolaria de eucalipto, a gestão a que estas plantações está votada ocasiona elevados riscos sociais, económicos e ambientais. Entre 2000 e 2011 arderam em Portugal 1.712.114 hectares, 877.506 hectares ocorreram em povoamentos florestais. Segundo dados oficiais, as plantações de eucalipto representaram 43% da área ardida em povoamentos florestais, bem longe do ocorrido em povoamentos de espécies autóctones, incluindo o pinheiro bravo.


Por fim, lamenta-se o facto das várias governações terem permitido a expansão da área das plantações de eucalipto (mais de 95.000 hectares só entre 1995 e 2010), sem que a mesma tenha sido acompanhada pelo aumento da produtividade. Ou seja, a conivência entre governos e a indústria papeleira foi fundamental para o aumento de uma oferta de risco, que empobrece as populações rurais, delapida recursos naturais e deprecia o Território.

Os responsáveis da indústria papeleira, face ao egoísmo que os motiva, tem de ter a perceção que o “negócio” não é já hoje estabelecido entre duas partes: a oferta e a procura que a condiciona. Este “negócio”, associado hoje as plantações de eucalipto, não é há muito desenvolvido apenas entre agentes económicos que produzem rolaria de eucalipto e quem lhes compra com preço unilateralmente estabelecido.

Pelos impactos negativos a que está associado, o “negócio” do eucalipto é hoje intervencionado por múltiplas partes, sobretudo pelos cidadãos vítimas da devastação provocada pelos incêndios, das consequências da luta biológica associada às pragas e doenças do eucaliptal e dos resíduos associados a produção de pasta celulósica.

Portugal está em desflorestação, perdeu mais de 250 mil hectares de floresta em 25 anos, mas está longe de poder apostar em plantações de elevado risco.